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“PARIS ARDE”, DE IVAN GOLL: A METRÓPOLE DESENCANTADA

IVAN GOLLS “PARIS BRENNT”: DISENCHANTED METROPOLIS

Resumo

Análise da poesia de Iwan Goll. Parte de “Paris brennt”, poema escrito originalmente em língua alemã, que completa um século em 2021. O poema é um olhar sagaz para a metrópole, no sentido de cidade grande e de centro colonial. A investigação visa traçar uma interpretação do todo orgânico se voltando à célula e retornando ao organismo. Como viés de um projeto que, diante do hiato da recepção e levando em conta a maneira intensa como essa poesia reemerge e age na nossa realidade, prevê a edição de uma antologia com traduções de poemas e textos mais experimentais, o artigo implicita um processo de elaboração de tradução do poema ao português brasileiro. Há uma série de discussões embutidas, que dizem respeito à criação poética no âmbito da poesia modernista, de um modo mais geral poesia essa insubmissa às leis que regem a construção de uma poésie pure.

Palavras-Chave
Ivan Goll; Poesia; Paris Arde; Criação Poética; Tradução poética

Abstract

This article analyzes the poetry of Iwan Goll, based on the poem “Paris brennt”, which celebrates a century in 2021 and consolidates itself as a mark of modernist poetry. The investigation aims to trace an interpretation of the organic whole turning to the cell and returning to the organism. As a part of a wider project that foresees the edition of an anthology with translations of the more experimental poems and texts, the article implies a process of translation from german language to Brazilian Portuguese. There is a series of discussions implicated in this paper, which mainly concern poetic creation within the scope of modernist poetry in a more general way, poetry that is insubmissed to the rules that lead the construction of a póesie pure.

Keywords
Ivan Goll; Poetry; Paris Brennt; Poetic Creation; Poetic Translation

“O inanimado se reveste, às vezes, dum reflexo de clarões” O Camponês de Paris,

Louis Aragon

“Paris arde - além de álbum de cartões postais, um poema” escrito em alemão pelo poeta Iwan Goll (Alsácia Lorena 1891-Paris 1950) é uma obra muito original que completa um século em 2021. Consiste em clave virtuosa que auxilia a ler, não um tempo passado, mas a condição hodierna. O poema na Edição Zenit de Zagreb se distingue pela originalidade de sua estrutura que incorpora oito imagens de cartões postais, dialogando como num jogo com o texto escrito, e também poemas autônomos, tanto de autoria própria como alheia. É que no final da versão de 1921, há uma inclusão babélica de poemas escritos por Blaise Cendrars (suíço-francês 1887-1961), Vicente Huidobro (chileno 1893-1948) e Valentin Jakovlevc (russo 1891-1951) em suas respectivas línguas-maternas. As versões posteriores (a francesa: “Paris Brûle” de 1921 e a alemã: “Paris brennt” de 1923) renunciam tanto aos cartões postais quanto à inclusão dos poemas no fecho.

O poema corresponde a uma deambulação pela cidade no decurso de um dia. A paisagem matutina às margens do Rio Sena se espalha por cenários, histórias e personagens mais e mais se aprofundando questionadora num espesso encontro de tempos. Blocos de textos vão se compondo aparentemente desalinhados e deixam fissuras ou fendas visíveis. O interstício temporal do caminho poético inicia às 5 horas da manhã, atravessa o meio-dia do sol a pino, a ceia noturna, e encerra. Apesar da indicação de um dia nessa cidade, não há uma linearidade temporal nem espacial nesse poema, senão anacronia, errância, intermitência. Saltam aos olhos a enumeração profícua em versos que arrolam a topografia urbana, poemas haicais ou em versos livres e as oito imagens de cartões postais. A primeira página contém o título, a foto da Torre Eiffel e as informações catalográficas, as duas últimas das 20 páginas são anúncios de “Paris brennt”, ou seja, há paratextos entremeando o poema.

Figura 1
“Tour Eiffel”

Pensando a poesia de vanguarda, Haroldo de Campos se apoia na afirmação de Roman Jakobson de que “A língua é apenas um dos sistemas de signos e a linguística tão-somente uma das províncias da semiótica” (Campos 133Campos, Haroldo. “A poética da vanguarda”. A arte no horizonte do provável, Haroldo de Campos (org). São Paulo: Perspectiva, 1977, pp. 129-222.), colocação que abre neste caso a compreensão do perfil mais sensível da poesia. Isso, tendo em vista que a discussão extrapola as associações semânticas e mentais sintagmáticas ao convocar aspectos sensualmente perceptíveis de outros sistemas de signos, outras províncias da semiótica, como as fotos da cidade. Essas imagens expandem as acepções semânticas da escrita, agregando camadas de sentido irisadas, vez ou outra conflitantes, quando por exemplo a imponência arquitetônica se contrapõe ao teor crítico e irônico dos versos.

Goll publicou, portanto, três versões do poema, sendo a primeira versão, alemã e com cartões, a base para este artigo. Ele mesmo a traduziu ao francês, com variações, para integrar o livro Le nouvel Orphée. A terceira versão consta do livro Der Eiffelturm, traz um desenho de Robert Delaunay1 1 No Diário de S. Paulo de 25 de maio de 1936, a pintora brasileira Tarsila do Amaral se reporta aos estudos desse pintor: “Delaunay integrou-se no movimento cubista e sentiu, como os seus colegas, a febre do dinamismo, o delírio do desenho hieroglífico criado pela recente estética, a ânsia de concretizar o novo estado de espírito em ebulição. A Torre Eiffel é um símbolo.” (Amaral 71-73) e é dedicada ao dramaturgo Georg Kaiser.

