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EDUCAÇÃO & SOCIEDADE 40 ANOS: REVISITANDO SUA TRAJETÓRIA À GUISA DE QUASE-DEPOIMENTO

40 Years of Education & Society: revisiting its trajectory as an almost testimony

Éducation et société 40 ans: révisant sa trajectoire à guise d’un quasi témoin

RESUMO:

Este artigo aborda a trajetória de 40 anos da Revista Educação & Sociedade situando o contexto político de surgimento da publicação correspondente à década de 1970, caracterizada pelo auge e declínio da ditadura militar no Brasil. Situa, na sequência, a mobilização do campo educacional no processo de abertura democrática e descreve, em um terceiro momento, o quadro institucional em que se inseriu a fundação da revista, apresentando uma possível explicação para a escolha do nome Educação & Sociedade. Por fim, retoma sucintamente os 11 números com os quais o autor contribuiu diretamente.

Palavras-chave:
Educação brasileira; Revistas de educação; Educação e sociedade

ABSTRACT:

This article discusses the 40-year history of the Education & Society Journal, situating the political context of its emergence corresponding to the 1970s, characterized by the rise and decline of the military dictatorship in Brazil. The article then situates the mobilization of the educational field in the process of democratic openness and describes, in a third moment, the institutional framework in which occurred the foundation of the journal, presenting a possible explanation for the choice of its name. Finally, this work briefly recapits the eleven numbers with which the author contributed directly.

Keywords:
Brazilian education; Education journals; Education and society

RÉSUMÉ:

Cet article traite des 40 ans d’histoire du magazine « Education & Society », en situant le contexte politique de son émergence correspondant aux années 1970, qui sont caractérisés par la montée et le déclin de la dictature militaire au Brésil. On situe ensuite la mobilisation du champ éducatif dans le processus d’ouverture démocratique et décrit le cadre institutionnel oú le magazine a été fondé, présentant une explication possible pour le choix de son nom « Education & Society ». Enfin, on récapitule brièvement les onze numéros auxquels l’auteur a directement contribué.

Mots-clés:
éducation brésilienne; Revues d’éducation; Éducation et société

É motivo para comemoração a efeméride dos 40 anos da Revista Educação & Sociedade, que acontece neste ano de 2018 com publicação ininterrupta e periodicidade regular. Com efeito, num país como o nosso, marcado por descontinuidades de modo especial nos campos da educação e da cultura, são raros os periódicos que conseguem atingir esse marco e, mesmo aqueles que conseguem, normalmente o fazem com algum lapso de tempo não garantindo a periodicidade da publicação. Outro dado indicativo da significativa difusão da revista é o número de reimpressões que tiveram vários de seus números. O número 1, por exemplo, lançado em setembro de 1978, já havia atingido, em 1984, a quinta reimpressão. Tendo participado desse empreendimento desde o primeiro número, o que me guindou, pela generosidade dos responsáveis pela revista, à posição de colaborador permanente, não poderia deixar de me fazer presente nessa comemoração, despretensiosamente, por meio do presente artigo. Assim, após situar o contexto político de surgimento da revista e a mobilização do campo educacional na particularidade da década de 1970, destacarei certos momentos da trajetória de Educação & Sociedade revisitando alguns números, em especial aqueles dos quais participei diretamente.

Contexto político de surgimento da Educação & Sociedade

No início da década de 1970, a ditadura militar instaurada no Brasil em 1º de abril de 1964 atingiu seu auge tanto economicamente, com a euforia do chamado “milagre econômico brasileiro”, como politicamente, com o recrudescimento da repressão. Isso ocorreu após a promulgação do Ato Institucional nº 5, em 13 de dezembro de 1968, sob cuja vigência instalou-se, em 30 de outubro de 1969, o governo Médici, que se estendeu até 15 de março de 1974.

Médici governou com mão de ferro articulando um enorme aparato repressivo com uma propaganda agressiva que lançava mão de slogans como “Brasil: ame-o ou deixe-o”. Também utilizava o futebol na euforia do tricampeonato mundial conquistado no México em 1970, e músicas como as de Dom e Ravel Eu te amo, meu Brasil, também gravada pela Banda Os Incríveis, cuja estrofe-estribilho proclamava:

Eu te amo meu Brasil, eu te amo Meu coração é verde, amarelo, branco, azul, anil Eu te amo meu Brasil, eu te amo Ninguém segura a juventude do Brasil

Outra música utilizada foi Você também é responsável, da mesma dupla, adotada pelo então ministro da Educação, coronel Jarbas Passarinho, como o hino do Mobral. Dessa forma, o governo Médici montou um enorme aparato persuasivo alimentado pela euforia do “milagre econômico brasileiro” e por uma propaganda milionária que propagava pela mídia slogans patrióticos, combinado com uma violenta repressão que se utilizava, inclusive, de torturas e assassinatos.

