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Um laboratório da Fundação Rockefeller: interação médica e produção de conhecimento científico na saúde internacional* * Agradeço à supervisão do professor Dr. André Mota e à equipe do Museu Histórico Prof. Carlos da Silva Lacaz pelos diálogos estabelecidos, pelas condições para a realização do estudo e pelo acolhimento afetuoso em tempos de pandemia.

A Rockefeller Foundation laboratory: Medical interaction and production of scientific knowledge in international health

Resumo:

O presente artigo analisa a recepção do Laboratório da Fundação Rockefeller na Bahia, entre 1928 e 1930, como propulsor de interações entre agentes de saúde e agentes de construção de conhecimento científico. São utilizados como fontes relatórios, textos diversos, diários e correspondências de profissionais que atuaram na pesquisa e no controle da febre amarela, além do periódico soteropolitano A Tarde. Conclui-se que a presença do laboratório foi de fundamental importância para a produção e interpretação de dados sobre mosquitos, amarílica e malária em Salvador e em cidades do interior da Bahia. As pesquisas desenvolvidas naquele espaço foram publicadas como contribuição valiosa para a compreensão de aspectos da febre amarela e, eventualmente, apresentadas em eventos nacionais, a exemplo do V Congresso Brasileiro de Higiene. Além disso, foi possível observar desconfianças e conflitos de interesses entre brasileiros e norte-americanos ao longo da atuação da agência internacional no Estado da Bahia.

Palavras-chave:
Fundação Rockefeller; laboratório; saúde internacional

Abstract:

The present article analyzes the reception of the Rockefeller Foundation Laboratory in Bahia, between 1928 and 1930, as a driver of interactions between health agents and agents of scientific knowledge construction. Reports, several texts, diaries and correspondence from professionals who worked in the research and control of yellow fever are used as sources, in addition to the journal A Tarde. It is concluded that the presence of the laboratory was of fundamental importance for the production and interpretation of data on mosquitoes, yellow fever and malaria in Salvador and in cities in the countryside of Bahia. The research developed in that space was published as a valuable contribution to the understanding of aspects of yellow fever and, eventually, presented at national events, such as the V Brazilian Congress of Hygiene. In addition, it was possible to observe mistrust and conflicts of interest between Brazilians and North Americans throughout the performance of the international agency in Bahia State.

Keywords:
Rockefeller Foundation; laboratory; international health

Este texto tem como objetivo analisar a recepção do Laboratório da Fundação Rockefeller na Bahia, entre 1928 e 1930, como promotor de interações entre agentes de saúde e agentes de construção de conhecimento científico sobre a febre amarela. A instituição funcionou em Salvador até 1934, quando parte das suas atividades foi transferida para o Rio de Janeiro. Utilizou-se como fontes relatórios, diários, textos e cartas de profissionais que atuaram no controle e na pesquisa sobre a amarílica nos Estados do Norte1 1 Ao longo de toda a década de 1920, a região Nordeste ainda era conhecida como Região Norte do Brasil. , além do periódico soteropolitano A Tarde.2 2 Todos os documentos em inglês foram traduzidos pelo autor desse texto.

A filantropia da Fundação Rockefeller iniciou-se nos primeiros anos do século XX e contribuiu para desenvolver a saúde em diversos lugares, a exemplo das Américas, da Europa e da África.3 3 A atuação da Fundação Rockefeller no campo da saúde se deu em 1909 pela criação da Rockefeller Sanitary Comission for Erradication of Hookwoorm Disease, que, em 1913, se transformou em International Health Comission (IHC) e em 1916 foi renomeada de International Health Board (IHB). De 1927 até seu fechamento, em 1951, se intitulou International Health Division (IHD). A agência desempenhou papel importante para a construção da chamada saúde internacional (cf. CUETO 2007CUETO, Marcos. O valor da saúde: história da organização pan-americana da saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007., 2015CUETO, Marcos. Saúde Global: uma breve história. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2015. ; CUETO; PALMER, 2016CUETO, Marcos; PALMER, Steven. Medicina e saúde pública na América Latina: uma história. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2016.).4 4 Para mais informações sobre a atuação da Fundação Rockefeller na saúde internacional/global, conferir Batista e Porto (2021). Essa nova noção surgiu na intersecção da internacionalização econômica e científica e envolveu, ao mesmo tempo, o local, o nacional e os interesses públicos e privados. Isso ocorreu em um contexto de imigração em larga escala dos europeus para vários países e de explosão do capitalismo industrial e do comércio, o que aumentou a ameaça de doenças epidêmicas em todo o mundo. Surtos de peste, febre amarela, cólera e outras doenças não eram mais motivos de preocupação local, disputas binárias ou gerentes coloniais. Há muito tempo, as potências imperiais prestavam atenção no papel da saúde pública na proteção dos exércitos colonizadores: “o crescimento da interdependência econômica aumentou os perigos potenciais da doença e tornou o seu controle um assunto político muito mais complicado, envolvendo ambientes dentro e além das estruturas imperiais existentes” (BIRN, 2006BIRN, Anne-Emanuelle. Marriage of convenience: Rockefeller International Health and revolutionary Mexico. New York: University of Rochester Press, 2006., p. 5).

Embora exista uma ampla bibliografia que se dedica à análise da atuação da Fundação Rockefeller no controle da febre amarela no Brasil, não existem estudos voltados especificamente ao laboratório de Salvador. Em uma perspectiva mais ampla, Marcos Cueto (1995CUETO, Marcos. The cycles of eradication: the Rockefeller Foundation and Latin American Public Health 1918-1940. In: WEINDLING, Paul (ed.). International Health organizations and movements 1918-1939. Cambridge: Cambridge University Press, 1995. p. 222-243.) analisa os ciclos de erradicação da ancilostomíase, da febre amarela e da malária, promovidos pela agência internacional no país. Jaime Benchimol (2001BENCHIMOL, Jaime Larry. Febre amarela: a doença e a vacina, uma história inacabada. 20. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Bio-Manguinhos, 2001.) investiga a trajetória científica em busca de uma vacina para a amarílica e, devido a importância do laboratório, destaca o seu papel no recebimento de amostras de fígado e de sangue de diferentes estados.

Ao estudar as relações políticas e científicas no combate à enfermidade, Ilana Löwy (2006LÖWY, Ilana. Vírus, mosquitos e modernidade: a febre amarela no Brasil entre a ciência e a política. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2006.) descreve a experiência com camundongos no laboratório, em 1931. Aleidys Tasco (2016TASCO, Aleidys Hernandez. A construção de um Modelo Internacional de Saúde Pública: o Programa dos Laboratórios de Febre Amarela da Fundação Rockefeller nos Estados Unidos, América do Sul e África (1935-1950). 2016. Tese (doutorado) - Instituto de Geociências, Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, 2016.) analisa o Programa dos Laboratórios de Febre Amarela da Fundação Rockefeller nos Estados Unidos, na América do Sul e na África, entre 1935 e 1950. Como a sua definição cronológica é posterior ao funcionamento do laboratório de Salvador, não se deteve sobre as suas ações. E, ao se voltar para a campanha de erradicação da febre amarela nas Américas, Rodrigo Magalhães (2016MAGALHÃES, Rodrigo Cesar da Silva. A Erradicação do Aedes aegypti: febre amarela, Fred Soper e saúde pública nas Américas (1918-1968). Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2016.) destaca o papel da instituição soteropolitana para a centralização das investigações sobre a doença na América do Sul e aponta para um “intenso intercâmbio de pesquisas, amostras e dados com o Laboratório de Lagos, na Nigéria, contribuindo para um melhor entendimento da doença nos continentes africano e americano” (MAGALHÃES, 2016MAGALHÃES, Rodrigo Cesar da Silva. A Erradicação do Aedes aegypti: febre amarela, Fred Soper e saúde pública nas Américas (1918-1968). Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2016., p. 81).

Paloma Porto analisa a existência de laboratórios no Nordeste brasileiro e destaca aquele criado em Recife pela Comissão Sanitária Federal, além dos da Paraíba do Norte (Paraíba), de Natal e de Maceió. Para a autora, o laboratório da Bahia certamente foi o mais importante para os estudos sobre a febre amarela durante a década de 1920, “merecendo um outro trabalho historiográfico que olhe mais de perto os seus significados para a cultura científica do Nordeste, e em especial da própria Bahia” (PORTO, 2020PORTO, Paloma. Regimes de prova: a presença do laboratório no combate à febre amarela no Nordeste brasileiro (1916-1930). In: BATISTA, Ricardo dos Santos; SOUZA, Christiane Maria Cruz de; SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. Quando a História encontra a Saúde. São Paulo: Hucitec, 2020. p. 345-367., p. 362).