A versão em pauta é dedicada “a Carl Einstein”, o historiador de arte defensor do cubismo e que depois realiza estudos antropológicos. Ambos participavam no período após a Primeira Guerra do projeto de expansão de horizontes nacionais e continentais no círculo de programa difuso, Zenit, que atraiu protagonistas da vanguarda (Carl Einstein, Rudolf Pannwitz, Georg Kaiser, Ivan GollEinstein, Carl. Die Kunst des 20. Jahrhunderts. Berlin: Propyläen, 1931., sendo bem nítida a proeminência do último). Ambos partilhavam também o interesse pela estética japonesa: se o historiador divulga seus estudos acerca de antigas xilogravuras japonesas da era do Tokugawa, o poeta experimenta formas breves2 2 Há uma controvérsia sobre a data “8.9.1920” - que o tornaria pioneiro na experimentação da forma -, devido à letra desconhecida no manuscrito “Neue Hai-Kais” de Yvan Goll, do Deutsches Literaturarchiv Marbach. É, todavia, possível, em vista da antologia, certamente de seu conhecimento, que foi publicada em 1 de setembro de 1920 por Jean Paulhan na Nouvelle Revue Française, com diversos escritores franceses. Somente em 1926 saem os “Haï-Kaïs” de Goll na Revista Die Literarische Welt: “nosso temperamento nervoso carece de uma forma breve: senão nos entediamos. Antevemos tudo excessiva e rapidamente. E ai do poeta que o leitor consegue antever. O mais importante na arte é o elemento surpresa”. (“Neue Hai-Kai”, 331) para compor a montagem “Paris arde”. No estudo “Das Wort an sich” (A palavra em si) transparecem suas cautelas acerca da brevidade: “importa comprimir as vivências mais profundas em telegrama, estenografia. Importa trazer o conteúdo por longo que seja em forma sumária e simples. E nisso, porém, ser canto? Não exatamente canto, mas ritmo. Não flauta, banjo. Outro caminho: o laconismo do tanka3 3 A forma arcaica tanka, do século VIII, se transforma numa espécie de diálogo, renga (em que uma voz fala a estrofe inicial e outra a lateral, fechando no kigo). Daí deriva mais tarde o haicai, forma ainda mais breve, conforme Kensuko Tamai na palestra “O tanka e o sentimentos dos japoneses”, proferida no Centro de Estudos Nipo-brasileiros em 22 de outubro de 1985. japonês”. (GollGoll, Ivan. “Das Wort an sich”. Expressionismus: Manifeste und Dokumente zur deutschen Literatur 1910 – 1920, Thomas, Anz; Michael, Stark. (Eds.). Stuttgart: METZLAR, 1982., “Das Wort an sich”, 615)4 4 Salvo indicação expressa, as traduções de obras estrangeiras deste artigo são de minha autoria. Os trechos de minha tradução do poema, intitulada “Paris arde”, e os cartões postais legendados vêm sem a identificação de página, pois se trata de trabalho inédito.

À primeira vista as referências de tempo e espaço no poema são como relações sintagmáticas, mas aos poucos se proliferam em relações associativas intertextuais prismáticas, paradigmáticas. A realidade da vida tem sempre razão e o surrealismo poético seria a transposição da realidade a um plano estético, sublinha Goll no único número da sua revista Surréalisme de 1924. Embora defenda a realidade da vida, a experiência vertiginosa da obra nesse período é quase alucinatória, acentuada ao nível lexical ou gramatical, fonológico e ao nível do embate semiótico advindo dos recursos gráficos do jornalismo e do design publicitário. Os projetos imperialistas da História monumental levados a cabo na Primeira Grande Guerra resultaram na destruição de vidas e bens, com isso a comunicação entre as pessoas é abalada. Em meio à crise da linguagem, Ivan Goll pesquisava alternativas interseccionais para a criação estética num diálogo com as inovações técnicas do cinema, da pintura, do teatro5 5 Evidentemente ele recupera também certos princípios norteadores da poesia de Mallarmé (que traduziu ao alemão): “A palavra se torna substância. Ela não está mais ali, como meio para um fim, para imitar, descrever, copiar fatos, dados, da natureza, como a literatura comumente o entende: meio de troca entre as pessoas sem espirituosidade - torna-se a palavra do poeta. A criação com efeito surge. Algo que nunca existiu grita pela primeira vez no mundo. Algo completamente diferente da habitual pátina que recobre a brilhante existência terrena. O poeta tira a palavra de sua língua materna; é, sim, linguagem, matéria, e a arte processa essa matéria-prima [...]”. “Der Geist Mallarmés”. (fls. 62-76, aqui p. 69) In: Die drei guten Geister Frankreichs. . As experimentações estilísticas concernem aos trabalhos de poesia empreendidos entre 1918 e 1926, período em que o escritor participa de uma série de debates formais da vanguarda estética, e sua poesia escrita se caracteriza por uma vitalidade formal: Chapliniade é poema-cinema, Matusalém ou o eterno Burguês, drama satírico, os poemas dos livros O Novo Orfeu e Submundo fundam uma mitologia urbana moderna, e “Paris brennt” se compõe com cartões postais e colagens de poemas.