Mas foi também ainda no primeiro quinquênio dessa mesma década de 1970 que a ditadura iniciou seu declínio. Com o esgotamento do “milagre brasileiro” na esteira da crise econômica mundial, cuja manifestação mais visível foi a crise do petróleo, conduziu-se a chamada reconversão produtiva, dando origem ao fenômeno do neoliberalismo, ainda presente na atualidade. Nesse contexto, com a posse do quarto general-presidente, Ernesto Geisel, em 15 de março de 1974, os militares começaram a preparar a saída com o processo conhecido como “abertura lenta, gradual e segura”. Foi forjada pela eminência parda do regime, o general Golbery, tal como ele veio a explicitar, a posteriori, na famosa conferência denominada “Conjuntura política nacional: o poder executivo”, na qual ele desenvolveu o tema “Sístoles e diástoles na vida dos Estados” (SILVA, 1981SILVA, G. do C. e. Conjuntura política nacional: o poder executivo & geopolítica do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1981., p. 5-37). Em analogia com o movimento do coração, Golbery afirma que os Estados passam sucessivamente por um duplo movimento de centralização (sístoles) e descentralização (diástoles). Após detalhar a forma desse movimento, passa a examinar a conjuntura política nacional mostrando que, com a “Revolução de 1964”, o Brasil entrou num processo de centralização. Com o governo Geisel, deu-se início à descentralização, que desembocou na posse do quinto general-presidente, João Baptista de Oliveira Figueiredo, em 15 de março de 1979, e que teve, como um de seus primeiros atos, a anistia “ampla, geral e irrestrita”, promulgada em 28 de agosto de 1979.

Foi nessa conjuntura de crescente contestação ao regime militar que a oposição resolveu abandonar a tática do voto nulo, passando a sufragar os candidatos do MDB, até então considerado o partido da oposição consentida. Foi assim que o MDB lançou a candidatura de Ulysses Guimarães com Barbosa Lima Sobrinho para vice, disputando a eleição presidencial com a ARENA, que lançou o general Ernesto Geisel e o vice general Adalberto Pereira dos Santos. Geisel saiu vitorioso, com 400 votos contra 76 da chapa Ulysses Guimarães-Barbosa Lima Sobrinho. E, embora os governadores dos estados tenham sido eleitos indiretamente pelas respectivas Assembleias Legislativas, o que garantiu a vitória da ARENA em todos eles, nas eleições para o Senado o MDB foi vitorioso em 16 dos 22 estados. O movimento da oposição prosseguiu ao longo do governo Geisel cujo término foi marcado pela eleição de Figueiredo tendo como vice Aureliano Chaves. A disputa foi contra a chapa do MDB formada pelo general Euler Bentes Monteiro e pelo jurista Paulo Brossard, sendo que dessa vez a diferença foi menor: 355 votos contra 226 recebidos pela chapa oposicionista. Além da anistia, outra marca do início do governo Figueiredo foi a reforma política aprovada em 20 de dezembro de 1979, que extinguiu o bipartidarismo adotando o regime pluripartidário. Na citada conferência sobre “sístoles e diástoles na vida dos Estados”, Golbery considera que, após o governo Geisel ter demitido o general Silvio Frota, ministro do Exército, neutralizando a direita radical e esvaziando a candidatura oposicionista do general Euler Bentes Monteiro, o governo se encontrou diante de uma nova questão: como prosseguir depois, ante uma frente única de oposição? E, respondendo a essa pergunta, justificou a volta ao pluripartidarismo:

A estratégia recomendaria - como requeria, aliás, também, a própria intenção democratizante - pronta desarticulação do sistema oposicionista, propiciando-se o surgimento de múltiplas frentes distintas, em relação às quais voltasse a ser possível levar a cabo novo tipo, mais ampliado, da mesma manobra em posição central que fora penhor do êxito alcançado na fase anterior.

[...]. Em termos políticos, estaria aí, à disposição, a tese vigorosa do pluripartidarismo, instituído afinal pelas reformas dos fins de 1979 (SILVA, 1981SILVA, G. do C. e. Conjuntura política nacional: o poder executivo & geopolítica do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1981., p. 28).

Portanto, fica claro, aí, que a reforma política que introduziu o pluripartidarismo foi uma estratégia do regime militar para dividir a oposição e, assim, realizar a transição sem abrir mão do poder, buscando tornar vitorioso no Colégio Eleitoral o PDS, partido de sustentação do governo instaurado pela ditadura.

O campo da educação no contexto de surgimento da Revista Educação & Sociedade

As mudanças no campo político foram acompanhadas de intensa mobilização do campo educacional traduzida na implementação de propostas de política educacional, como as que ocorreram em decorrência das eleições municipais de 1976. Destaque para os municípios de Boa Esperança, no Espírito Santo, Lages em Santa Catarina e Piracicaba, em São Paulo, que reorientaram suas políticas educacionais antecipando-se, de algum modo, às mudanças que vieram a ocorrer nos estados após as eleições diretas para governador ocorridas no final de 1982 (CUNHA, 1991CUNHA, L.A.C.R. Educação, Estado e democracia no Brasil. São Paulo: Cortez, 1991., p. 110-125).

Outro aspecto que marcou a década de 1970 foi o processo de implantação dos Programas de Pós-Graduação em decorrência da institucionalização. Foi acionada pelo regime militar já no início de 1965, quando o ministro da educação solicitou ao Conselho Federal de Educação que analisasse, visando a sua regulamentação, o dispositivo contido na Alínea b do Artigo 69 da LDB de 1961, referente aos “cursos de pós-graduação, abertos à matrícula de candidatos que hajam concluído o curso de graduação e obtido o respectivo diploma” (BRASIL, 1961BRASIL. Lei n. 4024, de 20 de dezembro de 1961: fixa as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União - Seção 1 - 27/12/1961, Página 11429 (Publicação Original).). E o Conselho Federal de Educação respondeu a essa interpelação do ministro da educação por meio do Parecer CFE 977/65, aprovado em 3 de dezembro de 1965, que conceituou a Pós-Graduação, e do Parecer 77/69, de 11 de fevereiro de 1969, que regulamentou sua implantação.