O intervalo entre 1928 e 1932 demarca transformações cruciais na história da febre amarela no mundo, orientadas pela completa conjunção de fatores de natureza social e política, técnica, científica e epidemiológica. Após ter sido considerada erradicada no Norte, a enfermidade ressurgiu em surtos ocorridos no ano de 1926 (cf. BATISTA; SOUZA, 2020BATISTA, Ricardo dos Santos; SOUZA, Christiane Maria Cruz de. O curso da epidemia: a Fundação Rockefeller e os surtos de febre amarela na Bahia em 1926. Outros Tempos, São Luiz, v. 17, n. 30, p. 219-243, 2020. Disponível em: https://www.outrostempos.uema.br/index.php/outros_tempos_uema/article/view/787#:~:text=Este%20texto%20tem%20como%20objetivo,%E2%80%9D%2C%20defendida%20pela%20Funda%C3%A7%C3%A3o%20Rockefeller . Acesso em: 15 out. 2020.
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; BATISTA, 2021BATISTA, Ricardo dos Santos. “Nós não compreendemos exatamente o que ela quis dizer com ‘vômito negro’”: Fundação Rockefeller, ciência e a epidemia de febre amarela de 1926. Topoi, Rio de Janeiro, v. 22, n. 48, p. 713-739, set./dez., 2021.) e ajudou a questionar a teoria dos focos-chave5 5 A teoria dos focos-chave foi a base do plano de erradicação da febre amarela em um empreendimento mundial levado a cabo pela Fundação Rockefeller. Esse método de compreensão sobre a existência da amarílica considerava necessário que o mosquito Aedes aegypti fosse reduzido até um índice inferior a 5% nos grandes centros litorâneos para que a doença desaparecesse. O questionamento da teoria ameaçava todo um investimento realizado pela agência filantrópica internacional em torno da erradicação da febre amarela, visto que esta defendeu publicamente o método nos lugares em que atuou, além de financiar pesquisas e campanhas sustentadas nesse conhecimento. . Em 1928 esse paradigma também declinava devido à epidemia da amarílica no Rio de Janeiro. Além disso, o macaco rhesus havia sido infectado na África e derrubou os modelos animais e teorias etiológicas vigentes, o que contribuiu para um surto de pesquisas originais e para o desenvolvimento de novas técnicas aplicáveis ao trabalho de laboratório e ao trabalho de campo (BENCHIMOL, 2001BENCHIMOL, Jaime Larry. Febre amarela: a doença e a vacina, uma história inacabada. 20. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Bio-Manguinhos, 2001., p. 125). Enquanto isso, na Bahia, o Laboratório da Febre Amarela era implantado em meio às desconfianças e aos conflitos presentes nas relações estabelecidas entre membros da Fundação Rockefeller e agentes brasileiros, em um imbricamento de questões nacionais com interesses individuais que envolveram a atuação da instituição filantrópica.

Personagens em movimento: agentes nacionais e internacionais, laboratório e febre amarela

A presença da Fundação Rockefeller no Brasil data de 1916, com a primeira viagem realizada pelos seus agentes ao país. Os norte-americanos realizaram pesquisas para compreender aspectos epidemiológicos e para escolher uma instituição de ensino na qual seriam promovidos pressupostos do novo modelo de ensino médico, preconizado pelo Relatório Flexner, escrito pelo médico canadense Abraham Flexner e publicado em 1910 (MARINHO, 2013MARINHO, Gabriela S. M. C. Elites em negociação: breve história dos acordos entre a Fundação Rockefeller e a Faculdade de Medicina de São Paulo (1916-1931). In: MARINHO, Gabriela S. M. C.; MOTA, André (org.). Caminhos e trajetos da filantropia científica em São Paulo. São Paulo: USP/UFABC/CD.G Casa de Soluções Editora, 2013. p. 79-80.). Antes da instalação do laboratório, em 1928, a agência filantrópica já havia mantido uma instituição dessa natureza na Bahia, em 1923, dirigida pelo bacteriologista Hideyo Noguchi, que mobilizou uma série de profissionais em busca de amostras de sangue para tentar comprovar que o agente patológico identificado por ele, Leptospira icteroides, era causador da doença (BENCHIMOL et al., 2009BENCHIMOL, Jaime Larry; SÁ, Magali Romero; KODAMA, Kaori; ANDRADE, Márcio Magalhães; CUNHA, Vivian da Silva. Cerejeiras e cafezais: relações médico-científicas entre Brasil e Japão e a saga de Hideyo Noguchi. Rio de Janeiro: Bom Texto, 2009.). Imediatamente após essa experiência o médico baiano Octavio Torres, que atuou como um auxiliar durante a sua passagem pela Bahia, o seguiu para os Estados Unidos com o objetivo de se especializar em saúde pública e pesquisou sobre febre amarela no seu laboratório em Nova Iorque (BATISTA, 2020cBATISTA, Ricardo dos Santos. De Baltimore às “Lavras Diamantinas”: internacionalização/interiorização da saúde na Bahia (1920-1930).Tempo, Rio de Janeiro, v. 26, n. 2, p. 430-453, mai./ago. 2020c. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-77042020000200430 . Acesso: 12 set. 2020.
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, p. 436).

O trabalho desenvolvido pela chamada Comissão da Febre Amarela6 6 A Comissão da Febre Amarela foi criada a partir do decreto nº 16.000, de 31 de dezembro de 1923 e que delegou ao International Health Board e ao Departamento Nacional de Saúde Pública a responsabilidade conjunta da eliminação do Aedes aegypti nas cidades litorâneas do Norte do Brasil. A supervisão dos trabalhos foi atribuída a uma Comissão da Febre Amarela composta por dois representantes de cada órgão e chefiada por um membro do último (cf. BENCHIMOL, 2001, p. 119; BATISTA; SOUZA, 2020, p. 230-231). no Norte do país foi realizado com o auxílio dos membros do staff da Fundação Rockefeller desde 1923, quando se firmou um acordo com a União. Esses profissionais se deslocavam constantemente pelas linhas férreas nos diferentes Estados em que a instituição esteve presente na década de 1920. A reordenação de pessoal, realizada em setembro de 1927, por exemplo, indica como eles eram posicionados para tentar erradicar a amarílica: H. A. Henry foi transferido de Salvador para Fortaleza, A. W. Burke de Recife para a Bahia, Lucien Smith de Fortaleza para a Paraíba (ou para viagens), J. Austin Kerr para a Paraíba (para a estação local ou para viagens), Mario Bião para Natal e se pensava em dispensar, em breve, os serviços de Arthur Sainza. Michael Connor se propôs a assumir a estação de controle da febre amarela em Recife e, quando fosse necessário, a deixaria sob a supervisão direta de Gouveia de Barros, chefe da profilaxia rural (CONNOR para Russell, 15 ago. 1927CONNOR para Russell. 15 de agosto de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, FA 115, Box 293, Folder 3715.).

Em relação aos profissionais que trabalhavam para a Rockefeller, especificamente na Bahia, Francisco Freire de Carvalho, graduado pela Faculdade de Medicina da Bahia (FMB) em 1914, era considerado a pessoa ideal para auxiliar o Secretário de Saúde e Assistência Pública, ex-bolsista da Fundação Rockefeller e inspetor do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), Antônio Luis Cavalcanti de Albuquerque de Barros Barreto7 7 Destaca-se que Barros Barreto havia sido enviado à Bahia após um conflito explícito entre o representante do DNSP, Sebastião Barroso, e o IHB, em 1923, devido às divergências entre os métodos adotados pela agência filantrópica internacional para a erradicação da amarílica (BENCHIMOL, 2011; PONTES, 2007). Esperava-se que o fato de ser inspetor do DNSP e ex-bolsista da Fundação Rockefeller colaborasse para uma harmonização entre instancias nacionais e internacionais, o que se verá, não ocorreu da forma desejada. , a partir de 1928, quando ele esperava assumir o controle total das ações contra a febre amarela, com a transferência das responsabilidades da agência filantrópica internacional. Connor confiava no trabalho de Freire e recomendou que Frederick Russell, diretor da International Health Division (IHD), lhe oferecesse uma bolsa de estudos nos Estados Unidos para uma formação considerada mais adequada para o desempenho das suas funções (CONNOR para Russell, 30 ago. 1927CONNOR para Russell. 30 de agosto de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, FA 115, Box 293, Folder 3715.). Contudo, a resposta foi negativa (RUSSELL para Connor, 15 set. 1927RUSSELL para Connor. 15 de setembro de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, FA 115, Box 293, Folder 3715.).