Seria mister apresentar duas informações de ordem mais geral que marcam bastante a pesquisa da obra do poeta Ivan Goll. Primeiramente, a injusta acusação de plágio impetrada pela esposa do poeta contra Paul Celan, o “caso Paul Celan-Claire Goll”, e as alterações polêmicas que ela fez nos dados bibliográficos da obra de Ivan Goll prejudicaram irremediavelmente a recepção dessa poesia. A poeta Hilde DominDomin, Hilde. “Plädoyer gegen die ‘Verniemandung’ von Yvan Goll”.Aber die Hoffnung - Autobiographisches aus und über Deutschland. München: Piper, 1984, pp. 162-164. lamenta isso no breve ensaio “Fala contra a ‘nenhumação’ de Yvan Goll” em que recupera a expressão de Octavio Paz (em Labirinto da Solidão) para a operação de fazer de Alguém, Nenhum: “nenhumação”. Domin relembra o jovem Celan visitando o poeta enfermo com leucemia, a maneira como se dispôs a doar seu sangue, como foi uma companhia importante no final da vida de Ivan Goll. Domin faz um apelo não no sentido de diminuir o valor desse ou daquele, mas sim, de tentar retomar o poeta, cuja voz foi abafada.

Os ataques no final das contas exerceram um efeito exatamente contrário às suas originais intenções, na medida em que hoje em dia a influência de Goll sobre Celan é, antes, tendencialmente subestimada. Na pesquisa a respeito de Celan o papel de Goll como incentivador, que ele realmente foi, é praticamente insignificante.

(Ullmaier 2Ullmaier, Johannes. Yvan Golls Gedicht “Paris brennt”. Tübingen: Max Niemeyer, 1995.)

Some-se a essa dificuldade para a pesquisa, o estigma em torno do sobrenome, o fato de que o escritor publicou em alemão, francês e em inglês, e os textos não dispõem de uma sistemática organização bibliográfica comparatística. Tampouco foi escrita a biografia dessa personalidade tão produtiva e de tantas relações potencialmente prolíficas. O percurso intelectual demanda a compreensão das fases da obra que, conforme Ullmaier (2)Ullmaier, Johannes. Yvan Golls Gedicht “Paris brennt”. Tübingen: Max Niemeyer, 1995., equivalem quase que ao leque inteiro dos movimentos de vanguarda europeia, com correspondências e relações das mais diversas. Abrange os livros do Expressionismo, alguns do período na Suíça, os libretos (“Royal Palace” e “Der neue Orpheus”) que escreveu em Berlin para o compositor Kurt Weill, João-sem Terra que teve publicações em Paris de 1936 em diante, os romances-ensaios, os poemas de amor que constituem o conjunto do final dos anos 1920 até o início da temporada de refúgio em Nova Iorque nos anos 1940, quando o poeta-judeu então escreveu tanto em inglês como em francês belíssimos poemas sagas, para retornar ao alemão em Traumkraut (1951), seu último livro.6 6 No Brasil recomendo três leituras sobre essa fase da poesia de Yvan Goll. Brion, Marcel. “A Poesia de Claire e Yvan Goll”. In: Duarte, Paulo (diretor). ANHEMBI, ano V, número 55, vol. XIX, junho de 1955, pp. 14-22. Goll, Yvan. O Fruto de Saturno. Tradução Márcio Simões. Natal: Sol Negro Edições, 2013. E, no ensejo da edição desse livro, Floriano Martins traduz e publica em 2014 na Agulha (online) a entrevista “Yvan Goll e a erva mágica da poesia”, de Thomas Rain Crowe com Nan Watkins.

Após essa explanação, detenho-me no poema “Paris arde”, que começa com a metáfora da cidade como navio. Os primeiros quatro versos encadeados em parataxe, mas com acepção fortemente subordinativa consecutiva, identificam o espaço com a metonímia dos símbolos urbanos:

Navio escarlate ‘Paris’ Navegante nas bandeiras de todas as prefeituras e trens No Mistral das prisões flamulante placa comercial LIBERTE EGALITE FRATERNITE

O sentido é bem crítico, na medida que formula uma analogia entre a bandeira de Paris, que têm a estampa de um navio, com placas de comércio. A imagem seguinte reforça a consciência de que o sistema político, por meio dos símbolos onipresentes identificadores das instituições, provoca a debandada de anjos em revoada: “Dos mastros da Igreja de São Sulpício/ Alçam voo os anjos.” Alusão clara às pinturas de Eugène Delacroix na Capela dos Santos Anjos, abrigada na Igreja St. Sulpice. Dois murais laterais e a abóbada da Capela trazem representações de pelejas protagonizadas por anjos: Jacó lutando com o anjo e Heliodoro expulso do templo por um anjo enviado por Deus; no alto São Miguel matando o dragão.

“Angelus”.

A prece matinal é marcada. A primeira das três orações cristãs ao longo do dia, o Angelus, sela a comunhão de Deus com os homens.

Amanhece. Veleiros se movimentam às margens do Rio Sena. Trens de carga freiam nas estações sombrias e, reforçando mais e mais a alegoria, essas máquinas enormes e estrondosas profetizam o apocalipse. A aurora vem conduzindo o sol que resplende e se difunde na forma de douradas laranjas que são descarregadas e distribuídas aos mercados a partir da praça Chatelet, reminiscência etimológica de um castelo fundador. O poema introduz a profusão que vai se estabelecendo da rede de abastecimento de mercadorias e se alastra aos alvos jornais-corvos esvoaçantes aos quatro ventos alardeando manchetes semelhantes ao juízo final em hai-cais, embora “Les haï-kaïs sont des poèmes japonais de trois vers; le premier vers a cinq pieds, le second sept, le troisième cinq.” (Paulhan 329Paulhan, Jean. “Haï-Kaïs par Paul-Louis Couchout et al.”. Nouvelle Revue Française, 1920.):

um cabeleireiro se enforca nos cabelos de sua mulher! 12 negros a bordo do “Goethe” assassinados por causa do culto Ele a ama Ela o ama Dez anos de cadeia.