Vê-se, assim, que a pós-graduação se institucionalizou no Brasil em função do projeto militar da “Pátria Grande” ou do “Brasil Potência” que, guiando-se pelo binômio “segurança e desenvolvimento” buscava a modernização do país pela via de sua integração ao capitalismo de mercado na forma associada e dependente. A implantação desse projeto dependia do desenvolvimento científico e tecnológico sem o qual não se atingiria a modernização da sociedade brasileira, necessária à construção do “Brasil Potência”. A pós-graduação se constituiu na via estratégica à qual caberia exatamente o papel de formar os quadros intelectuais de alto nível exigidos para se atingir os objetivos de modernização na construção da “Pátria Grande”. De fato, a implantação e consolidação da pós-graduação no Brasil não deixaram de cumprir com razoável eficácia esse papel, tanto assim que mais de 90% da produção científico-tecnológica brasileira ocorre nas universidades públicas, dominantemente no âmbito da pós-graduação. No entanto, como mostrou Oliveira (1980OLIVEIRA, B. O Estado autoritário brasileiro e o ensino superior. São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1980., p. 16), a política de implantação e consolidação da pós-graduação produziu um resultado contraditório, formando agentes alinhados com os interesses dominantes (resultado desejado, mas não proclamado) e agentes com uma postura crítico-reflexiva diante da situação do país (resultado proclamado, mas não desejado).

Efetivamente, no caso da educação, a pós-graduação contribuiu de forma importante para o desenvolvimento de uma tendência crítica que, gerando estudos consistentes a contrapelo da orientação dominante, alimentou um movimento emergente de propostas pedagógicas contra-hegemônicas. Obviamente, as autoridades no exercício do poder na Presidência da República, no MEC, na CAPES, no CNPq - cuja sigla teve sua denominação modificada pelo regime militar de “Conselho Nacional de Pesquisas” para “Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico”, na FINEP, criada pela ditadura - proclamaram que o estímulo à pesquisa científico-tecnológica tinha como condição o desenvolvimento do espírito crítico. No entanto, é claro que não desejavam o surgimento de estudos críticos da orientação dominante e propostas pedagógicas contra-hegemônicas. De fato, porém, a pós-graduação constituiu um espaço propício ao desenvolvimento da crítica, uma vez que vários dos militantes que, em virtude do fechamento do regime, tiveram de se afastar da luta político-partidária vieram a se refugiar nas universidades, dedicando-se à realização de pesquisas. Em suma, a partir da aprovação do Parecer CFE 77/69, de 11 de fevereiro de 1969, os Programas de Pós-Graduação em Educação foram se instituindo e vieram a produzir seus primeiros frutos na forma de dissertações de mestrado em meados da década de 1970.

Considerando a qualidade desses trabalhos, um grupo de professores que trabalhava na PUC de São Paulo colaborando, também, nos Programas de Pós-Graduação em Educação da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP), da UNICAMP e UFSCar, entendeu que era importante providenciar sua divulgação. Esse grupo era composto por seis professores incluindo, além de mim, Joel Martins, Casemiro dos Reis Filho, Antonio Joaquim Severino, Maurício Tragtenberg e Walter Esteves Garcia. Decidimos, então, constituir, em 1976, uma Comissão Editorial e criamos a Coleção “Educação Universitária”, de cujo Conselho Editorial participou, também, circunstancialmente, o Prof. Edgard de Assis Carvalho, da área de antropologia. Passamos, então, a publicar na referida Coleção pela Editora Cortez & Moraes, criada a partir de dois livreiros que atuavam na PUC-SP, José Xavier Cortez e Orozimbo José de Moraes. Os primeiros títulos foram lançados em 1978, sendo que em 1979 a Coleção já havia atingido 23 títulos, a maioria deles resultantes de dissertações de mestrado. Foi assim que, ao criar a Revista Educação & Sociedade, seus primeiros números foram publicados pela Editora Cortez & Moraes.

Uma nova fase teve início em 1980 em razão de ter sido desfeita, em 1979, a sociedade entre José Xavier Cortez e Orozimbo José de Moraes, o que determinou o desaparecimento da Editora Cortez & Moraes. Assim, surgiram duas novas editoras: a Cortez Editora e a Editora Moraes. Diante disso, o grupo de professores que integrava o Conselho Editorial decidiu repensar o projeto e, para não ficar à mercê dos humores de editores, resolveu constituir sua própria editora. Para efetivar esse novo projeto, o grupo original convidou mais quatro integrantes: Gilberta Sampaio de Martino Jannuzzi, professora da UNICAMP que havia concluído sua dissertação de mestrado, em 1978, na PUC-SP, e que fora publicada na Coleção “Educação Universitária” com o título Confronto pedagógico: Paulo Freire e Mobral, em 1979; Miguel de La Puente, da UNICAMP; Milton de Miranda, do Setor de Contabilidade da PUC-SP; e Moacir Gadotti, então professor da Faculdade de Educação da UNICAMP. Dessa forma, ficou constituído um corpo de dez sócios que fundaram a Editora Autores Associados.

