Acessibilidade / Reportar erro

Renovação da Educação Física no Uruguai: o ISEF em foco

Renovation of Physical Education in Uruguay: an analysis of ISEF

Renovación de la Educación Física en Uruguay: el ISEF en foco

RESUMO

O presente artigo descreve experiências de um processo crítico que resulta na renovação de sentidos da Educação Física no Uruguai. Para tanto, realizou entrevistas com seis docentes do Instituto Superior de Educación Física da Universidad de la República. A partir das narrativas, discute dois planos de estudo da instituição e analisa a presença de literatura brasileira no ISEF, oportunidades para conhecer as transformações teórico-discursivas operadas no campo da Educação Física uruguaia.

Palavras-chave:
Educação Física; Pedagogia crítica; Currículo; Uruguai

ABSTRACT

The article describes experiences of a critical process that results in the renewal of meanings of Physical Education in Uruguay. To delve into this, interviews were carried out with six professors from the Higher Institute of Physical Education of the University of the Republic. From the narratives, it discusses two study plans of the institution and analyzes the presence of Brazilian literature in ISEF, opportunities to get to know the theoretical-discursive transformations operated in the field of uruguayan Physical Education.

Keywords:
Physical Education; Critical pedagogy; Curriculum; Uruguay

RESUMEN

Este artículo describe experiencias de un proceso crítico que resulta en la renovación de los sentidos de la Educación Física en Uruguay. Para tanto, se realizaron entrevistas con seis docentes del Instituto Superior de Educación Física de la Universidad de la República. A partir de las narrativas, se discuten dos planes de estudio de la institución y se analiza la presencia de bibliografía brasileña en el ISEF, oportunidades para conocer las transformaciones teórico-discursivas operadas en el campo de la Educación Física uruguaya.

Palabras-clave:
Educación Física; Pedagogía crítica; Currículo; Uruguay

INTRODUÇÃO

Este artigo se insere no contexto de uma ampla investigação que objetiva compreender movimentos de crítica e renovação da Educação Física no continente sul-americano. No caso da dissertação que o fundamenta, o objetivo foi descrever esses processos à luz da realidade uruguaia, particularmente com o que se passou no âmbito do Instituto Superior de Educación Física (ISEF) da Universidad de la República (Udelar). Apesar de não ser o único local de formação de professores de Educação Física no Uruguai,1 1 Além do Instituto, no Uruguai ainda existe o curso de formação em Educação Física oferecido pela Asociación Cristiana de Jóvenes e pela Universidad de la Empresa, as duas de âmbito privado. o ISEF é o lugar privilegiado nas análises por ser “[...] la única institución de formación docente del Uruguay que atraviesa todo el siglo XX” (Torrón, 2015, pTorrón A. Gimnasia y Deporte en el Instituto Superior de Educación Física (1939-1973): su configuración y su enseñanza [dissertação]. Universidad de la República: Uruguay; 2015.. 52).

Segundo demonstram Rodríguez Giménez (2018)Rodríguez Giménez R. Sobre el saber y el conocimiento del cuerpo en la educación física: elementos para un balance a partir de la experiencia uruguaya. Alesde. Curitiba. 2018;9(2):52-64. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61260.
http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61...
e Rodríguez Giménez e Seré (2021)Rodríguez Giménez RR, Seré C. La conformación de una perspectiva pedagógica crítica en la Educación Física, el Deporte y la Recreación en Uruguay a través de la Revista Nexo Sport (1983-1990). Agora. 2021;23:73-97. http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.73-97.
http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.7...
, ainda que indícios de uma crítica à tradição da Educação Física uruguaia estivessem já presentes nos anos 1980, é sobretudo a partir da década seguinte, quando a ditadura cívico-militar foi deposta, que ganhou fôlego a reflexão sobre uma Educação Física renovada (que pode ser adjetivada de crítica). O objetivo deste texto é retomar algumas facetas dessa história a partir de entrevistas realizadas com seis docentes, todos eles vinculados ao ISEF e com trajetórias “afetadas” pelos processos de transformação em curso.2 2 Informações sobre cada um dos colaboradores pode ser encontrada na dissertação (Sampaio, 2023).