A foto do Bal Tabarin, belo edifício Art Nouveau de 1904, onde eram apresentados os espetáculos do cancã após o incêndio do Moulin Rouge em 1915, se contrapõe no poema com sua solidez às efêmeras tragédias humanas. “O espaço uma extensão do gesto/ as coisas/ matéria de evocação.”, diz um verso do Cláudio Willer (1981)Willer, Cláudio. “Mais uma vez”. Jardins da provocação: poemas, 1976/1980, Willer, Cláudio (org). São Paulo: Massao Ohno: Roswitha Kempt, 1981, s/p.. O cartão postal com a foto da casa noturna do Quartier Pigalle convoca comoções artísticas, festivas, misteriosas, sensuais, que da noite prosseguem impactando dia adentro.

Os funcionários públicos do Boulevard de la Republique transitam entre os mictórios coloridos - característicos da paisagem parisiense e chamados Vespasianos - na azáfama dos cafés matinais. “Uma felicidade que chega ao fim, dedos que se desenlaçam e um casaco descendo em direção ao dia anônimo, em direção à região da respeitabilidade” (Aragon 48Aragon, Louis. O Camponês de Paris. Tradução Flávia Nascimento. Rio de Janeiro: Imago, 1996.). Na retaguarda, mulheres sofrem. Os versos seguintes ironizam a intimidade nas alcovas: os sobrecéus, dosséis que deveriam velar discretamente a felicidade conjugal, dissimulam o veneno funesto reservado para a eventualidade do suicídio. E o poema traz uma comparação: como a folha caduca do bordo, que no outono fatalmente cai, a mulher é mártir ímpar que antevê com amargura e lábios crispados um trágico desfecho.

Esse poema composto por imagens literais e estilísticas tem a propriedade de promover fricções, tensões indizíveis por meio de palavras, invisíveis por meio das fotos, mas subliminares em forma de montagem.

Os versos seguintes criam uma ambígua imagem. Por um lado, o Bulevar Arago teve durante décadas uma estátua do físico e político François A. que em 1839 defende na Câmara dos Deputados de Paris as perspectivas promissoras da nova invenção, o daguerreótipo, tanto para a astrofísica como para a filologia, uma vez que existia o projeto de empregar a fotografia na pesquisa de corpus de hieróglifos egípcios (BenjaminBenjamin, Walter. “Kleine Geschichte der Photographie”. Walter Benjamin. Gesammelte Schriften, Rolf Tiedemann; Hermann Schweppenhäuser (Orgs.). Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1999, II-1 pp. 368-385. , “Kleine Geschichte der Photographie” 369-370).

No entanto, os versos falam é da instalação em 1909 de uma guilhotina no mesmo bulevar. Com isso, a esquina do Presídio La Santé se transforma num palco de execuções, em que atuava o célebre carrasco francês, Anatole Deibler. Quando de sua morte, em 1939, o que coincide com a retirada da guilhotina dessa esquina, Roger Caillois publica “Sociologia do carrasco”. O ensaio busca definir a maneira como “os instintos profundos, primitivos, inexplicáveis, quem sabe além de toda explicação por serem de natureza biológica e por assim dizer viscerais” [...] “conseguem se articular com necessidades de ordem bem distinta, mecânica e não viva, decorrente de uma dinâmica impessoal como também o são os flagelos da natureza” (Caillois, 6Caillois, Roger. “Sociologie du Bourreau”. Instincts et Société. Essais de Sociologie contemporaine, Roger Caillois (Org). Paris: Éditions Gonthier, 1964.).

Uma estátua Dedicada à noite é erguida Guilhotina no Bulevar Arago Sobre ela pousa o melro azul [...] SOL! Não matarás!

“Paris arde” insiste nessas imagens históricas, que se inclinam simultaneamente aos desdizeres das palavras abertas também, para além das referências, ao seu peso e à sua materialidade:

Juntas as pessoas descobrem a nova natureza Infantis navios a vapor estão ansiosos por St. Cloud Prímulas genuínas circundam a fábrica de gás! Lodo verde ao colo de vetustas deusas [...] A árvore é de súbito pó O regato de menta é réquiem Recua! Não temos tempo para greguices! Roda, roda-gigante do mundo

Os passeios de barco a vapor estão em voga com as viagens regulares entre o Quai d’ Orsay e Saint-Cloud em ambas as direções. Por um preço baixo os parisienses frequentam as feiras de Saint-Cloud, os festivais de Auteuil, bailes e corridas no Hipódromo Longchamp. São alegrias pueris as promenades nos parques estilizados das fábricas em Saint-Cloud. (Les bateaux à vapeur, Paris“Les bateaux à vapeur, Paris”. bateaux mouches.) Assim como a natureza dos espaços suburbanos adquire nova fisionomia, o poema também se transforma.7 7 Sobre a poesia anterior a Mallarmé, ele diz o seguinte: “as pessoas ainda passeiam nas paisagens ornamentais do Parnaso, e mesmo os simbolistas, outrora arrogando-se revolucionários e versolibristas, galgaram o aplauso do público. Mas isso, no balanço do Século XIX, é hoje mero acessório e fachada.” (“Der Geist Mallarmés”, 63) O trecho lega uma representação histórica e concerne à maneira como o crescimento industrial (“1860-1960 Cent ans de patrimoine industrial - Hauts-de-Seine”“1860-1960 Cent ans de patrimoine industrial - Hauts-de-Seine”. https://pt.calameo.com.
https://pt.calameo.com...
) afetou o lazer, a natureza passa a ser artificial, criada por jardineiros.8 8 “Por qué cantáis la rosa, ¡oh Poetas! / Hacedla florecer en el poema;/ Sólo para nosotros/ Viven todas las cosas bajo el Sol. / El poeta es un pequeño Dios.”, diz a “ARTE POÉTICA” de Huidobro. No ensaio de estética “La creación pura”, publicado 1921, o chileno revelou a origem dessa concepção, que, mais que com a tradição ocidental da poesia, atravessa a tradição pré-colombina: “Esta idea de artista como creador absoluto, del Artista-Dios, me la sugirió l pun viejo poeta indígena de Sudamérica (aimará) que dijo: ‘El poeta es un dios; no cantes a la lluvia, poeta, haz llover’”, informação constante da página de Huidobro na Biblioteca Nacional de Chile. Já em “Época de Creación”, publicado em 1921 na revista Création 2, Huidobro alude a elementos desunidos de que resultam obras impuras exaltando a fantasia desregrada. São tendências (que em 1935 Pablo Neruda desenvolve em “Sobre una poesía sin pureza”) contrárias à poésie pure, essa por sua vez simbolista, valorizando imagens e sons e aproximada à arte pela arte. (Schwartz 114)