Decidiu-se pelo nome “Autores Associados” porque seus criadores eram autores reais ou potenciais que estavam se associando para realizar esse projeto comum, comprometendo-se ainda com os demais autores que, mediante produção científica relevante, viessem a contribuir de modo relevante para o desenvolvimento da educação, particularmente, e da cultura brasileira, de modo geral. A nova editora decidiu iniciar publicando em coedição com a Cortez Editora em 1980. Foram cinco os títulos que, lançados conjuntamente no Calçadão da Livraria Brasiliense, à época situada na Rua Barão de Itapetininga, nº 99, no centro de São Paulo, marcaram o início das atividades da Editora Autores Associados. Entre eles, encontrava-se o número 5 da Revista Educação & Sociedade, que registrou, na seção “Comentários e resenhas”, a informação: “Surge uma nova editora, p. 187”. Tratava-se, evidentemente, da Editora Autores Associados.

A Revista e o Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES)

Na efervescente segunda metade da década de 1970, a mobilização do campo educacional foi se intensificando com a organização ou reorganização das entidades representativas dos profissionais da educação, com o surgimento de organizações na área dos estudos e pesquisas educacionais e com a crescente circulação das ideias e propostas pedagógicas e de política educativa. A UNICAMP, fundada em 1966, veio a instituir sua Faculdade de Educação em 1972, onde iniciou-se o funcionamento do Curso de Pedagogia em 1974 e o Programa de Pós-Graduação em Educação em agosto de 1975. Contou com a contribuição de alguns professores que já atuavam na pós-graduação da área de educação na PUC-SP, como o Prof. Joel Martins, da pós-graduação em psicologia educacional, iniciada em 1970, e Newton Aquiles Von Zuben, da pós-graduação em filosofia da educação, iniciada em 1971. Em 1975, já contávamos, também, com o Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Educação da UNIMEP, iniciado em agosto de 1972 no Instituto Educacional Piracicabano a partir da equipe de professores que atuava no Programa de Filosofia da Educação da PUC de São Paulo (Newton Aquiles Von Zuben, Geraldo de Oliveira Tonaco, Antonio Joaquim Severino e Dermeval Saviani). A partir de agosto de 1975, assumi como professor titular da UFSCar, tendo presidido a Comissão que organizou o Programa de Pós-Graduação em Educação cujo início se deu em março de 1976 sob minha coordenação.

Foi nesse quadro institucional que um grupo de dez professores da Faculdade de Educação da UNICAMP, em reunião informal realizada em abril de 1978, “decidiu lançar a ideia de uma Revista que marcasse o perfil da Faculdade, porém aberta a outras instituições e pessoas que, em caráter individual, queriam participar da programação e da edição dessa Revista” (DE ROSSI & PINO, 2002DE ROSSI, V.L.S.; PINO, I.R. (Orgs.). Catálogo memória: Revista Educação & Sociedade e Cadernos CEDES. Campinas: CEDES, 2002., p. 5). Essa ideia recebeu novos aclaramentos numa segunda Circular, de 9 de maio de 1978, agora com o grupo já ampliado para 14 professores. Segundo essa Circular, a revista recebeu um nome, então considerado como provisório, “Educação e Sociedade”, sendo definida como uma revista de Ciências da Educação destinada “a todo público interessado em educação, especialmente para pesquisadores, especialistas em educação, professores e alunos” (DE ROSSI & PINO, 2002DE ROSSI, V.L.S.; PINO, I.R. (Orgs.). Catálogo memória: Revista Educação & Sociedade e Cadernos CEDES. Campinas: CEDES, 2002., p. 5).

Efetivamente, em setembro de 1978, veio a lume o número 1 de Educação & Sociedade - Revista Quadrimestral de Ciências da Educação, cuja sessão de lançamento, bastante concorrida, aconteceu no mesmo Calçadão da Livraria Brasiliense, onde dois anos depois ocorreria o lançamento da Editora Autores Associados, como já foi descrito.

Nas referências que consultei sobre o surgimento da revista, não encontrei menção à razão pela qual se optou pela denominação Educação & Sociedade. Arrisco, pois, uma explicação.

No primeiro capítulo do livro Escola e democracia (SAVIANI, 2018SAVIANI, D. Escola e democracia. 43. ed. Campinas: Autores Associados, 2018., p. 3-28), ao tratar das teorias da educação, classifico-as em dois grupos, a saber: teorias não críticas e teorias críticas, as quais, por sua vez, são subdivididas em teorias crítico-reprodutivistas e teorias críticas propriamente ditas. Adotei como critério de criticidade a percepção dos condicionantes objetivos da educação, ou seja, o reconhecimento da determinação que é exercida pela sociedade sobre a educação. Assim, as teorias não críticas são aquelas que entendem a educação como autônoma e buscam compreendê-la a partir de si mesma. Inversamente, as teorias críticas se empenham em compreender a educação remetendo-a sempre a seus condicionantes objetivos, isto é, à estrutura socioeconômica que determina a forma de manifestação do fenômeno educativo.

Ora, o movimento de crítica à política educacional e à orientação pedagógica de caráter tecnicista da ditadura militar beneficiou-se das análises efetuadas pelas teorias crítico-reprodutivistas. Mostrou-se a determinação da forma assumida pela sociedade sobre a orientação que se imprimia à educação, pondo em evidência o papel de reprodução das relações sociais de dominação exercido pela educação. Assim, impunha-se como necessário explicitar a relação entre educação e sociedade como exigência de superação da orientação que o regime militar vinha impondo à educação no país, tanto para mostrar o caráter reprodutor das relações de dominação que marcava a educação, como para se contrapor à orientação dominante caminhando em direção a uma orientação pedagógica articulada com a transformação das relações sociais vigentes. Eis porque se impôs a explicitação da relação entre educação e sociedade materializada no nome da revista que então se lançava. Assim como, logo depois, no Centro de Estudos criado para dar sequência à mobilização que visava passar da educação domesticadora a uma educação libertadora; de uma educação reprodutora a uma educação transformadora das relações sociais.