Em uma outra investida, John H. Janney, diretor regional do IHD, solicitou que Russell oferecesse uma bolsa não só a Freire de Carvalho, mas também a Mario Bião, para o estudo da malária. Segundo Janney, ele estava “muito favoravelmente inclinado” a ceder, o que não ocorreria antes do fim de 1928 e início de 1929 (JANNEY para Connor, 21 set. 1927JANNEY para Connor. 21 de setembro de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, FA 115, Box 293, Folder 3715.). Mas Freire de Carvalho renunciou à posição que exercia há quase quatro anos na Comissão da Febre Amarela, aceitou um emprego no interior do Estado e pediu demissão (RUSSEL para White, 10 out. 1927RUSSELL para White. 10 outubro de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, FA 115, Box 291, Folder 3702.). Mesmo assim, outros médicos como Serafim Júnior, Eduardo de Araújo e chefes dos postos de profilaxia rural (BATISTA; SOUZA, 2021BATISTA, Ricardo dos Santos; SOUZA, Christiane Maria Cruz de. Interiorização da assistência à saúde no Brasil: o Serviço de Saneamento Rural e o controle das enfemias rurais na Bahia (1920-1930). Fênix - Revista de História e Estudos Culturais. v. 18, n. 2, p. 134-160, 2021. Disponível em: https://www.revistafenix.pro.br/revistafenix/article/view/1040 . Acesso em: 1 jan. 2022.
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) interagiram com os norte-americanos em expedições ao interior do Estado em busca da confirmação de casos da amarílica e na identificação de espécies de mosquitos e acompanhariam atividades realizadas em laboratório e/ou em outros ambientes de saúde como o Hospital de Isolamento de Monte Serrat.

Eventualmente, outras personagens se relacionaram com a equipe da Fundação Rockefeller no laboratório criado em 1928. Ainda em fevereiro de 1927, Wilson G. Smillie, que atuou como diretor do Instituto de Higiene, em São Paulo, escreveu para Janney e informou que o representante do Presbiterian Board of Foreign Missions, Reginald Wheeler, visitou o escritório da International Health Board (IHB) e perguntou se algum dos seus representantes não poderia oferecer conselhos sobre um surto epidêmico de malária que ocorreu na missão presbiteriana de Ponte Nova, afiliada ao Colégio Mackenzie, em São Paulo, e localizada a 250 milhas da capital baiana (SMILLIE para Janney, 18 fev. 1927SMILLIE para Janney. 18 de fevereiro de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, Subseries 1_02, FA 115, Box 292, Folder 3704.). O Instituto Ponte Nova, estação missionária voltada para a educação e para a evangelização, foi inaugurado em 1906 e recebeu Walter Welcome Wood em 1916. O médico foi enviado ao país para cuidar da saúde de professores e estudantes, criou o Grace Memorial Hospital e se tornou responsável pelo atendimento dos moradores da região, que não tinham outras instituições de assistência nas proximidades (SILVA; BATISTA, 2019SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da; BATISTA, Ricardo dos Santos. O Grace Memorial Hospital e a Missão Presbiteriana norte-americana no Brasil: fontes para a história da assistência à saúde, 1955-1971. História, Ciências, Saúde - Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 26, sup. 1, p. 249-259, dez. 2019.).

Janney o conhecia pessoalmente e em 1926 já havia dado orientações sobre a utilização do verde-paris que, segundo Lopes (2019LOPES, Gabriel. Anopheles gambiae no Brasil: antecedentes para um “alastramento silencioso”, 1930-1932. História, Ciências, Saúde - Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 26, n. 3, p. 823-839, 2019., p. 837), era descrito em relatórios da Fundação Rockefeller como paris green (acetoarsenito de cobre), um composto usado no século XIX como pigmento, posteriormente banido da sua função original devido à toxicidade. Misturavam-no ao querosene e aplicavam nas áreas de reprodução dos mosquitos para matar as larvas. De acordo com o funcionário da agência internacional, eles sempre faziam tudo que estava ao seu alcance para “ajudar missionários médicos e outros que estão trabalhando no interior do Brasil” (JANNEY para Russel, 11 mar. 1927JANNEY para Russell. 11 de março de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, Subseries 1_02, FA 115, Box 292, Folder 3704.), em uma espécie de solidariedade compatriota entre norte-americanos que atuaram em projetos filantrópicos/assistenciais nos sertões brasileiros. Assim, o médico presbiteriano também fez algumas visitas ao laboratório da Rockefeller, em busca de um espaço para o diálogo diante do seu isolamento no interior.

A atividade laboratorial realizada no Estado baiano se ampliou desde fins do século XIX e acompanhou a construção de um aparato de assistência à saúde. A exemplo desse processo, é possível afirmar que o governador Joaquim Manoel Rodrigues Lima (1892-1896) promulgou a legislação sanitária de 1892, que criou a Inspetoria de Higiene, o Instituto Vacínico e transformou o Conselho de Salubridade em Conselho Geral de Saúde Pública. Nos anos seguintes, Luiz Vianna (1896-1900) reformou os serviços sanitários estaduais e, entre as modificações efetivadas, determinou a pesquisa bacteriológica, química e bromatológica. No governo de Severino Vieira (1901-1904), novas mudanças ocorreram com a Inspetoria Geral de Higiene, que possuía sob a sua gerência o Instituto Bacteriológico e o Laboratório de Análises Químicas e Bromatológicas, entre outros. Mas foi no governo de José Joaquim Seabra (1912-1916) que se inaugurou o Instituto Bacteriológico, Anti-rábico e Vacinogênico da Bahia (SOUZA, 2009SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A gripe espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de epidemia. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009., p. 58-69), que se tornou o Instituto Oswaldo Cruz da Bahia (IOC-Ba).

A reforma sanitária realizada por Antônio de Barros Barreto, a partir de 1924 (BATISTA; SILVA, 2020BATISTA, Ricardo dos Santos; SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. A atuação de Antônio Luis Cavalcanti de Albuquerque de Barros Barreto na Reforma Sanitária da Bahia (1924-1930). Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 40, n. 84, p. 313-337, 2020. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01882020000200313 . Acesso em: 15 out. 2020.
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), ampliou as atividades laboratoriais. Entre outras ações realizadas pelo médico, esteve a criação de novas seções no IOC-Ba: a de medicamentos, que teria contribuído para uma economia de mais de 30 contos de réis ao Estado; a de bioterapia, destinada ao preparo de soros, vacinas microbianas, entre outros; e a de química e bromatologia, pela incorporação do Laboratório Municipal de Análises à organização sanitária estadual (BARRETO, 1927BARRETO, Antônio Luis Cavalcanti Albuquerque de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1926. Bahia: Imprensa Oficial do Estado, 1927., p. 8).

O ano que antecedeu a instalação do Laboratório de Febre Amarela em Salvador foi marcado por discussões entre os membros do staff da Fundação Rockefeller sobre o papel do IOC-Ba e sobre a utilização de material para a realização de testes por profissionais não especializados na enfermidade (RUSSELL para Connor, 8 fev. 1927RUSSELL para Connor. 8 de fevereiro de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, FA 115, Box 293, Folder 3714.; CONNOR para Russell, 16 mar. 1927CONNOR para Russell. 16 de março de 1927. RF Records, IHB, RG 5, Series 1, FA 115, Box 293, Folder 3714.). Diante do programa apresentado por Barros Barreto, havia o interesse que as atividades na instituição de pesquisa não fossem paralisadas até a chegada de um especialista que, provavelmente, pudesse ser o responsável pelo laboratório do IOC-Ba, especialmente após a suposta transição do Serviço de Febre Amarela para a responsabilidade do Estado. Nesse sentido, o IOC-Ba contou com a direção do médico Eduardo de Araújo, que também foi bolsista da agência filantrópica nos Estados Unidos.

Em 4 de março de 1927, Barros Barreto se reuniu com Henry, Kerr e Connor e foi acordado que ele assumiria, a partir de 1 de janeiro de 1928, as medidas de controle dos mosquitos em Salvador, mas que também deveria levar os serviços da Fundação Rockefeller para as cidades do interior, especialmente para as estações em Cachoeira, Nazaré e Santo Amaro. Connor indicava que a agência internacional poderia continuar a realizar medidas intensivas contra o Aedes aegypti até julho de 1928 e atuar com um pessoal reduzido até o final de 1927, desde que essa situação não contribuísse para eventos desfavoráveis. Além disso, ofereceu cooperação para o serviço do interior com o treinamento de guardas sobre como supervisionar o trabalho no campo e outras recomendações (CONNOR para Sir, 25 mar. 1927CONNOR para Sir, 25 mar. 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, FA 115, Box 293, Folder 3714.). O acordo da Fundação Rockefeller com o governo brasileiro, revisto no início de 1929, atribuiu maiores poderes para a instituição internacional. As restrições impostas a Barros Barreto no controle da febre amarela contribuíram para conflitos explícitos com Clementino Fraga. Enquanto isso, os membros do staff da Fundação Rockefeller tentavam não se envolver e, ao mesmo tempo, garantir que as atividades continuassem a ser realizadas regularmente naquele Estado.