Figura 2
“La Grande-Roue”

O imperativo do verso - “Roda, roda-gigante do mundo” - reforçado pela foto em cartão postal da Grande-roue montada para a exposição universal de 1900 (“Bureau International des Expositions“Bureau International des Expositions”. https://www.bie-paris.org/site/fr.
https://www.bie-paris.org/site/fr...
”), contrapõe-se a tematizações neoclássicas e ressonâncias empoladas. A engrenagem inflexiona com volume, peso (quatrocentas toneladas) e acepção um campo semântico que figuratiza técnica, mecânica, circuito elétrico, engrenagens, velocidade, rolamentos, giros, eixo vibrante, roldanas, velódromo, motocicletas.

Alta tensão 700.000 Volt O acumulador nevrálgico gira A agulha de platina fende ferida na nuvem

A incisão de ferida que a agulha da Torre perpetra no céu se projeta no tifo epidêmico. As barracas de tratamento estão espalhadas, enfermeiros estão de prontidão. O calor contagiante da febre tão alta derrete geleiras que escorrem líquidas Equador abaixo. Com isso, a angústia do eu-poético se expressa no verso: “e eu temo que meu coração de súbito dispare como um revólver!”

Não há tempo para representações ultrapassadas, tampouco há espaço para a subjetividade, afirmam os versos num rearranjo, após o tom confessional. Sob o apito fanhoso das sirenes a pétrea esfinge vigilante ordena em letras garrafais: “TRABALHO TRABALHO”. Cães farejadores controlam, disciplinam com ações intransitivas circunscritas ao périplo de vida: “fundir forjar cortar soldar refazer escavar arar aquecer limpar bordar registrar carregar morrer.”

Apesar do lema inscrito nas palavras de ordem da histórica luta contra a vilania, as pessoas estão cada vez mais empobrecidas. Explicita isso a semeadora Ceres referida como “puta dos aposentados”, figura feminina que segue esculpida nas moedas de dois francos em seu ousado movimento de “dançarina de tango”. A desvalorização e as oscilações monetárias têm lugar desde o início da Primeira Guerra e, por conseguinte, a moeda com a deusa de barrete frígio puxado para trás deixa de ser cunhada em prata (“les archives numismatiques“Les archives numismatiques”. https://www.cgb.fr/archive.html.
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”). Os encouraçados, navios-símbolos da corrida armamentista no início do século XX, encontram-se ancorados de prontidão junto aos portos de Senegal, do Canadá, não restando assim dúvidas quanto aos reais propósitos dessa “virgem de cabaré com sua cabeleira azul-branca-vermelha”. A sua face verdadeira é a indigência que assola as ruas, e o poema descreve em versos o quadro da fome e da desolação espiritual.

E os versos ecoam como suspiros evocativos:

Oh Place de la Concorde O que mostra O obelisco Da sabedoria?

No meio da praça se ergue um monolito que tem nas faces inscrições gravadas que rendem loas às obras de Ramsés II. Foi um presente do Pasha da Alexandria em agradecimento às pesquisas exitosas do linguista Champollion. O Dictionnaire des Rues de ParisLazare, Félix. Lazare, Louis. Dictionnaire des Rues de Paris et de ses Monuments. Paris: 1844. registra que um enorme navio foi enviado ao Egito para trazer à França um dos dois monolitos da entrada ao túmulo do faraó, em Luxor. Três anos decorrem entre entraves sem fim até que no dia 25 de dezembro de 1833 o obelisco foi erguido e fixado na Place de la Concorde, para a glória do faraó. Mas o poema “Ozimândias” do inglês Percy B. Shelley, soneto intitulado com a forma helenizada do nome Ramsés, sublinha o efêmero poder dos impérios. Milhares de pessoas passam pela praça e são incapazes de ler a inscrição triunfal. BenjaminBenjamin, Walter. Rua de Mão Única. Infância berlinense: 1900. Tradução João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica, 2017. se diverte com a antítese: “[...] toda a glória cumpre a sua promessa, e não há oráculo que se lhe compare em astúcia. Porque o imortal é como o obelisco: regula um trânsito espiritual que brama em seu redor, e a ninguém serve a inscrição que nele está gravada.” (Dicionário das ruas de Paris, 33)

O poema “Paris arde” reserva às lideranças políticas das metrópoles uma indagação bem franca. É a época da Conferência de Paz que leva ao Tratado de Versailles, é a época da frustração do corpo diplomático japonês por não ver aprovada sua proposta de uma Cláusula de Igualdade Racial na carta fundadora da Liga das Nações. São os cinquenta mil soldados provenientes da colônia Ilha de Madagáscar combatendo pela França na Primeira Guerra Mundial, conforme o documentário “Madagascar et la Première Guerre Mondiale”Filme documentário “Madagascar et la Première Guerre Mondiale”. Extraits D’histoires De Madagascar.. Os sobreviventes, dentre eles Jean Ralaimongo (1884-1943), tentavam o reconhecimento de seus direitos, com o apoio do Partido Comunista e da Ligue française pour l’accession des indigènes de Madagascar aux droits des citoyens français. Como os escravos negros-brasileiros alforriados para combater na Guerra do Paraguai, que quando do retorno reclamam seus direitos, também em vão. Sem chances!