A forma de apresentação da Revista Educação & Sociedade constituiu uma estrutura relativamente flexível, mas com algumas constantes e inovações. A parte permanente se constituiu, obviamente, das seções “Artigos” e “Resenhas”. Quanto às inovações, uma delas foi a indicação, para cada número, de um tema em destaque, o que vigorou do primeiro ao 20º número. Após a sequência contínua dos 20 primeiros números, o destaque a determinados temas voltou a aparecer no número 53, de dezembro de 1995, dedicado especialmente ao tema “Educação e Democracia: limites impostos pelo autoritarismo social”. A partir daí o enunciado dos temas em destaque aparece dominantemente nos números especiais ou organizados na forma de dossiês que, aliás, constituem a maioria dos números publicados entre 1996 e este ano de 2018.

De modo geral, a definição dos temas era provocada pelas questões mais candentes postas pela conjuntura que estávamos vivendo abordadas à luz dos objetivos da revista. A título de exemplificação, chamo a atenção para os temas do nº 1, setembro de 1978 - “O educador precisa ser educado”; nº 3, maio de 1979 - “Pedagogia do oprimido - Educação do colonizador”; nº 8, janeiro de 1981 - “Educação: instrumento de luta”; nº 10, setembro de 1981 - “Dimensão política da ação educativa”; nº 13, dezembro de 1982 - “Após as eleições, o debate continua”, em alusão às eleições diretas para governador estadual, ocorridas em 15 de novembro de 1982, que não eram realizadas desde 1965; nº 15, agosto de 1983 - “Pensar a educação é pensar a sociedade”; nº 16, dezembro de 1983 - “Pensar a educação é pensar a transformação da sociedade”; nº 20, janeiro/abril de 1985 - “Mudança ou transformação?”.

A composição estrutural da revista incorporou, ainda, outras inovações, como as seções “Jornal da Educação” e “Análises da prática pedagógica”, ambas introduzidas no número 10, de setembro de 1981; e “Imagens & Palavras, introduzida no número 77, de dezembro de 2001, cujo Editorial assim a anunciou:

Nesta edição, abre-se, com “O eclipse, o dragão e o cinema: Estudo sobre o filme O estado do cão”, de Milton José de Almeida, uma nova seção, denominada Imagens & Palavras, que amplia, introduzindo ensaios críticos sobre cinema e outras artes visuais, o espaço até agora dedicado exclusivamente a resenhas de livros e documentos assemelhados” (EDITORIAL, 2001EDITORIAL. Educação & Sociedade, n. 77, dezembro/2001., p. 6-7).

Registro, ainda, as seções “Comentários” e “Debates”. Em “Comentários” abre-se espaço para destacar e interpretar questões ou acontecimentos relevantes do campo educacional; e a seção “Debates” é aproveitada para confrontar posições e trazer à baila questões polêmicas passíveis de uma análise mais aprofundada.

É de se notar, enfim, que a criação da revista precedeu à fundação do CEDES. Assim, em lugar do que ocorre normalmente em que se cria uma organização, uma instituição, uma determinada entidade com finalidades específicas que, uma vez constituída, acaba por criar uma revista como um veículo de comunicação e divulgação de suas finalidades e de suas ações, nesse caso ocorreu o contrário. De certo modo foi a revista, senão o único, pelo menos um dos elementos que provocou a necessidade de criação de um órgão que levasse à frente esse empreendimento, como podemos ler no número 3 da publicação:

A Revista Educação & Sociedade foi lançada com o intuito de promover um amplo debate da educação brasileira, tendo como seu cerne a luta contra a educação do colonizador, que é a nossa educação dominante, e propor uma educação que não seja apenas interrogativa, crítica, mas que seja afirmativa, na busca de alternativas válidas. A crítica é certamente necessária, estimulante, mas insuficiente. É preciso indicar os primeiros passos para a superação das nossas contradições, geradas pela divisão social do trabalho, pela exploração e pela dominação ideológica. E para que essa finalidade seja atingida, nossa arma não pode ser apenas as palavras, mas, igualmente, a ação, orgânica e coesa, em torno de objetivos traçados lucidamente. Nesse sentido, nossos esforços de reunir educadores, cientistas da educação e estudantes, acabam de ser concretizados na criação, em março último, do Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES). Desta forma, os entraves, as limitações e as dificuldades da primeira hora foram superados pela criação de um órgão que abrirá caminho, lutando contra a resistência oferecida pela inércia e garantindo a continuidade do nosso trabalho (Educação & Sociedade, nº 3, maio de 1979REVISTA Educação & Sociedade, n. 3, maio/1979, p. 3).