Um Laboratório da Febre Amarela na Bahia

O Laboratório da Febre Amarela foi inaugurado no mesmo ano em que a epidemia da doença assolou o Rio de Janeiro e demandou ações incisivas de Clementino Fraga, especialmente na retomada da fumigação de forma ampliada, método adotado por Oswaldo Cruz para combater a amarílica na primeira década do século XX. O questionamento sobre as hipóteses epidemiológicas defendidas pelo staff da Fundação Rockefeller (especialmente a teoria dos focos-chave) pode ter antecedido, por meio do laboratório criado em Salvador, a tendência adotada pela instituição no pós-1930 sobre a direção de Fred Soper, que priorizava a relação entre campo e laboratório com o intuito de compreender melhor a amarílica: “A cooperação entre o ‘laboratório’ e o ‘campo’ esteve no cerne de todas as atividades - científicas e administrativas - cujo objetivo era prevenir e dominar a febre amarela no Brasil, e foi a força motriz das inovações introduzidas no controle da febre amarela nos anos 1930” (LÖWY, 2006LÖWY, Ilana. Vírus, mosquitos e modernidade: a febre amarela no Brasil entre a ciência e a política. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2006., p. 168). Fred Soper substituiu Michael Connor em 1930 na liderança da Campanha da Febre Amarela e reorganizou o serviço com ênfase no processo de viscerotomia e teste de promoção em camundongos (BENCHIMOL, 2001BENCHIMOL, Jaime Larry. Febre amarela: a doença e a vacina, uma história inacabada. 20. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Bio-Manguinhos, 2001., p. 125).

Nelson Caryl Davis (1892-1933) foi o médico escolhido para dirigir o Laboratório da Febre Amarela. Desde cedo interessado em doenças tropicais, atuou nas Filipinas entre 1910 e 1912 e, depois de formado em medicina, integrou o staff da agência filantrópica (1922-1933), investigando ancilostomíase e malária na América do Sul. Entre julho de 1922 e dezembro de 1923, atuou como diretor estadual do IHB no Rio Grande do Sul (KORNDÖRFER, 2013KORNDÖRFER, Ana Paula. “An international problem of serious proportions”: a cooperação entre a fundação Rockefeller e o Governo do Estado do Rio Grande do Sul no Combate à ancilostomíase e seus desdobramentos (1919-1929). 2013. 301 f. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013., p. 187). Em 1924, trabalhou com o médico brasileiro Waldemar Rocha na Ilha dos Marinheiros, no mesmo Estado, em ações contra a ancilostomíase que resultaram em uma pesquisa crítica sobre o uso do óleo de quenopódio nas campanhas de controle da enfermidade dirigidas pela agência internacional (MAGALHÃES, 2016MAGALHÃES, Rodrigo Cesar da Silva. A Erradicação do Aedes aegypti: febre amarela, Fred Soper e saúde pública nas Américas (1918-1968). Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2016., p. 356).

No ano de 1927, Davis fez parte de uma missão financiada pela Rockefeller à Argentina com o objetivo de colaborar com o governo no saneamento, controle de mosquitos e tratamentos de enfermos. Nessa ocasião, trabalhou com o entomologista Raymond Corbett Shannon (CURTO et al., 2013CURTO, Susana; ANDRADE, Héctor; CHUIT, Roberto; BOFFI, Rolando. Historia del control del paludismo en Argentina. Boletín de la Academia. Nacional de Medicina de Buenos Aires, v. 1, n. 91, p. 77-93, jan./jun. 2013., p. 107-108), que mais tarde o acompanharia no laboratório da Bahia e, posteriormente, atuaria no controle da malária no Rio Grande do Norte (cf. LOPES, 2020LOPES, Gabriel. O feroz mosquito africano no Brasil: o Anopheles gambiae entre o silêncio e a sua erradicação (1930-1940). Rio de Janeiro: Fiocruz, 2020.). A partir da experiência argentina, escreveram o artigo intitulado Breeding conditions of anopheles pseudopunctipennis in province of tucuman during dry season, que foi enviado ao Instituto Bacteriológico de Buenos Aires para tradução e publicação (JANNEY para Russel, 16 fev. 1927JANNEY para Russell. 16 de fevereiro de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, Subseries 1_02, FA 115, Box 292, Folder 3704.; WESEP para Janney, 4 abr. 1927WESEP para Janney. 4 de abril de 1927. RAC, RF Records, IHB, RG 5, Series 1, Subseries 1_02, FA 115, Box 292, Folder 3704.).

Em 7 de julho de 1928, Davis e Johannes Bauer chegaram ao porto de Salvador, vindos do Rio de Janeiro, no navio Itaquera. Eles foram recebidos pelos médicos Eduardo Araújo, Michael Edward Connor e A. W. Burke. No mesmo dia, visitaram as instalações do edifício que lhes foi oferecido em Monte Serrat, o qual foi aceito “com grande prazer” (DAVIS, 1928-1931, 7 jul. 1928DAVIS, Nelson Caryl. Bahia Laboratory Diary, vol 1, 1928-1931. RAC, RF records, projects, RG 1.1, Series 300 Latin America - Series 833 Lebanon, (FA 386b). 1928., p. 1). A presença de Bauer na Bahia demonstra a importância da instituição que seria inaugurada. Em 1927, ele trabalhou no Laboratório de Acra, na Costa do Ouro, e, junto com Adrian Stokes e Paul N. Hudson, realizou pesquisas na tentativa de domesticar o agente etiológico da febre amarela. Os animais de laboratório usuais (ratos, cães, gatos, camundongos) se mostraram refratários à febre amarela africana, mas os cientistas conseguiram inocular experimentalmente o macaco rhesus com o sangue de um africano chamado Asibi, que sobreviveu ao ataque da doença. Em poucos meses eles confirmaram que a enfermidade era causada por um vírus ultramicroscópico e filtrável, capaz de ser transmitido entre macacos e que poderia ser transportado pelo mosquito Aedes aegypti (BENCHIMOL, 2001BENCHIMOL, Jaime Larry. Febre amarela: a doença e a vacina, uma história inacabada. 20. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Bio-Manguinhos, 2001., p. 215; MAGALHÃES, 2016MAGALHÃES, Rodrigo Cesar da Silva. A Erradicação do Aedes aegypti: febre amarela, Fred Soper e saúde pública nas Américas (1918-1968). Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2016., p. 78).

O periódico soteropolitano A Tarde noticiou a chegada dos pesquisadores em uma matéria intitulada “Acompanhando a peste nos macacos”. Davis informou a pequena pausa realizada no Rio de Janeiro, vindos de Nova Iorque. Disse que Henrique Aragão trabalhava no Instituto Oswaldo Cruz daquela cidade e que, possivelmente, ainda em 1928, apresentaria estudos novos sobre a amarílica. Além disso:

O objectivo da nossa vinda ao seu paiz é da fundação de um laboratorio serumtherapeutico, onde continuarei com a inoculação do virus da febre amarela, os meus estudos em torno desta moléstia.

Depois da fundação deste laboratorio, que se dará, dentro de algumas semanas, em um pavilhão de Monte Serrat, que nos foi, gentilmente offerecido, pelo Dr. Barros Barreto, o Dr. Bauer regressará á New York (...).

Com a inoculação do vírus nos macacos, onde, aliás, o quadro clinico não se assemelha muito, ao do homem, embora o seja idêntico no anatomo-pathologico, mantemos aquele mesmo objectivo de pé [encontrar um soro imunizador para a febre amarela]. (ACOMPANHANDO..., 1927ACOMPANHANDO a peste nos macacos. A Tarde, Salvador, 12. jul. 1928., destaque do original).

Eles trouxeram consigo 10 macacos rhesus, importantes para as experiências que seriam realizadas devido às recentes descobertas na África. Além disso, levavam consigo vários porquinhos da guiné, coelhos e ratos. Esses animais foram deixados no armazém do cais enquanto os médicos se dirigiram ao IOC-Ba para colocar o material biológico que continha o vírus em um refrigerador (BURKE, 7 jul. 1928BURKE, A. W. Brazil - Yellow fever, Bahia, Monthly Reports, 1928. RAC, RF Records, IHB, Division Records, RG 5, FA 115, Series 3, Subseries 3_305 O. Box 128. 1928.). As imagens que seguem contribuem para a compreensão sobre como funcionaria o laboratório nos meses e anos seguintes (Figuras 1, 2, 3 e 4).

Figura 1 -
Macaco utilizado no laboratório da Fundação Rockefeller.

Figura 2 -
Interior do laboratório da Fundação Rockefeller.

Figura 3 -
Caixas utilizadas no laboratório da Fundação Rockefeller.

Figura 4
Auxiliares do laboratório da Fundação Rockefeller.

Na primeira semana, os médicos se dedicaram à montagem da estrutura necessária para as investigações laboratoriais com o auxílio de marceneiros, que produziram as divisórias do ambiente para três finalidades: a inoculação de macacos, o trabalho entomológico e o escritório e laboratório geral de trabalho (DAVIS, 1928-1931DAVIS, Nelson Caryl. Bahia Laboratory Diary, vol 1, 1928-1931. RAC, RF records, projects, RG 1.1, Series 300 Latin America - Series 833 Lebanon, (FA 386b). 1928., 7 jul. 1928, p. 1).