VIVA A FRANÇA! Acidente Rumores Câmera lenta Uma cabeça Um chapéu Uma cabeça de cinquenta mil cabeças Cabelo repartido, bem burguês Cabeça Cai Rola Oh máquina implacável Sangue Estrelas - oh! Oh cabeça com barba patriarcal Talvez tenha sido João Batista Ainda agora desembarcado do metrô Uma cabeça qualquer Minha cabeça talvez…

Esse trecho do longo “Paris brennt”, “VIVA A FRANÇA!” é um poema autônomo publicado em 14 de julho de 1922 numa edição extra da Zenit. Sugere uma sequência de imagens que poderiam ser tomadas de um roteiro cinematográfico. Depois da exclamação em júbilo do título, o fato não explicitado tanto pode ser um acidente de carro (Autorad) como uma decapitação numa máquina acionável por um sistema. A reação do público alvoroçado diante da cena produz rumores, está relacionada com uma cabeça, um chapéu, a cabeça rola e seu movimento remete a tantas cabeças que rolaram, inclusive à mítica cabeça traída de São João Batista: decapitado e ostentado em bandeja, como a advertência na esquina pública. O que está em jogo nesse poema é possivelmente a impotência do indivíduo sujeito a poderosas decisões de instâncias, sistemas, nações. Cabeças rolam, literalmente.

O inventário de versos justapostos e a valoração de máquinas são técnicas que encontram estratégias paralelas nas experimentações cubistas das artes plásticas. Carl Einstein reflete que Fernand Léger (1881-1955) teria durante a guerra compreendido a potência da máquina e da conjuntura de seu tempo. As criações técnicas, que influenciam e constituem nossa vida, não teriam sido em sua obra somente utilidade e objetividade, senão fontes equivalentes a uma visão inteiramente nova, desviante dos organismos viventes (planta, árvore). Agora se estima o que é criação humana: “puro mito maquínico”. (109) O ensaio “Fernand Léger” de Goll igualmente mostra essa afinidade: “Entusiasmado, destrói todas as formas. Dinâmica: eis sua lei original. Luta com matéria, frenesi às claras. Como peças mecânicas, os membros de deus e do humano são separados. Tudo é máquina.” (“Fernand Léger”, 369Goll, Yvan. “Fernand Léger”. Gefangen im Kreise: Dichtungen, Essays und Briefe, Goll. Iwan (org). Leipzig: P. Reclam, 1988, pp. 368-370.)

O dínamo escarlate de Fernand Léger/ Explodiu a argamassa dos muros./ Lipschitz deixa as novas esfinges cantarem/ Cresce grama nas orelhas dos apóstolos góticos.

A produção de onomatopeias polissêmicas: “knock out”, literalmente o nocaute do boxe, e a fúria das “Singers Nähmitrailleusen”, “metralhadoras de costura Singer” de que se mune a indústria têxtil, infunde na linguagem um ritmo laboral, artifical, não como temas, inerências. E as efemérides do anuário complementam a montagem do poema-notícia que insere a foto paradigmática de um atleta portando a faixa “Dubuque”.

Figura 3
“Dubuque”

Só mesmo uma promessa do atletismo para a medalha olímpica de salto em distância nas Olimpíadas da Antuérpia em 1920 mereceria a foto impressa nas páginas dos jornais. O estadunidense Solomon “Sol” Butler, todavia, em virtude de uma grave lesão física, não satisfez a expectativa de vitória.

O poema mostra Paris ardente queimando noite adentro. Basta deter o olhar e a metrópole se desencanta.