De fato, em assembleia realizada em Campinas, no dia 5 de março de 1979, foi formalizada a fundação do CEDES (DE ROSSI; PINO, 2002DE ROSSI, V.L.S.; PINO, I.R. (Orgs.). Catálogo memória: Revista Educação & Sociedade e Cadernos CEDES. Campinas: CEDES, 2002., p. 8). Criado com os objetivos de realizar estudos e pesquisas sobre problemas educacionais, organizar eventos, manter contato permanente com instituições congêneres no campo das ciências da educação e promover publicações, coube a ele a tarefa permanente de editar a revista Educação & Sociedade e realizar, em colaboração com outras entidades, o Seminário de Educação Brasileira. Este, cuja primeira edição aconteceu já em 1978, portanto também antes que fosse formalizada a criação do CEDES, teve sequência na forma das Conferências Brasileiras de Educação (CBEs) realizadas, em seis edições, entre 1980 e 1991 numa organização conjunta do CEDES, da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) e da Associação Nacional de Educação (ANDE).

Revisitando alguns momentos à guisa de um quase-depoimento

O número inaugural da revista que teve em destaque o tema “O educador precisa ser educado”, como já mencionado, contou com as seções “Artigos”, “Comentários”, “Resenhas” e “Novas Revistas”, compostas por dez artigos, quatro comentários, quatro resenhas e a informação do surgimento de cinco novas revistas.

Participei desse número com o artigo “Educação brasileira: problemas”. Em verdade eu havia escrito esse texto para um número especial da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, do INEP, que versaria sobre “Estudo de Problemas Brasileiros”, o famigerado EPB que havia sido introduzido como disciplina obrigatória em todos os cursos de nível superior pela ditadura militar. No entanto, provavelmente por causa do tom crítico dos artigos enviados, o plano do número especial foi cancelado. Assim, ao ser solicitado a colaborar com o primeiro número de Educação & Sociedade, encaminhei o texto no qual conceituo a educação como uma atividade mediadora no seio da prática social global e procuro situar o papel da educação no quadro da desintegração cultural brasileira. Discuto, então, o conceito de cultura e me contraponho à ideia de que no Brasil vigorariam diferentes culturas expressas na noção de “arquipélago cultural”. Assim, a desintegração cultural não se define pela diversidade cultural, mas ao contrário, está ancorada na unidade cultural definindo-se pelo fato de que grande parte da população está marginalizada das conquistas culturais. Daí a importância da educação e, especificamente, do ensino primário para permitir a toda a população a apropriação dos instrumentos de acesso às conquistas culturais de cuja produção ela participa, mas de cuja fruição é excluída. Chego, enfim, à seguinte conclusão: diante do quadro da desintegração cultural brasileira, a educação desempenhará o papel de reforçamento dos laços sociais voltando-se para as formas de convivência que se desenvolvem no seio dos diversos grupos sociais, estimulando-os na sua originalidade e promovendo o intercâmbio entre eles a partir dos elos que, embora tênues, os unem entre si num mesmo todo social.

Quanto às outras seções do nº 1 de Educação & Sociedade destaco, em “Comentários”, o texto do Prof. Casemiro dos Reis Filho denominado de “Universidade Emergente”, no qual ele considera a situação de crise da universidade para destacar alguns sinais de transformação da universidade brasileira. A seção “Resenhas” traz análises sobre os livros Educação e dependência, de Manfredo Berger; Capitalismo e educação, de Wagner Gonçalves Rossi; Política e educação popular, de Silvia Maria Manfredi; e Confronto pedagógico: Paulo Freire e Mobral, de Gilberta Sampaio de Martino Jannuzzi. E a seção “Novas Revistas” informa sobre as revistas Cara a Cara; Revista de Cultura Contemporânea; Revista Civilização Brasileira; Revista Escrita/Ensaio; e Revista Plural.

Voltei a colaborar com a revista no número 3, de maio de 1979, no qual o tema em destaque foi “Pedagogia do Oprimido - Educação do Colonizador”. Dessa vez participei na seção “Comentários” por meio do texto “Uma Concepção de Mestrado em Educação”, que fora apresentado na Primeira Reunião Científica da ANPEd, realizada em Fortaleza, de 21 a 23 de agosto de 1978. A discussão do tema central do evento, que girou em torno da Concepção de Mestrado em Educação, foi bastante acalorada conforme indica, de passagem, o “Relatório-Síntese dos Trabalhos”, também publicado nesse mesmo número de Educação & Sociedade ao observar que as orientações para a reformulação então apresentadas não foram endossadas por todos os presentes.

A colaboração seguinte deu-se na forma de um dos sete artigos que compuseram o número 8, de março de 1981, centrado no tema “Educação: Instrumento de Luta”. O artigo teve como título “Extensão universitária: uma abordagem não-extensionista”, que resultou de uma palestra a universitários que se preparavam para, no âmbito do Projeto Rondon, desenvolver programas de assistência comunitária nas regiões do Vale do Ribeira, Pontal do Paranapanema e zonas periféricas da Grande São Paulo. No texto, empenhei-me basicamente em mostrar que a extensão universitária não deve ser entendida, de forma assistencialista, como o ato unidirecional por parte dos universitários de estender às populações pobres os conhecimentos identificados com a chamada cultura superior. Ao contrário, mostrei que, em verdade, é a população trabalhadora que, além de produzir os bens necessários a todos, também economicamente mantém a própria estrutura do Estado e, portanto, as universidades públicas, uma vez que, pelo mecanismo do imposto regressivo e também porque constitui a maioria da população do país, o grosso dos impostos que mantém a estrutura e as atividades dos órgãos públicos provêm da classe trabalhadora.