Nesta direção, quatro entrevistas foram realizadas de forma virtual, no período de setembro a dezembro de 2021, em virtude da pandemia provocada pelo coronavírus (Covid-19). Duas entrevistas foram realizadas no período de abril a junho de 2022, momento em que um dos autores do artigo realizou um estágio técnico-científico, de quase três meses, no Uruguai. Todas as seis entrevistas foram gravadas através do aplicativo “Obs. Estúdio”, com o consentimento de todos os participantes.

O artigo está organizado em duas seções, seguidas das considerações finais. Na primeira, o olhar volta-se aos planos de estudo de 1992 e 2004, considerados determinantes para a construção de um novo sentido de Educação Física no ISEF. Na segunda, dá-se centralidade à presença de bibliografia brasileira no processo que levou a um rompimento com a tradição da disciplina na formação de professores no Uruguai.

PLANOS DE ESTUDOS: A RENOVAÇÕES CURRICULARES DE 1992 E 2004

Rodríguez Giménez (2013)Rodríguez Giménez R. Enseñanza de la epistemología en la formación de grado y posgrado en educación física: reflexiones a partir de la experiencia uruguaya. In: Gomes IM, Almeida FQ, Velozo E, organizadores. Cenários: Epistemologia, ensino e crítica. Desafios contemporâneos para a Educação Física. Nova Petrópolis: Nova Harmonia; 2013. p. 167-92. assevera que, nos anos 1980, ganhou força uma discussão em favor da necessidade de introduzir, no ISEF, a investigação como um tema central no currículo de formação de professores uruguaios. Até aquele momento, o eixo formativo estava baseado na execução de destrezas motrizes por parte dos estudantes, um fazer-saber destituído de reflexão. Algumas vozes começaram a se insurgir contra essa debilidade epistêmica no currículo do ISEF. Destaque é dado, nas entrevistas, ao professor Enrique Lorenzo, que

[…] fue un primer, digamos, impulsor [...] de todo lo que tuvo que ver con la investigación en ISEF [...] y creo, [...], junto con sus primeros seguidores (Entrevistada 03).

Segue ela dizendo que

[…] se empezó a sentir esto de la necesidad de la reflexión, la necesidad de estar continuamente formándose, investigando y llevó mucho tiempo, y un nuevo plan de estudios para seguir trabajando y generando como masa crítica de investigación. Yo creo que en los 1990 se hizo […] mucho y fue lo que empezó con la mirada puesta a transformarse en una carrera universitaria ¿verdad? (Entrevistada 03).

Segundo o depoimento de outros dois colaboradores da pesquisa,

[Enrique Lorenzo] profesor de lingüística, que impulsó fuertemente la investigación y organizó además de plantearse la necesidad, al principio eran proyectos de tesis para poder egresar, planteó la necesidad que los estudiantes conocieran las formas de investigación (Entrevistado 01).

[...] es la figura de Enrique Lorenzo, que era lo que en aquel momentos se llamaba el encargado del área de la educación a nivel nacional y era un investigador por esencia, en la didáctica además, Enrique era un didacta de la educación, y él crea en ese momento lo que se llama el departamento de investigación, que el primer director3 3 Este departamento foi criado em 1996. es él y el segundo fue Raumar, con la creación del departamento de investigación vos podés pensar que este fue el inicio del cambio desde una corriente renovada en materia de investigación (Entrevistada 02).

Apesar de não ser o primeiro plano do ISEF,4 4 Como demonstram os trabalhos de Dogliotti (2009, 2021, 2022) e Torrón (2015). a necessidade de inserir a investigação como eixo da formação se materializa no “Plan de Estúdios 1992”, que organiza o currículo a partir de três áreas: ciências biológicas, ciências da educação e ciências do movimento. Para Rodríguez Giménez (2013), aRodríguez Giménez R. Enseñanza de la epistemología en la formación de grado y posgrado en educación física: reflexiones a partir de la experiencia uruguaya. In: Gomes IM, Almeida FQ, Velozo E, organizadores. Cenários: Epistemologia, ensino e crítica. Desafios contemporâneos para a Educação Física. Nova Petrópolis: Nova Harmonia; 2013. p. 167-92. mudança foi paradigmática, pois, pela primeira vez na história da Educação Física uruguaia, o curso pressuporia uma relação com as ciências, inserindo, no seu âmbito, uma discussão a respeito de três paradigmas do conhecimento: positivismo, fenomenologia e crítico-construtivista. Em outras palavras, pela primeira vez a preocupação com a investigação em Educação Física é sistematizada e incluída no currículo, o que acaba resultando em um lugar de debates, discussões e problematizações de seus conhecimentos. De acordo com o entrevistado 01,