A presença do laboratório da febre amarela em Salvador era motivo de prestígio para Antônio de Barros Barreto, que almejava apresentar aos baianos o trabalho desenvolvido pela Fundação Rockefeller, com a qual mantinha relações estreitas. Embora o médico não tenha conseguido recepcionar os pesquisadores no porto, tentava demonstrar apoio àquele projeto. Mesmo assim, os agentes norte-americanos e o brasileiro alimentavam desconfianças mútuas.

Davis e Bauer não confiavam na atuação do Secretário de Saúde e Assistência Pública. Após a instalação completa do laboratório, eles receberam a visita do Governador, em 18 de setembro de 1928. Mas, dias depois, Davis se queixava da falta de empenho de Barros Barreto para viabilizar a realização das atividades básicas que permitiriam o funcionamento do laboratório, como, por exemplo, a aquisição de novos animais para inoculação. Em seu diário, afirmou que teriam problemas na saída dos macacos que chegariam no “Antônio Delfino” no dia seguinte: “Duvido que D. Barros Barreto esteja cooperando como deveria, porque quando o governador visitou o laboratório ele disse ao Dr. Barros Barreto, em minha presença, para dar os passos necessários para fazer nossos animais passarem” (DAVIS, 1928-1931, 23 out. DAVIS, Nelson Caryl. Bahia Laboratory Diary, vol 1, 1928-1931. RAC, RF records, projects, RG 1.1, Series 300 Latin America - Series 833 Lebanon, (FA 386b). 1928.1928, p. 7).

Por outro lado, após a reconfiguração do acordo da União com a Fundação Rockefeller, em 25 de janeiro de 1929, Barros Barreto, que esperava assumir o controle do combate à febre amarela na Bahia, ameaçou retirar o seu apoio à agência internacional. Naquele momento, havia o desejo de que o Estado baiano fosse utilizado como uma escola de treinamento para médicos brasileiros nomeados pelo serviço de saúde pública como futuros diretores de estações da amarílica (CONNOR, 1929CONNOR, Michael Edward. Diary of the Yellow Fever Commission of Brazil. 1929-1930. RF records, projects, SG 1.1, Series 300, Latin America - Series 833 Lebanon (FA386b). Box 40, Folder 233, 1929.). Clementino Fraga, no entanto, explicitou a Michael Connor que a Fundação Rockefeller deveria assumir todo o Serviço de Febre Amarela e que Barros Barreto cuidaria exclusivamente do trabalho de isolamento e tratamento dos casos. Esse posicionamento se deu, possivelmente, devido a uma hostilização de Barros Barreto para com Fraga e pela “ameaça” de tentar a separação da Fundação Rockefeller do controle da febre amarela na Bahia (CONNOR, 1929CONNOR, Michael Edward. Diary of the Yellow Fever Commission of Brazil. 1929-1930. RF records, projects, SG 1.1, Series 300, Latin America - Series 833 Lebanon (FA386b). Box 40, Folder 233, 1929.).

A expectativa de Barros Barreto foi prejudicada, de certa forma, também pelos arranjos realizados a nível nacional. O novo acordo encarregou a agência filantrópica das ações contra a amarílica no Norte do país, da Bahia ao Amazonas, e o DNSP ficou com o chamado Setor Sul, que abrangia o Distrito Federal, São Paulo e o Espírito Santo (BENCHIMOL, 2001BENCHIMOL, Jaime Larry. Febre amarela: a doença e a vacina, uma história inacabada. 20. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Bio-Manguinhos, 2001., p. 125). Em dezembro do mesmo ano, a Fundação Rockefeller obteve o controle das ações em quase todo o território brasileiro, com exceção do estado do Rio de Janeiro, a partir da “revolução” de 1930, que tornou Getúlio Vargas um aliado fiel dos seus esforços no Brasil (LÖWY, 2006LÖWY, Ilana. Vírus, mosquitos e modernidade: a febre amarela no Brasil entre a ciência e a política. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2006., p. 166-167). Nesse contexto, não parecia ser viável abrir uma exceção para o sanitarista que atuava na Bahia enquanto um movimento nacional seguia em direção oposta de manter o controle da amarílica nas mãos da Rockefeller. Segundo Connor:

Pelo presente acordo ele perde o prestígio na Bahia, por não ter sido nomeado chefe do serviço local de febre amarela. Ele está ansioso que tentemos remediar isso. Estou igualmente ansioso para que o assunto seja resolvido de maneira satisfatória. Ele também deseja ter um orçamento para fumigação etc, se essas medidas forem por eles praticadas. Ele não tem fé nelas, mas a faculdade de medicina sim e, portanto, devem fazer parte da campanha profilática da febre amarela. (CONNOR, 1929CONNOR, Michael Edward. Diary of the Yellow Fever Commission of Brazil. 1929-1930. RF records, projects, SG 1.1, Series 300, Latin America - Series 833 Lebanon (FA386b). Box 40, Folder 233, 1929., p. 10).

Esses conflitos ocorridos na Bahia mostram que, embora houvesse um interesse na realização das atividades da Fundação Rockefeller no controle da febre amarela no Estado, o que incluía as ações do laboratório, o processo foi marcado por conflitos que envolveram interesses das diferentes nacionalidades. Inclusive o aceite, por parte da Rockefeller, de que a fumigação fosse realizada é indício de uma negociação, já que a teoria dos focos-chave caía por terra e a fumigação, que ainda era considerada uma medida eficaz entre outros médicos baianos e repudiada pela agência filantrópica, foi autorizada.

Em meio a esses conflitos, temidos como prejudiciais à atuação da agência filantrópica, o laboratório mantinha uma rotina constante de inoculação de animais, especialmente os macacos, e, cada vez mais, assumia o papel de buscar novas respostas ao problema complexo da febre amarela. Trocas de conhecimento aconteciam pela interação de diferentes profissionais, entre eles Davis, Bauer e Eduardo Araújo. O diário de Michael Connor informa sobre diferentes momentos em que os médicos brasileiros, especialmente Barros Barreto e Araújo, estavam interessados em ouvir sobre o trabalho desenvolvido por Bauer na África (CONNOR, 1928, p. 126), o que também indica que a circulação de informações científicas não ocorria apenas nos ambientes institucionais, mas em momentos não-institucionais, a exemplo dos almoços do grupo.

Havia um trânsito constante de visitação entre os profissionais do IOC-Ba e os do laboratório da Rockefeller, seja para a esterilização de instrumentos (DAVIS, 21 jul. 1928), seja em episódios como o da noite em que Araújo e Barros Barreto recorreram a Davis para verificar um caso suspeito de febre amarela no Hospital de Isolamento. Era um homem espanhol que estava na Bahia havia seis meses (DAVIS, 1928-1931DAVIS, Nelson Caryl. Bahia Laboratory Diary, vol 1, 1928-1931. RAC, RF records, projects, RG 1.1, Series 300 Latin America - Series 833 Lebanon, (FA 386b). 1928., 15 ago. 1928). Dias depois, o diretor do laboratório afirmava:

Bauer e eu visitamos o Instituto Oswaldo Cruz para ver Dr. Araújo, eu obtive material fixado em formalina no caso fatal da semana passada. Vimos seções de um caso fatal de febre amarela duvidosa em São Felipe em junho. O fígado foi considerado positivo, mas não é típico; parece haver degeneração gordurosa extrema, mas muito pouca necrose. (DAVIS, 1928-1931DAVIS, Nelson Caryl. Bahia Laboratory Diary, vol 1, 1928-1931. RAC, RF records, projects, RG 1.1, Series 300 Latin America - Series 833 Lebanon, (FA 386b). 1928., 21 ago. 1928, p. 5).

O laboratório da Fundação Rockefeller tinha uma rotina que também incluía viagens e trocas constantes de material biológico com o IOC do Rio de Janeiro. O programa de pesquisa sugerido por Fred Soper a Nelson C. Davis incluía as seguintes atividades, entre outras: a) inoculação de sangue recebido do Rio de Janeiro para determinar a suscetibilidade de macacos a vários vírus, confirmando os resultados de Henrique Aragão com determinados sangues, e obter cepas de laboratório para posterior experimentação; b) caso o macaco rhesus se mostrasse uniformemente suscetível, dever-se-ia inocular esses animais com todos os sangues suspeitos como procedimento imunológico; c) tentar detectar o leptospira em diferentes culturas e inoculações de porquinhos da índia; d) testar a suscetibilidade de espécies de mosquitos diferentes do Aedes aegipti ao vírus da febre amarela; e) testar macacos brasileiros e outros animais nativos para o vírus da febre amarela; f) testar a sobrevivência do vírus in vitro sob condições diversificadas de temperatura e a hereditariedade e localização do vírus no mosquito hospedeiro (CONNOR, 1928, p. 125). Embora Ilana Löwy (2006LÖWY, Ilana. Vírus, mosquitos e modernidade: a febre amarela no Brasil entre a ciência e a política. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2006., p. 166) informe que a instituição criada na Bahia tinha originalmente o objetivo de estudar o Leptospira de icteroides, de Noguchi, o programa de pesquisas apresentado pelos pesquisadores responsáveis pelo laboratório extrapolava essa finalidade.