Destaquei o modo como Educação & Sociedade se utilizou da seção “Debates” pondo em evidência questões polêmicas e aprofundando sua compreensão. Pois bem. O primeiro momento em que essa seção aparece na revista é no número 9, com três textos, entre eles o de Carlos Roberto Jamil Cury, “A propósito de Educação e Desenvolvimento Social no Brasil”. A decisão de socializar esse debate ocorreu nas discussões que travamos entre os participantes da primeira turma de doutorado da PUC-SP tanto no âmbito da disciplina “Teoria da Educação”, por mim ministrada, na qual desenvolvemos um estudo monográfico sobre Gramsci, como nas Atividades Programadas nas quais, compondo parte dos créditos que os alunos deviam cumprir para concluir o doutorado, discutíamos o andamento das pesquisas tendo em vista a elaboração das respectivas teses de doutorado. Nesse processo, debatendo as contribuições e os limites das teorias que convencionei denominar de crítico-reprodutivistas, veio à baila a presença dessa orientação teórica no livro de Luiz Antônio Cunha Educação e Desenvolvimento Social no Brasil, surgindo a ideia de socializar essa discussão. Foi assim que Cury ficou encarregado de abrir o debate sendo seguido da réplica de Luiz Antonio, já que ambos integravam a primeira turma e desenvolviam suas pesquisas de doutorado com minha orientação. Assim, o número 9 de Educação & Sociedade centrado no tema “Luta pela organização dos educadores”, de maio de 1981, estampou o texto de Cury. E a réplica foi publicada na forma do artigo de Luiz Antônio Cunha “Sobre educação e desenvolvimento social no Brasil: crítica da crítica e autocrítica” no número 10, de setembro de 1981, cujo tema destacado foi “Dimensão política da ação educativa”.

Essa linha de debates teve sequência no número 14 - abril de 1983, cujo tema era “A crítica e a prática da educação”, em que Paolo Nosella abriu uma polêmica com Guiomar Namo de Mello publicando o texto “Compromisso político como horizonte da competência técnica” na seção “Debates”. Considerando que Nosella e Guiomar Mello também integraram a primeira turma do doutorado em educação da PUC-SP, tendo sido ambos meus orientandos que, coincidentemente, defenderam suas teses no mesmo dia 26 de junho de 1981, decidi intervir nessa polêmica publicando na Seção “Debates” do número 15 - agosto de 1983, o texto “Competência política e compromisso técnico (ou o pomo da discórdia e o fruto proibido)”.

Outro aspecto que cabe destacar na trajetória dos 40 anos de Educação & Sociedade é a sensibilidade para acolher referências a determinados acontecimentos que nos sobrevêm e cujo registro resulta pertinente fazer. Foi esse o caso da morte, em 11 de junho de 1987, de um de nossos maiores pensadores, o filósofo Álvaro Vieira Pinto. Na ocasião enviei à Folha de S.Paulo um texto marcando esse acontecimento e destacando a importância da contribuição de Vieira Pinto à cultura e à educação brasileira. O jornal recusou alegando que a Folha não publicava efemérides. No entanto, pouco mais de um mês depois, tendo ocorrido a morte de Gilberto Freyre em 18 de julho do mesmo ano, a Folha não deixou de registrar essa efeméride. Enviei, então, o texto à revista do CEDES que o publicou na Seção “Resenhas” do número 27 - setembro de 1987 - com o título “Tributo a Álvaro Vieira Pinto”.

Em 24 de fevereiro de 2001, faleceu o Prof. Casemiro dos Reis Filho que integrou os quadros do CEDES desde sua origem. Novamente Educação & Sociedade abriu espaço para registrar a importância da contribuição de Casemiro para a educação brasileira com a publicação, no número 77 - dezembro de 2001, p. 161-181, do texto “Casemiro dos Reis Filho e a educação brasileira”. Nesse artigo tracei a trajetória do Prof. Casemiro a partir da origem de seus pais, em Portugal, passando pela sua escolarização no interior de São Paulo, sua formação na Escola Normal, a graduação em pedagogia na USP, o doutorado na PUC-SP, sua experiência no ensino fundamental, médio e superior, na produção científica, na administração universitária e na divulgação de pesquisas educacionais, evidenciando sua destacada contribuição ao desenvolvimento da educação brasileira.

E eu próprio fui beneficiário da sensibilidade da revista para acolher referências a determinados acontecimentos quando me foi solicitado que encaminhasse o texto da alocução que havia proferido na cerimônia em que me foi concedido, pela UNICAMP, o título de Professor Emérito em 15 de março de 2002, publicado no número 81 - dezembro de 2002, p. 273-290, na seção “Jornal da Educação”, com o título “Percorrendo caminhos na educação”.

Em dezembro de 1999, no apagar das luzes do século XX e do Segundo Milênio, foi lançado o número 69 aberto com o Editorial “Mas que razão?”, redigido por Pedro Goergen, membro do Conselho Editorial Nacional a convite do Comitê de Redação. No Editorial, Pedro Goergen assevera que o ser humano encontra-se, nesse momento histórico, em crise permanente que se manifesta precipuamente como crise da razão. Não deixou de ser gratificante para mim participar desse último número do século e do milênio com o artigo “Sistemas de ensino e planos de educação: o âmbito dos municípios”, no qual recuperei o percurso histórico dos planos de educação no Brasil para equacionar a questão das relações entre sistemas de ensino e planos de educação no âmbito dos municípios. Concluí afirmando a necessidade de contrapor à racionalidade financeira, que rege os planos de educação, a racionalidade social, ou seja, o uso adequado dos recursos de modo a realizar o valor social da educação.