BLAISE CENDRARS O Tour Eiffel Feu d’artifice géant de l’Exposition Universelle ВАЛЕНТИН ПАРНАХ Пресс гидравлический в ночи меднобетонной 800 тонн 16 рычагов орудуют колонной И ребр уклон Скрещенья скрениты и скреб Тормазов стриней и стропил Скрип крутьев и стрил решеток ребр Шмыг риз и грыз когтей и пил VICENTE HUIDOBRO Los hombras de manana Vendran a descrifrar los jeroglificos Que dejamos ahora Escritos la reves [sic] Entre los hierros, de la Torre Eiffel.9 9 Embora Huidobro tenha publicado dois poemas “Tour Eiffel”, ambos escritos em francês: o primeiro, em 1917, dedicado a Max Jacob, pertence à série de poemas pintados; o segundo, em 1918, dedicado a Delaunay, poema que possui traços do gênero caligramático (Lorenzo 2018 188), trata-se em “Paris arde” de um fragmento de “Sale la luna”, uma das peças de Equatorial. Imprenta Pueyo. Madrid, 1918: “Los hombres de mañana/ Vendrán a descifrar los jeroglíficos/ Que dejamos ahora/ Escritos al revés/ Entre los hierros de la Torre Eiffel.”
  • 1
    No Diário de S. Paulo de 25 de maio de 1936, a pintora brasileira Tarsila do Amaral se reporta aos estudos desse pintor: “Delaunay integrou-se no movimento cubista e sentiu, como os seus colegas, a febre do dinamismo, o delírio do desenho hieroglífico criado pela recente estética, a ânsia de concretizar o novo estado de espírito em ebulição. A Torre Eiffel é um símbolo.” (Amaral 71-73Amaral, Aracy. (org.) Tarsila cronista. São Paulo: EDUSP, 2001.)
  • 2
    Há uma controvérsia sobre a data “8.9.1920” - que o tornaria pioneiro na experimentação da forma -, devido à letra desconhecida no manuscrito “Neue Hai-Kais” de Yvan Goll, do Deutsches Literaturarchiv Marbach. É, todavia, possível, em vista da antologia, certamente de seu conhecimento, que foi publicada em 1 de setembro de 1920 por Jean Paulhan na Nouvelle Revue Française, com diversos escritores franceses. Somente em 1926 saem os “Haï-Kaïs” de Goll na Revista Die Literarische Welt: “nosso temperamento nervoso carece de uma forma breve: senão nos entediamos. Antevemos tudo excessiva e rapidamente. E ai do poeta que o leitor consegue antever. O mais importante na arte é o elemento surpresa”. (“Neue Hai-Kai”, 331Goll, Ivan. “Neue Hai-Kai”. Yvan Goll - die Lyrik I, Barbara Glauert-Hesse (edição e comentários). Berlin: Argon, 1996, pp. 336-337.)
  • 3
    A forma arcaica tanka, do século VIII, se transforma numa espécie de diálogo, renga (em que uma voz fala a estrofe inicial e outra a lateral, fechando no kigo). Daí deriva mais tarde o haicai, forma ainda mais breve, conforme Kensuko Tamai na palestra “O tanka e o sentimentos dos japoneses”, proferida no Centro de Estudos Nipo-brasileiros em 22 de outubro de 1985.
  • 4
    Salvo indicação expressa, as traduções de obras estrangeiras deste artigo são de minha autoria. Os trechos de minha tradução do poema, intitulada “Paris arde”, e os cartões postais legendados vêm sem a identificação de página, pois se trata de trabalho inédito.
  • 5
    Evidentemente ele recupera também certos princípios norteadores da poesia de Mallarmé (que traduziu ao alemão): “A palavra se torna substância. Ela não está mais ali, como meio para um fim, para imitar, descrever, copiar fatos, dados, da natureza, como a literatura comumente o entende: meio de troca entre as pessoas sem espirituosidade - torna-se a palavra do poeta. A criação com efeito surge. Algo que nunca existiu grita pela primeira vez no mundo. Algo completamente diferente da habitual pátina que recobre a brilhante existência terrena. O poeta tira a palavra de sua língua materna; é, sim, linguagem, matéria, e a arte processa essa matéria-prima [...]”. “Der Geist Mallarmés”Goll, Iwan. “Der Geist Mallarmés”. Die drei guten Geister Frankreichs. Tribüne der Kunst und Zeit - eine Schriftensammlung. Erdschmid, Kasimir. Berlin: Erich Reiß Verlag, 1919, pp. 62-76.. (fls. 62-76, aqui p. 69) In: Die drei guten Geister Frankreichs.
  • 6
    No Brasil recomendo três leituras sobre essa fase da poesia de Yvan Goll. Brion, Marcel. “A Poesia de Claire e Yvan Goll”Goll, Yvan; Brion, Marcel. “A Poesia de Claire e Yvan Goll”. ANHEMBI, Duarte, Paulo (diretor)., ano V, número 55, vol. XIX, junho de 1955, pp. 14-22.. In: Duarte, Paulo (diretor). ANHEMBI, ano V, número 55, vol. XIX, junho de 1955, pp. 14-22. Goll, YvanGoll, Yvan. O Fruto de Saturno. Tradução Márcio Simões. Natal: Sol Negro Edições, 2013.. O Fruto de Saturno. Tradução Márcio Simões. Natal: Sol Negro Edições, 2013. E, no ensejo da edição desse livro, Floriano Martins traduz e publica em 2014 na Agulha (online) a entrevista “Yvan Goll e a erva mágica da poesia”, de Thomas Rain Crowe com Nan Watkins.
  • 7
    Sobre a poesia anterior a Mallarmé, ele diz o seguinte: “as pessoas ainda passeiam nas paisagens ornamentais do Parnaso, e mesmo os simbolistas, outrora arrogando-se revolucionários e versolibristas, galgaram o aplauso do público. Mas isso, no balanço do Século XIX, é hoje mero acessório e fachada.” (“Der Geist Mallarmés”, 63)
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    “Por qué cantáis la rosa, ¡oh Poetas! / Hacedla florecer en el poema;/ Sólo para nosotros/ Viven todas las cosas bajo el Sol. / El poeta es un pequeño Dios.”, diz a “ARTE POÉTICA” de Huidobro. No ensaio de estética “La creación pura”, publicado 1921, o chileno revelou a origem dessa concepção, que, mais que com a tradição ocidental da poesia, atravessa a tradição pré-colombina: “Esta idea de artista como creador absoluto, del Artista-Dios, me la sugirió l pun viejo poeta indígena de Sudamérica (aimará) que dijo: ‘El poeta es un dios; no cantes a la lluvia, poeta, haz llover’”, informação constante da página de Huidobro na Biblioteca Nacional de Chile. Já em “Época de Creación”, publicado em 1921 na revista Création 2, Huidobro alude a elementos desunidos de que resultam obras impuras exaltando a fantasia desregrada. São tendências (que em 1935 Pablo Neruda desenvolve em “Sobre una poesía sin pureza”) contrárias à poésie pure, essa por sua vez simbolista, valorizando imagens e sons e aproximada à arte pela arte. (Schwartz 114Schwartz, Jorge. Las vanguardias latinoamericanas. Textos programáticos y críticos. Tradução Estela dos Santos. México: FCI, 2002.)
  • 9
    Embora Huidobro tenha publicado dois poemas “Tour Eiffel”, ambos escritos em francês: o primeiro, em 1917, dedicado a Max Jacob, pertence à série de poemas pintados; o segundo, em 1918, dedicado a Delaunay, poema que possui traços do gênero caligramático (Lorenzo 2018Lorenzo, Núria D’ Aprer H. de. “Las dos ‘Tour Eiffel’ de Vicente Huidobro: Sentidos icónicos y traducción de poesía visual”. Estudios Filológicos, número 61. Universidad Austral de Chile. (2018): 187-213. 188), trata-se em “Paris arde” de um fragmento de “Sale la luna”, uma das peças de Equatorial. Imprenta Pueyo. Madrid, 1918: “Los hombres de mañana/ Vendrán a descifrar los jeroglíficos/ Que dejamos ahora/ Escritos al revés/ Entre los hierros de la Torre Eiffel.”