Ainda em 1928 surgiram especulações sobre quem poderia trabalhar como auxiliar de Nelson Davis quando Bauer partisse. O diretor do laboratório fez uma solicitação de dois homens com o intuito de contribuir no trabalho de campo: a coleta de mosquitos nativos para a experimentação e de sangue, sendo que pelo menos um deles precisaria ficar no laboratório todo o tempo. Ele sugeria que um desses homens poderia ser um médico. Indicou o nome de três pessoas consideradas confiáveis, embora poderiam não estar disponíveis naquele momento: Dr. Van Volkenburgh, médico com alguma experiência em trabalho de laboratório e em epidemiologia, e que estava na Johns Hopkins University; Dr. Rutcliffe, doutor em ciências, treinado em protozoologia e bacteriologia e que trabalhava na mesma instituição; e Raymond C. Shannon, entomologista que atuava no Museu Nacional de Washington (CONNOR, 1928, p. 126-127). Em setembro, Davis informou a Connor que Shannon vinha para o Brasil como entomologista. O diretor do laboratório desejava ter um médico treinado em laboratório para poder trabalhar com alívio enquanto estivesse em campo retirando sangue. Acreditava que poderia haver objeções à realização desse trabalho por parte de Shannon, ideia com a qual Connor concordava (CONNOR, 1928, p. 158).

Ao longo de 1929, o laboratório funcionou como um direcionador das ações de controle da febre amarela. Por meio da investigação experimental, orientava sobre quais caminhos deveriam ser seguidos e em quais frentes deveria ser reforçada ou reduzida a atuação do staff da Fundação Rockefeller:

O laboratório diagnóstico foi de inestimável ajuda para o serviço de controle. Além dos estudos originais do vírus e dos experimentos de transmissão, o laboratório prestou um serviço rápido em relatórios sobre o material enviado do campo. Este serviço particular nos permitiu antecipar os possíveis eventos e com este conhecimento sinto que, portanto, evitamos eventos epidêmicos em várias seções, bem como despesas desnecessárias. (CONNOR, 26 fev. 1930CONNOR, Michael Edward. Report Yellow Fever Service, Northern Brazil, 1929. RF records, Photographs, Series 100-100 (FA003) 305, Brazil, FA 003, Box 69, Folder 1453. 26 fev. 1930., p. 6).

Uma das descobertas significativas foi a identificação de que a espécie Aedes scapullaris poderia ser um vetor eficiente do vírus da febre amarela. A seção entomológica fez pesquisas de mosquitos com agilidade e desenvolveu um programa para realizar estudos semelhantes em outras áreas. Foram realizadas pesquisas preliminares e breves, mas que foram continuadas e eram suficientes para orientar as investigações. Entre as primeiras percepções, Davis compreendeu se havia, sob certas condições intensivas, a criação de stegomya em recipientes na superfície do solo a uma distância média de 150 pés das habitações humanas; e, de forma relativa, pouco stegomya presente nas plantas, enquanto os bamboos poderiam se tornar locais preferenciais para os insetos, mais especialmente perto das habitações. Além disso, o serviço mais imediato e com maior êxito da entomologia foi a confirmação da necessidade de estender as medidas para o controle de stegomya “extra-mural” (fora dos muros das residências), e, ao mesmo tempo, enfrentar o problema do scapullaris.

Os esforços de controle da febre amarela, até aquele momento, estavam concentrados na redução da reprodução dentro de casa, mas constatou-se que durante os meses da chuva a criação extramuros era mais importante. Começava com a primeira chuva torrencial e continuava por meses até algumas semanas após o encerramento da estação chuvosa, sendo que durante esse período as calhas dos telhados das casas ficavam infestadas (CONNOR, 1930CONNOR, Michael Edward. Report Yellow Fever Service, Northern Brazil, 1929. RF records, Photographs, Series 100-100 (FA003) 305, Brazil, FA 003, Box 69, Folder 1453. 26 fev. 1930., p. 7).

Outras atividades de laboratório consistiram em coletar soros para o uso em conexão com o teste de fixação de complemento do Dr. Frobisher, que ingressou na equipe brasileira em 10 de outubro de 1929 e que, desde a sua chegada, estava empenhado no estudo do teste de fixação do complemento como diagnóstico da febre amarela e em seu possível uso para determinar a porcentagem de pessoas suscetíveis à enfermidade em uma área determinada.

Segundo Nelson Davis, no primeiro semestre foi realizado um trabalho intenso de exame de preparações histológicas de casos fatais da amarílica e injeção de sangue nos macacos oriundos de pacientes que estavam no primeiro dia de febre. Além disso, foi feito o uso de soros convalescentes em testes de proteção. Grande parte do material que chegou ao laboratório veio do Estado de Pernambuco, onde ocorreu uma série de pequenas epidemias a esse respeito. Segundo Porto (2020PORTO, Paloma. Regimes de prova: a presença do laboratório no combate à febre amarela no Nordeste brasileiro (1916-1930). In: BATISTA, Ricardo dos Santos; SOUZA, Christiane Maria Cruz de; SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. Quando a História encontra a Saúde. São Paulo: Hucitec, 2020. p. 345-367., p. 356-257), na década de 1920 o laboratório do Recife estava localizado no tradicional bairro do São José, no primeiro andar de um prédio da Rua Floriano Peixoto. Ficava estrategicamente perto do porto e da estação central do trem, portas de entradas e de saída de pessoas não-imunes na região e que, também, facilitava o deslocamento dos médicos pela Região Nordeste. O laboratório atendia à intensa demanda das análises de casos suspeitos da cidade de Recife e do interior de Pernambuco e estados vizinhos, especialmente nos casos duvidosos que os laboratórios da Paraíba do Norte, hoje Paraíba, Natal e Maceió, não conseguiam responder satisfatoriamente, antes de ser inaugurado o laboratório de Salvador. É muito provável que, a partir de 1928, essas instituições tenham estreitado relações, inclusive para agilizar a confirmação de diferentes diagnósticos de febre amarela.

A inoculação de macacos brasileiros foi realizada de forma relativamente constante e a passagem do vírus por determinadas espécies foi garantida pela inoculação de sangue ou tecidos de macacos e picadas de mosquitos infectados, tais como:

uma espécie de Cebus comumente chamada de “prego”; o macaco “esquilo” ou “cheiro” (Saimiri sciureus); o macaco “spider” ou aranha (Ateleus ater); o macaco “howler”, barbado ou “guabira” (Alouatta sp.); o “macaco negro do Pará” (embora seja Crocopithecus ursulus); e o marmoset ou “saguim” (Callithrix albicollis). Por injeção, apenas o vírus foi transmitido através do macaco “peludo” ou “barrigudo” (Lagotrix lagotricha). Algumas tentativas de transmissão através do “macaco de noite” (Aotes sp.) e do macaco “red-face” ou “cara vermelha” (Cacajao rubicundus) não tiveram sucesso. É evidente que alguns dos primeiros grupos mencionados acima realmente foram infectados; reações febris não são incomuns e alguns animais morrem com lesões que lembram as encontras em humanos e macacos rhesus. (DAVIS, 1929DAVIS, Nelson Caryl. Narrative report for the year 1929 - Yellow fever laboratory, Bahia, Brazil. RAC, RF Records, IHB, Division Records, RG 5, Series 3, FA 115, Box 128, Folder 1525. 1929., p. 1, grifo do original).

Em janeiro daquele ano, o médico Paul Lewis chegou dos Estados Unidos a Salvador, passou a integrar a equipe do laboratório, mas, no final de junho, morreu por febre amarela contraída no trabalho com os macacos (DAVIS, 1929DAVIS, Nelson Caryl. Narrative report for the year 1929 - Yellow fever laboratory, Bahia, Brazil. RAC, RF Records, IHB, Division Records, RG 5, Series 3, FA 115, Box 128, Folder 1525. 1929.). Esse não foi um caso excepcional na rotina de pesquisas sobre a amarílica, visto que o próprio Hideyo Noguchi morreu de febre amarela em Acra.

Além de todas as atividades descritas, foram realizadas pesquisas intensivas em certas localidades. Embora se considerasse que o controle das larvas em Salvador era excelente, eventualmente em bairros como os Aflitos, no centro da cidade, foram realizadas buscas de focos perdidos. Em novembro, Burke e Davis fizeram uma viagem apressada à cidade de Areia, no mesmo estado, para investigar uma epidemia em andamento. Não encontraram nada clinicamente suspeito de febre amarela (DAVIS, 1929DAVIS, Nelson Caryl. Narrative report for the year 1929 - Yellow fever laboratory, Bahia, Brazil. RAC, RF Records, IHB, Division Records, RG 5, Series 3, FA 115, Box 128, Folder 1525. 1929.).