[...] era necesario en el ochenta y cinco, ochenta y seis, promover la investigación en el campo de la educación física, no sabíamos mucho de qué se trataba, era la necesidad que veíamos de no seguir repitiendo al no haber creación de conocimiento, los conocimientos o que venían de las generaciones anteriores o que venían del exterior, Uruguay, igual que me imagino Brasil, era muy dependiente de los conocimientos y orientaciones que venían del extranjero que muchas veces no se compadecían con la realidad nacional, con la idiosincrasia nacional, con la cultura nacional. Por lo tanto, hubo una comisión que estudió el tema de la investigación sin muchos avances, sin embargo, otro grupo estudió una renovación del plan de estudio y esa renovación del plan de estudio tomó en consideración la necesidad de investigar (Entrevistado 01).

Segundo outros depoentes, “El plan noventa y dos, es el primer plan de cuatro años, en donde se instala en el plan investigación” (Entrevistada 02, p. 6); “Y esa renovación del plan de estudio tomo en consideración la necesidad de investigar” (Entrevistado 01, p. 07).

Para o entrevistado 04, “Ese plan (1992) es un primer mojón de movilización teórica fuerte” (Entrevistada 04, p. 7); “Es el primer plan que toma la investigación como un elemento de formación para el estudiante” (Entrevistada 02, p. 06).

Recién ahí se empezó a materializar esa crítica porque hasta anteriormente no se veía en ningún lado, a partir de que se hace ese nuevo plan de estudios y se incorpora esta mirada empieza a fermentar todo esto (Entrevistada 03).

Neste contexto, a entrevistada 02 destaca o papel da professora Delia Chiappini:

[...] cuando llega el plan noventa y dos ahí aparece Delia Chiappini […]. Delia, que tenía formación en educación, lo primero que hizo fue empezar a revisar las propuestas de los planes de estudio, qué materias había, qué tipo de propuestas curriculares había en el área de la educación principalmente, y fue un momento bisagra en el Instituto porque se cuestionaba mucho el área biológica [...] que cuestionaban el cuerpo médico, la biopolítica (Entrevistada 02).

O depoimento a seguir oferece pistas de como o processo de elaboração de uma nova diretriz formativa no ISEF não aconteceu sem tensões ou disputas:

Ese plan 92 claro. Bueno, por supuesto que tuvo unas idas y venidas, algunas discusiones importantes con él,5 5 Ela se refere ao diretor do ISEF naquele momento (Nestor Ibarra). porque antes no había un cuerpo docente que acompañara ni apoyándolo a él, ni apoyándonos a nosotros, porque él lo que quería que nosotros nos sentáramos y redactáramos y si bien nosotros teníamos la intención de abrir un poco más a la discusión, teníamos enormes dudas, porque la gran mayoría de docentes tenía el enfoque de él, por lo tanto fue de alguna manera una postura estratégica que adoptamos de aceptar las condiciones de él, de nosotros a la interna diseñar un nuevo plan, esa fue la idea. Y bueno, al final el plan salió y parece mentira, pero hubo cosas que él no se dio cuenta de los cambios, que no eran grandes cambios sin duda, pero sí eran pequeñas cosas que nosotros fuimos introduciendo como para empezar a abrir un poco más [...] la visión de una formación distinta, y bueno ahí el plan empieza a funcionar. Fue el primer plan de estudios del ISEF formalmente aprobado porque hasta ese momento los planes de estudio eran hojas, eran hojas sueltas de programas de asignaturas sueltas anatomía, fisiología, gimnasia, natación (Entrevistada 06).