Referências

  • Amaral, Aracy. (org.) Tarsila cronista São Paulo: EDUSP, 2001.
  • Aragon, Louis. O Camponês de Paris Tradução Flávia Nascimento. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
  • Benjamin, Walter. “Kleine Geschichte der Photographie”. Walter Benjamin. Gesammelte Schriften, Rolf Tiedemann; Hermann Schweppenhäuser (Orgs.). Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1999, II-1 pp. 368-385.
  • Benjamin, Walter. Rua de Mão Única. Infância berlinense: 1900 Tradução João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica, 2017.
  • Caillois, Roger. “Sociologie du Bourreau”. Instincts et Société. Essais de Sociologie contemporaine, Roger Caillois (Org). Paris: Éditions Gonthier, 1964.
  • Campos, Haroldo. “A poética da vanguarda”. A arte no horizonte do provável, Haroldo de Campos (org). São Paulo: Perspectiva, 1977, pp. 129-222.
  • Domin, Hilde. “Plädoyer gegen die ‘Verniemandung’ von Yvan Goll”.Aber die Hoffnung - Autobiographisches aus und über Deutschland München: Piper, 1984, pp. 162-164.
  • Einstein, Carl. Die Kunst des 20. Jahrhunderts Berlin: Propyläen, 1931.
  • Ellmann, Richard. James Joyce - new and revised edition New York: Oxford University Press, 1982.
  • Goll, Iwan. “Der Geist Mallarmés”. Die drei guten Geister Frankreichs Tribüne der Kunst und Zeit - eine Schriftensammlung Erdschmid, Kasimir. Berlin: Erich Reiß Verlag, 1919, pp. 62-76.
  • Goll. Iwan. Ein Poem nebst Postkartenalbum. Paris brennt Zagreb: 2 Biblioteka Zenit, 1921.
  • Goll, Yvan; Brion, Marcel. “A Poesia de Claire e Yvan Goll”. ANHEMBI, Duarte, Paulo (diretor)., ano V, número 55, vol. XIX, junho de 1955, pp. 14-22.
  • Goll, Ivan. “Das Wort an sich”. Expressionismus: Manifeste und Dokumente zur deutschen Literatur 1910 – 1920, Thomas, Anz; Michael, Stark. (Eds.). Stuttgart: METZLAR, 1982.
  • Goll, Yvan. “Fernand Léger”. Gefangen im Kreise: Dichtungen, Essays und Briefe, Goll. Iwan (org). Leipzig: P. Reclam, 1988, pp. 368-370.
  • Goll, Ivan. “Neue Hai-Kai”. Yvan Goll - die Lyrik I, Barbara Glauert-Hesse (edição e comentários). Berlin: Argon, 1996, pp. 336-337.
  • Goll, Yvan. O Fruto de Saturno Tradução Márcio Simões. Natal: Sol Negro Edições, 2013.
  • Jacquement, Gérard. “Belleville aux XIXe et XXe siécles”. Annales 1975. https://www.persee.fr
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  • Lazare, Félix. Lazare, Louis. Dictionnaire des Rues de Paris et de ses Monuments Paris: 1844.
  • Lorenzo, Núria D’ Aprer H. de. “Las dos ‘Tour Eiffel’ de Vicente Huidobro: Sentidos icónicos y traducción de poesía visual”. Estudios Filológicos, número 61. Universidad Austral de Chile. (2018): 187-213.
  • Paulhan, Jean. “Haï-Kaïs par Paul-Louis Couchout et al”. Nouvelle Revue Française, 1920.
  • Schwartz, Jorge. Las vanguardias latinoamericanas. Textos programáticos y críticos Tradução Estela dos Santos. México: FCI, 2002.
  • Ullmaier, Johannes. Yvan Golls Gedicht “Paris brennt” Tübingen: Max Niemeyer, 1995.
  • Willer, Cláudio. “Mais uma vez”. Jardins da provocação: poemas, 1976/1980, Willer, Cláudio (org). São Paulo: Massao Ohno: Roswitha Kempt, 1981, s/p.
  • “1860-1960 Cent ans de patrimoine industrial - Hauts-de-Seine”. https://pt.calameo.com
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  • “Les archives numismatiques”. https://www.cgb.fr/archive.html
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  • “Bureau International des Expositions”. https://www.bie-paris.org/site/fr
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  • “Les bateaux à vapeur, Paris”. bateaux mouches.
  • Filme documentário “Madagascar et la Première Guerre Mondiale”. Extraits D’histoires De Madagascar.
  • Cartões postais: “Tour Eiffel”, “La Grande-Roue” e “Dubuque”. Goll, Iwan. Ein Poem nebst Postkartenalbum. Paris brennt Zagreb: 2 Biblioteka Zenit, 1921.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2021

Histórico

  • Recebido
    10 Maio 2021
  • Aceito
    13 Ago 2021
  • Publicado
    Set 2021
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