O laboratório da Fundação Rockefeller se ampliava e, ao fim de 1929, possuía uma secretária, um técnico microscopista, um motorista para o caminhão, um assistente chefe do laboratório entomológico, um ajudante em entomologia (encarregado de tabular as pupas e separar os mosquitos fêmeas emergentes), cinco ajudantes em entomologia (que traziam as coleções de fora, bambus, bromélias, outros focos designados e atuavam como ajudantes de Shannon nas viagens), um atendente especialmente encarregado de supervisionar a alimentação e medir a temperatura dos animais, um ajudante que limpava a vidraria, lavava o laboratório e esterilizava o material, cinco ajudantes que limpavam as gaiolas, operavam o incinerador, além de um carpinteiro, um jardineiro e seus ajudantes (DAVIS, 1929DAVIS, Nelson Caryl. Narrative report for the year 1929 - Yellow fever laboratory, Bahia, Brazil. RAC, RF Records, IHB, Division Records, RG 5, Series 3, FA 115, Box 128, Folder 1525. 1929., p. 5).

As atividades oriundas do trabalho dessa equipe produziram conhecimento científico que era enviado à Fundação Rockefeller e publicado. Eventualmente, podiam ser apresentados em eventos importantes, como o V Congresso Brasileiro de Higiene, ocorrido em Recife, e demonstravam a atuação conjunta de médicos brasileiros e norte-americanos.

Resultado de pesquisa realizada pelo laboratório da febre amarela no V Congresso Brasileiro de Higiene

Segundo Madel Luz (1982LUZ, Madel. Medicina e ordem política brasileira. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1982., p. 173), desde fins de 1922, profissionais ligados à higiene e à saúde pública pretendiam fundar uma instituição voltada para seus interesses. A Sociedade Brasileira de Higiene funcionou de 11 de janeiro de 1923 até 1930, quando finalizou suas atividades sem maiores explicações. Ela reunia os principais expoentes da higiene e saúde pública no Brasil e quase todos os que compunham seus quadros eram funcionários do DNSP ou exerciam funções de comando em órgãos e instituições públicas em vários Estados da Federação. Cabe destacar que muitas dessas personagens também estavam ligadas ao projeto da Fundação Rockefeller nos Estados em que atuavam, como é o caso de Geraldo Horácio de Paula Souza e Antônio Luis Cavalcanti de Albuquerque de Barros Barreto. Ao analisar os anais do II Congresso de Higiene, Luz ainda afirma que a Fundação Rockefeller estava presente sempre nas questões levantadas sobre as transformações recentes nos serviços de saúde pública. Também ocupava lugares no plenário, por meio dos seus representantes.

O IV Congresso de Higiene estava previsto para ocorrer em Recife inicialmente, mas foi transferido em caráter de urgência para a Bahia meses antes do seu acontecimento, em 1927 (BATISTA, 2017BATISTA, Ricardo dos Santos. Sífilis e reforma da saúde na Bahia. Salvador: Eduneb, 2017., p. 159). O evento seguinte, realizado de 17 a 22 de outubro de 1929, foi direcionado para a sede na qual não ocorreu em 1927 e os médicos da Bahia seguiram em uma comissão chefiada por Barros Barreto, mas também composta por Eduardo Araújo e Octavio Torres (ambos ex-bolsistas da Fundação Rockefeller, com formação nos Estados Unidos), Alfredo Brito, Magalhães Netto, Serafim Júnior (que trabalhava no interior da Bahia e foi um grande aliado da agência filantrópica internacional), Dyonisio Pereira (que esteve em São Paulo para observar o funcionamento dos centros de saúde instalados pelo ex-bolsista da Fundação Rockefeller, Paula Souza, e implantá-los na Bahia), França Rocha e Waldemar Chaves (Figura 5).

Figura 5
Quinto Congresso de Hygiene: chegada da delegação baiana a Recife.

Entre os seis temas que compuseram as memórias escritas pelos médicos que atuavam na Bahia, o tema cinco dizia respeito aos mosquitos e às doenças que transmitiam. Antônio de Barros Barreto apresentou Campanha antimalárica na Bahia, Serafim Júnior escreveu Malária congênita, inquérito preliminar para a profilaxia da malária em Tremembé e, em parceria com o entomologista R. C. Shannon, do laboratório da Rockefeller na Bahia, Anofelinos da capital da Bahia e seus arredores (BARRETO, 1930BARRETO, Antônio Luis Cavalcanti Albuquerque de Barros. Relatório da Secretaria de Saúde e Assistência Pública: anno de 1929. Bahia: Imprensa , p. 23-24). A malária, também chamada de paludismo/impaludismo naquele período, era uma doença presente em diferentes regiões do Estado da Bahia. Segundo Christiane Souza (2009SOUZA, Christiane Maria Cruz de. A gripe espanhola na Bahia: saúde, política e medicina em tempos de epidemia. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009., p. 163-164), ao longo da epidemia de gripe espanhola, doenças como o impaludismo se mantiveram mais altas não só em relação à influenza, mas também à peste, varíola e febre amarela nos registros oficiais. Ao longo da década de 1920 e 1930, a doença continuou a se manifestar, sendo considerada como exemplo dos males que atingiam moradores do interior do Estado (BATISTA, 2013BATISTA, Ricardo dos Santos. Lues venerea entre práticas e representações: saúde pública, doença e comportamento social nas serras jacobinenses. In: CHAVES, Cleide de Lima (org.). História da saúde e das doenças no interior da Bahia: séculos XIX e XX. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2013. p. 115-145.; BATISTA, 2014BATISTA, Ricardo dos Santos. Mulheres livres: uma história sobre prostituição, sífilis, convenções de gênero e sexualidade. Salvador: Edufba, 2014.). Embora seja necessária uma investigação mais aprofundada, que não poderia ser realizada aqui devido ao espaço restrito e aos objetivos propostos para esse texto, é possível sugerir que o campo investigado pelos pesquisadores que trabalhavam no laboratório de Salvador (especialmente as cidades do interior da Bahia) pode ter lhes apresentado outra demanda tão ou mais importante que o problema da febre amarela, visto que os estudos sobre a malária continuaram a ser realizados e publicados após 1930.

Entre as muitas possibilidades de análise dos impactos da produção realizada no laboratório da Fundação Rockefeller, destaca-se o trabalho realizado entre um médico do Estado e um pesquisador norte-americano no V Congresso Brasileiro de Higiene. Acredita-se que o título utilizado por Shannon e Serafim Júnior para a memória apresentada no evento seja um recorte do trabalho escrito naquele mesmo ano e assinado pelos dois profissionais, com base em atividades desenvolvidas na instituição de pesquisa em Salvador. Uma questão que chama a atenção é que, mesmo que o foco do laboratório fosse a amarílica, as investigações extrapolavam essa enfermidade e, nesse caso, se voltaram especificamente para a malária, um outro grave problema que assolava a população do Nordeste brasileiro.

Intitulado A brief review of the Anopheles of Brazil with notes on the species of Nyssorhynchus ocurring in Bahia, a pesquisa afirmava que, até aquele momento, não haviam sido feitas dissecações da fauna de anofelinos na Bahia e, portanto, consideravam a espécie Nyssorhynchus importante para refletir sobre a suas fontes de reprodução e hábitos. Eles fizeram um levantamento de anofelinos brasileiros, identificaram 29 tipos diferentes e consideraram a espécie analisada perigosa para a disseminação da malária (SHANNON; SERAFIM, 1929SHANNON, Raymond C.; SERAFIM, José. A brief revew of the anopheles of Brazil with notes on the species of Nyssorhynchus ocurring in Bahia. RAC, RF Records, General Correspondence 1924-1939. RG 2, Series 1929/305: Brazil, Subseries 1929/305.O, Box 553, Folder 3718. 1929.).

A bibliografia citada pelos autores é composta por trabalhos internacionais atuais para aquele momento e, inclusive, incluíam pesquisas sobre dissecações realizadas por Nelson Davis em anos anteriores. Chegaram à conclusão de que o Anopheles Nyssorhynchus argyritasis, recorrentemente encontrado do México ao sul da Argentina e em cidades dos sertões do Rio de Janeiro e Minas Gerais, foi encontrado em córregos, bacias, cacos de vidro, pegadas de cascos de gado na beira de lagos e em buracos de caranguejos, em quatro vales que cruzavam a cidade e em localidades como Garganta da Morte (próximo ao Largo de Roma, na Cidade Baixa), Nazareth, Graça, Federação, Cabrito, Pirajá, Peru, Paripe e Muriqueira (possivelmente em referência ao rio com mesmo nome) (SHANNON; SERAFIM, 1929SHANNON, Raymond C.; SERAFIM, José. A brief revew of the anopheles of Brazil with notes on the species of Nyssorhynchus ocurring in Bahia. RAC, RF Records, General Correspondence 1924-1939. RG 2, Series 1929/305: Brazil, Subseries 1929/305.O, Box 553, Folder 3718. 1929.).