A reivindicação pela investigação (e por outra formação em Educação Física!) também “[...] fue una iniciativa que incidió sobre los estudiantes” (Entrevistado 01, p. 13).

Essa é também a compreensão da entrevistada 6, que assim se refere a eles:

Para mí fueron los estudiantes el gran motor de cambio del Instituto;6 6 É da iniciativa estudantil que se funda o Encuentro Nacional de Estudiantes de Educación Física, hoje em sua décima quinta edição. fueron los propios estudiantes, aquellos que empezaron a visualizar otras cosas que iban más allá de esos procesos biológicos mecanicistas en definitiva y yo diría que eso empezó a surgir en el 92. Y el 92 si tiene alguna importancia, la tiene ahí en los estudiantes, porque entre los profesores fue como una especie de sismo que hubo y que bueno, costo mucho ¿no? y que recién te diría después del plan 92 por ejemplo, tenemos toda una generación -como yo te digo- que fueron los que más generaron un cambio dentro de los estudiantes (Entrevistada 06).7 7 Muitos dos estudantes daquela época são, hoje, professores do ISEF, como Raumar Rodríguez Giménez, Ana Torrón, Karen Kühlsen etc.

Outro plano de estudos definidor nas mudanças formativas no ISEF é o de 2004, já que ele aparece, entre os entrevistados, como uma continuação das renovações críticas atribuídas ao currículo de 1992. Segundo a interpretação de Dogliotti (2018, pDogliotti P. Educación/enseñanza del cuerpo en la formación del profesor de educación física en el Uruguay (1948-1970) [tese]. La Plata: Universidad Nacional de la Plata; 2018.. 347), no plano de 2004

[…] emerge con más fuerza el constructo formación profesional docente, producto de la creciente importancia que fue adquiriendo la preparación para el ejercicio de la docencia con la incorporación de las pedagogías, y el incremento de las prácticas docentes y las psicologías en la formación curricular (Dogliotti, 2018, pDogliotti P. Educación/enseñanza del cuerpo en la formación del profesor de educación física en el Uruguay (1948-1970) [tese]. La Plata: Universidad Nacional de la Plata; 2018.. 347).

O relato da entrevistada 02 ratifica essa compreensão, ao dizer que, nesse plano,

[…] la educación física empieza a ser otra cosa y la práctica de los profesores y profesoras en ese momento estudiantes merecían otro tipo de abordaje, y se empieza a trabajar y pensar otra educación física para las escuelas y los liceos, creo que ahí a nosotros nos agarra el movimiento de renovación. [...] el cambio en la enseñanza de la educación física y en las prácticas, no el que se empieza a gestar allí [1992], sino el que se empieza a vivir en las prácticas, yo lo hallo más en el plan dos mil cuatro (Entrevistada 02).

Os relatos a seguir vão na mesma direção:

[...] una reformulación que se hizo en el dos mil cuatro que hoy está vigente, donde incorporé cosas de la educación física crítica, contenidos conceptuales que antes no existían en la educación física en secundaria, entre otros planteé la necesidad de una reflexión profunda sobre: ¿Por qué hacemos las cosas? ¿Qué significado tiene? (Entrevistado 01).

[…] yo ya llego en un plan 2004, bueno es la transformación mucho más fuerte en pedagogía, en las materias del área de las ciencias de la educación y más volcadas a esta cuestión de dar los autores de la pedagogía crítica, yo creo que ahí hubo un cambio importante con todos los autores críticos, como que entró bastante bibliografía, sí, de ese momento del campo de la renovación de lo que fue, sí, más que nada pedagogía critica (Entrevistada 05).