Em outubro de 2007 a revista chegou ao número 100, ocasião em que foi lançada uma edição comemorativa tendo como tema central “Educação escolar: os desafios da qualidade”, constituído por um volume ampliado composto por uma única seção contendo 25 artigos. Considerando o conjunto de decretos baixados em abril de 2007 por meio dos quais o MEC lançou o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), contribuí com esse número com o último artigo denominado “O Plano de Desenvolvimento da Educação: análise do projeto do MEC”, no qual analisei globalmente a proposta do MEC visando responder à seguinte pergunta: em que medida esse novo plano se revela capaz de enfrentar a questão da qualidade do ensino das escolas de educação básica? Para responder, considerei os seguintes pontos:

  • A configuração do PDE com suas 30 ações;

  • Análise da singularidade do plano em confronto com os planos anteriores;

  • A singularidade do PDE diante do problema da qualidade da educação básica;

  • As bases de sustentação do plano;

  • Um caminho para superar as limitações do PDE.

O número 112, correspondente ao triênio de julho a setembro de 2010, teve como tema central “Caminhos na construção do Plano Nacional de Educação: questões desafiadoras e embates emblemáticos” e foi composto pelas seções “Artigos”, com 17 textos, e “Imagens & Palavras”, contendo a entrevista “A Conferência Nacional de Educação (CONAE) e o Plano Nacional de Educação (PNE)”, realizada pelo Comitê Editorial de Educação & Sociedade com o secretário adjunto do MEC e coordenador da CONAE, Francisco das Chagas Fernandes. Compareci nesse número com o artigo “Organização da educação nacional: Sistema e Conselho Nacional de Educação, Plano e Fórum Nacional de Educação”, analisando a organização da educação nacional a partir do disposto na LDB de 1996. Também indiquei os elementos para a implantação do Sistema Nacional de Educação com sua instância normativa e deliberativa representada pelo Conselho Nacional de Educação em articulação com o Plano Nacional de Educação e com seu órgão de acompanhamento e avaliação constituído pelo Fórum Nacional de Educação.

O número 124 correspondeu ao triênio julho-setembro de 2013 e teve como tema em destaque “Desafios à educação brasileira: PNE, responsabilização, colaboração e Sistema Nacional de Educação”, sendo composto por apenas uma seção contendo 16 artigos, tendo eu contribuído com o sétimo denominado “Vicissitudes e perspectivas do direito à educação no Brasil: abordagem histórica e situação atual”. Partindo da caracterização do significado do direito à educação como direito social proclamado e considerando que a cada direito corresponde um dever, examinei as vicissitudes decorrentes do conflito entre o direito à educação e o dever de educar na história da educação brasileira. Em seguida analisei a persistência do referido conflito na situação atual para, em conclusão, considerar as perspectivas de solução, pondo em foco o problema da organização do Sistema Nacional de Educação.

Conclusão

Apresentados os 11 números com os respectivos artigos que me propus a revisitar para compor este texto comemorativo dos 40 anos da Revista Educação & Sociedade, esclareço que considerei essa revisita um quase-depoimento porque tomei como referência minha participação direta na trajetória da publicação. Nessa condição, apresento-me como alguém que pode testemunhar sobre um fato determinado, ou seja, neste caso, a trajetória exitosa da revista Educação & Sociedade. Considerei-o, entretanto, um quase-depoimento porque não tive a pretensão de apresentar-me como uma testemunha capaz de demonstrar cabalmente o referido êxito nem de cumprir rigorosamente todos os requisitos implicados no conceito de depoimento. Por isso permiti-me, partindo de minha participação e cingindo-me aos momentos em que contribuí diretamente na construção do conteúdo da revista, atestar de forma livre e não exaustiva que, ao atingir 40 anos de publicação contínua e ininterrupta, a Revista Educação & Sociedade soube contornar as dificuldades e manter-se atuante como uma força significativa no desenvolvimento da educação brasileira. E, na conjuntura atual em que nosso país passa por uma espécie de terremoto político, só posso almejar que o acúmulo de experiência no curso dos últimos 40 anos permita à revista resistir às pressões adversas e prosseguir em seu trabalho de esclarecimento das mentes e de incentivo à árdua luta em defesa de uma educação pública, gratuita e de qualidade acessível a toda a população brasileira.

Referências

  • BRASIL. Lei n. 4024, de 20 de dezembro de 1961: fixa as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União - Seção 1 - 27/12/1961, Página 11429 (Publicação Original).
  • CUNHA, L.A.C.R. Educação, Estado e democracia no Brasil São Paulo: Cortez, 1991.
  • DE ROSSI, V.L.S.; PINO, I.R. (Orgs.). Catálogo memória: Revista Educação & Sociedade e Cadernos CEDES Campinas: CEDES, 2002.
  • EDITORIAL. Educação & Sociedade, n. 77, dezembro/2001.
  • OLIVEIRA, B. O Estado autoritário brasileiro e o ensino superior São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1980.
  • REVISTA Educação & Sociedade, n. 3, maio/1979
  • SAVIANI, D. Escola e democracia 43. ed. Campinas: Autores Associados, 2018.
  • SILVA, G. do C. e. Conjuntura política nacional: o poder executivo & geopolítica do Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1981.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    21 Ago 2018
  • Aceito
    28 Ago 2018
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