Ocasionalmente, ao fazer capturas de “stegomyia aegypti” (Aedes aegypti), espécies de argyritasis foram encontradas. Esses animais eram recolhidos, dissecados e analisados no laboratório de Mont Serrat. O mapeamento dos mosquitos e o controle das enfermidades que podiam causar se tornou uma tônica importante no controle da febre amarela e, por que não, da malária na cidade de Salvador, nesses dois primeiros anos de funcionamento da instituição financiada pela agência filantrópica internacional.

Parcerias como a realizada para a escrita desse trabalho, apresentado no V Congresso Brasileiro de Higiene, se repetiram em anos posteriores, inclusive em pesquisas sobre mosquitos no interior da Bahia, em um momento de reorganização da Fundação Rockefeller, a partir de 1930, e das novas dinâmicas adotadas pelos membros do seu staff, com ênfase na pesquisa em laboratórios.

Considerações finais

A análise sobre a implantação de um laboratório da Fundação Rockefeller para a pesquisa sobre a febre amarela revela os desafios empreendidos para a construção do conhecimento científico na primeira metade do século XX, num contexto que envolvia agentes de diferentes nacionalidades e que foi pautado, em grande medida, na circulação de saberes produzidos em diferentes partes do mundo.

Em muitos casos, as interações não ocorreram de forma pacífica e foram atravessadas por tensões que evidenciavam os interesses nacionais, regionais, locais e individuais, em uma complexa rede de conexões. Questões como essas também podem ser observadas, por exemplo, na formação de médicos brasileiros nos Estados Unidos, financiados pela Fundação Rockefeller, e que, embora partisse dos critérios definidos pela política da agência filantrópica, precisou se adequar a contextos, à disponibilidade de profissionais e a questões de fórum particular dos indivíduos (BATISTA, 2020bBATISTA, Ricardo dos Santos Batista. Bolsistas da Fundação Rockefeller e a internacionalização da saúde brasileira: viagens dos médicos da Faculdade de Medicina da Bahia aos Estados Unidos (1920-1945). In: BATISTA, Ricardo dos Santos; SOUZA, Christiane Maria Cruz de; SILVA, Maria Elisa Lemos Nunes da. Quando a História encontra a Saúde. São Paulo: Hucitec, 2020b. p. 320-344.; BATISTA, FERREIRA, 2021BATISTA, Ricardo dos Santos; FERREIRA, Luiz Otávio. Como se tornar um bolsista da Fundação Rockefeller: trajetórias de médicos do Instituto Oswaldo Cruz em formação na Universidade Johns Hopkins (1919-1924). Topoi, Rio de Janeiro, v. 22, n. 47, p. 450-473, mai./ago., 2021. ). Da mesma forma, é possível afirmar que, em alguns casos, os brasileiros traçaram estratégias específicas para contornar as normas institucionais dos norte-americanos e proporcionaram a médicos, como Heraclídes de Souza-Araújo, um programa de estudos de seu interesse durante a estadia no exterior e não aquele defendido pela agência filantrópica (BATISTA, 2020aBATISTA, Ricardo dos Santos. Bolsas da Fundação Rockefeller para estudo na Johns Hopkins University: o caso do sanitarista Heraclídes Cesar de Souza Araújo. História Revista, Goiânia, v. 25, n. 2, maio/ago., 2020a. Disponível em: https://www.revistas.ufg.br/historia/article/view/63402 . Acesso em: 16 out. 2020.
https://www.revistas.ufg.br/historia/art...
).

A criação de um laboratório em Salvador, local recorrentemente apresentado pela Fundação Rockefeller como endêmico em febre amarela, ampliou os instrumentos diagnósticos, mapeou locais de infecção de mosquitos na cidade de Salvador e no interior, permitiu o conhecimento de diferentes espécies e os diálogos internacionais entre 1928 e 1930. A presença de brasileiros nesse circuito demonstra como a medicina praticada no sul global tinha bases sólidas e ofereceu contribuições para a construção do conhecimento científico que lhe era contemporâneo.

A partir desse primeiro mapeamento das ações específicas desenvolvidas pelo laboratório, será possível reunir novos elementos que compuseram as tramas das dinâmicas laboratoriais e o trabalho colaborativo, mas nem sempre harmônico, de diferentes indivíduos que atuaram no desenvolvimento da saúde internacional.

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NOTAS

  • 1
    Ao longo de toda a década de 1920, a região Nordeste ainda era conhecida como Região Norte do Brasil.
  • 2
    Todos os documentos em inglês foram traduzidos pelo autor desse texto.
  • 3
    A atuação da Fundação Rockefeller no campo da saúde se deu em 1909 pela criação da Rockefeller Sanitary Comission for Erradication of Hookwoorm Disease, que, em 1913, se transformou em International Health Comission (IHC) e em 1916 foi renomeada de International Health Board (IHB). De 1927 até seu fechamento, em 1951, se intitulou International Health Division (IHD).
  • 4
    Para mais informações sobre a atuação da Fundação Rockefeller na saúde internacional/global, conferir Batista e Porto (2021BATISTA, Ricardo dos Santos; PORTO, Paloma. Fundação Rockefeller e o desenvolvimento da Saúde Global: contornos locais e circulações internacionais. História: debates e tendências, Passo Fundo, v. 21, n. 3, p. 5-15, set./dez. 2021. Disponível em: http://seer.upf.br/index.php/rhdt/article/view/12843/114116041 . Acesso em: 1 set. 2021.
    http://seer.upf.br/index.php/rhdt/articl...
    ).
  • 5
    A teoria dos focos-chave foi a base do plano de erradicação da febre amarela em um empreendimento mundial levado a cabo pela Fundação Rockefeller. Esse método de compreensão sobre a existência da amarílica considerava necessário que o mosquito Aedes aegypti fosse reduzido até um índice inferior a 5% nos grandes centros litorâneos para que a doença desaparecesse. O questionamento da teoria ameaçava todo um investimento realizado pela agência filantrópica internacional em torno da erradicação da febre amarela, visto que esta defendeu publicamente o método nos lugares em que atuou, além de financiar pesquisas e campanhas sustentadas nesse conhecimento.
  • 6
    A Comissão da Febre Amarela foi criada a partir do decreto nº 16.000, de 31 de dezembro de 1923 e que delegou ao International Health Board e ao Departamento Nacional de Saúde Pública a responsabilidade conjunta da eliminação do Aedes aegypti nas cidades litorâneas do Norte do Brasil. A supervisão dos trabalhos foi atribuída a uma Comissão da Febre Amarela composta por dois representantes de cada órgão e chefiada por um membro do último (cf. BENCHIMOL, 2001BENCHIMOL, Jaime Larry. Febre amarela: a doença e a vacina, uma história inacabada. 20. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Bio-Manguinhos, 2001., p. 119; BATISTA; SOUZA, 2020BATISTA, Ricardo dos Santos; SOUZA, Christiane Maria Cruz de. O curso da epidemia: a Fundação Rockefeller e os surtos de febre amarela na Bahia em 1926. Outros Tempos, São Luiz, v. 17, n. 30, p. 219-243, 2020. Disponível em: https://www.outrostempos.uema.br/index.php/outros_tempos_uema/article/view/787#:~:text=Este%20texto%20tem%20como%20objetivo,%E2%80%9D%2C%20defendida%20pela%20Funda%C3%A7%C3%A3o%20Rockefeller . Acesso em: 15 out. 2020.
    https://www.outrostempos.uema.br/index.p...
    , p. 230-231).
  • 7
    Destaca-se que Barros Barreto havia sido enviado à Bahia após um conflito explícito entre o representante do DNSP, Sebastião Barroso, e o IHB, em 1923, devido às divergências entre os métodos adotados pela agência filantrópica internacional para a erradicação da amarílica (BENCHIMOL, 2011BENCHIMOL, Jaime Larry. Febre amarela: a doença e a vacina, uma história inacabada. 20. ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Bio-Manguinhos, 2001.; PONTES, 2007PONTES, Adriano Arruda. Caçando mosquitos na Bahia: a Rockefeller e o combate à febre amarela - inserção, ação e reação popular (1918-1940). 2007. 147 f. Dissertação (Mestrado em História) - Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2007.). Esperava-se que o fato de ser inspetor do DNSP e ex-bolsista da Fundação Rockefeller colaborasse para uma harmonização entre instancias nacionais e internacionais, o que se verá, não ocorreu da forma desejada.
  • Declaração de financiamento:

    A pesquisa que resultou neste artigo foi desenvolvida no estágio de Pós-doutorado realizado na Faculdade de Medicina Preventiva da Universidade de São Paulo, contou com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, processo 150410/2019-0.
  • *
    Agradeço à supervisão do professor Dr. André Mota e à equipe do Museu Histórico Prof. Carlos da Silva Lacaz pelos diálogos estabelecidos, pelas condições para a realização do estudo e pelo acolhimento afetuoso em tempos de pandemia.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    26 Nov 2020
  • Aceito
    28 Abr 2021
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