Conforme a leitura que Chiappini e Ferrés (2014)Chiappini D, Ferrés C. Instituto Superior de Educación Física: años de transiciones, agonías y conquistas (1986-2008). Montevideo: Ediciones Universitarias; 2014. fazem dos doze anos que separam o plano de 1992 do plano de 2004, e a despeito das resistências encontradas pelo caminho, houve uma alteração substantiva, na formação do ISEF, do enfoque mecanicista-biologicista em direção a uma abordagem sociocrítica, em que a metáfora do corpo-objeto8 8 A investigação de Torrón (2008), a respeito do sentido de corpo nos planos de 1992 e 2004, evidencia a perda de centralidade do corpo entendido como um organismo, especialmente no plano de 2004. transforma-se em um corpo-sujeito, ao mesmo tempo que em os antigos professores transmissores-executantes se transformaram em futuros professores ensinadores-educadores. Concluem aqueles autores dizendo que, com a implantação do plano de 2004, tem-se início um tempo de inovações substantivas a partir das quais se desenvolve uma vida institucional com outras fortalezas acadêmicas.

A INTERLOCUÇÃO COM O BRASIL NO ISEF

Os planos curriculares elaborados resultam, também, do encontro com bibliografia (inter)nacional a respeito da Educação Física. Entre as referências citadas, os entrevistados enfatizaram autores brasileiros no processo que levaria a uma alteração de sentido da Educação Física no ISEF. É o que se pode notar nas recorrentes menções à obra do pedagogo Paulo Freire. O entrevistado 01, com trajetória profissional no ISEF desde os anos 1960, afirma que

[…] la primera persona que nos enteramos de una orientación crítica, fue hace mucho, en el año […] setenta y dos, setenta y tres, ingresaron a Uruguay los libros de Paulo Freire (Entrevistado 01).9 9 A referência a Freire é, todavia, anterior aos anos 1970. Em sua análise do Plano de Estudos de 1966, Dogliotti (2018) encontra referências ao livro “Pedagogia do Oprimido” no programa da disciplina “Filosofia da Educação”. Destaca, também, algumas referências ao marxismo e à psicanálise nesse mesmo programa, evidenciando que, nesse período, apesar de não disseminadas nos anos seguintes, conviveram perspectivas críticas com outras tecnicistas, empiristas e funcionalistas. Uma análise minuciosa da publicação e recepção dos livros de Paulo Freire no Uruguai pode ser obtida em Brugaletta (2020).

Para a entrevistada 02, por sua vez, “Yo creo que la educación física crítica para mí llegó con Marx y llegó con Freire” (Entrevistada 02, p. 14). Conclui o entrevistado 01, contudo, que a influência de Paulo Freire não pode ser levada às últimas consequências porque a ditadura cívico-militar, entre 1973 e 1985, não foi um terreno propício para a divulgação das ideias da Educação como prática da liberdade. Os conceitos freireanos voltarão a ser pronunciados apenas com o fim da ditadura. Como consequência, possíveis práticas de uma Educação Física crítica foram adiadas, de maneira que será preciso

[...] esperar a la reapertura democrática [...] y fundamentalmente, a la década de 1990, para que los discursos críticos se comiencen a instalar lentamente (Dogliotti, 2018, pDogliotti P. Educación/enseñanza del cuerpo en la formación del profesor de educación física en el Uruguay (1948-1970) [tese]. La Plata: Universidad Nacional de la Plata; 2018.. 343).

Segundo a entrevistada 06, nos anos 1990,

[…] yo tomé como base a Paulo Freire, me pareció que era un autor, primero latinoamericano y que presentaba el hecho, la acción de educar, que era lo que yo quería de una manera trabajar con los estudiantes y en donde a partir de sus ideas y su lectura de diferentes libros intentaba generar además una formación en ellos, una formación crítica que hasta ese momento era complicado ¿no? hacer pensar para mí era fundamental y era lo que más le gustaba a los muchachos (Entrevistada 06).

Novamente, conforme a narrativa de duas entrevistadas,

[...] trabajamos en teoría de la educación mucho de la perspectiva de Paulo Freire, educación como práctica para la libertad, pedagogía del oprimido, pedagogía de la esperanza, es decir todo lo que tenía que ver con Freire son libros de cabecera para mí, vuelvo a ellos sistemáticamente, es de lo mejor que yo he leído en educación latinoamericana, no he encontrado mucha cosa mejor que esa para hablar de educación (Entrevistada 02).

[…] yo tengo el recuerdo así de las materias pedagogía primer año de la carrera con Delia Chiappini que después fue directora del ISEF, Paulo Freire, eso es mi único registro de un discurso crítico en el campo de la educación, y más, me encantó Paulo Freire. […] era de las materias más exigentes en estudiar, y bueno ahí me acuerdo justo ese año que vino Paulo Freire, visitó el Uruguay justo en ese año, yo me acuerdo haber ido a las conferencias de Paulo Freire y ella después retomarme y que yo hablara en la clase, o sea tengo esos recuerdos desde una experiencia, éramos 25 además en la clase, éramos un grupo muy chiquito, éramos dos grupos de 25 nada más10 10 Nesses anos, o normal era uma matrícula de 50 estudantes por turma no curso de professores de Educação Física do ISEF (25 mulheres e 25 homens), em função de um ranking confeccionado a partir de uma prova de ingresso fundamentalmente técnico-prática e de rendimento físico-motor. y bueno ahí me acuerdo de eso, de un Paulo Freire, además que bueno con un movimiento de cultura democrática que esto también iba subiendo y tenía todo un espacio después de haber sido proscripto Paulo Freire durante toda la dictadura y persecución. Entonces ahí creo que es lo que uno podría decir y bueno, después yo no veo que esas letras de Paulo Freire y eso haber trabajado ahí en esas materias que a mí me llegaron muchísimo, no siento que eso haya tenido un impacto sobre el propio campo de la educación física, como una cuestión en ese momento (Entrevistada 05).

Para Balibar (1995)Balibar E. Nombres y lugares de la verdad. Buenos Aires: Nueva Visión; 1995., poder-se-ia falar de um acontecimento, ou melhor, de uma ruptura, após a ditadura, com a forma de lidar com a Educação Física:

[...] implica decir que hay un antes y un después y, por lo tanto, fijar una fecha que interrumpe la continuidad de las representaciones de ciertos fenómenos (Balibar, 1995, pBalibar E. Nombres y lugares de la verdad. Buenos Aires: Nueva Visión; 1995.. 74).

A redemocratização constitui um período propício para a divulgação das teses freireanas. É nesse contexto que elas irão reverberar na revista Nexo Sport,11 11 “La Revista Nexo Sport, publicación mensual que fue durante muchos años la única destinada a la educación física, el deporte y la recreación en Uruguay. Desde su origen, la publicación fue impulsada y supervisada por profesores de educación física egresados del Instituto Superior de Educación Física (ISEF). La revista se distribuía en gran parte del país, con lo cual, además de servir como insumo formativo, se convirtió en un canal de comunicación entre los profesores de diversas generaciones y regiones” (Rodríguez Giménez e Seré, 2021, p. 2). O entrevistado 01 trabalhou na editoração dessa revista. impresso que teve um papel importante no período final da ditadura cívico-militar no país (suas publicações iniciaram em 1983), o que permitiu que a revista fosse um canal de denúncias ao caráter autoritário que a Educação Física assumiu durante esse processo. Foi a partir do retorno à democracia que as referências de caráter educativo da Educação Física se vincularam à preocupação com uma transformação social.

Con todo, esta reivindicación constituye una incipiente entrada de autores como Paulo Freire, y configura un escenario relevante para ciertas discusiones próximas a esa articulación discursiva que se formula bajo el nombre de pedagogía crítica (Rodríguez Giménez e Seré, 2021, pRodríguez Giménez RR, Seré C. La conformación de una perspectiva pedagógica crítica en la Educación Física, el Deporte y la Recreación en Uruguay a través de la Revista Nexo Sport (1983-1990). Agora. 2021;23:73-97. http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.73-97.
http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.7...
. 78).

Outro acontecimento importante nessa experiência de renovação teórico-discursiva da Educação Física foi o movimento conhecido como Esporte para Todos (EPT), um programa criado na Noruega, na década de 1960, que se expandiu para várias partes do mundo, incluindo Brasil e Uruguai. No caso uruguaio, o brasileiro Lamartine Pereira da Costa foi um dos principais articuladores do EPT, que também serviu para alimentar uma crítica à presença do esporte na Educação Física. Na Nexo Sport, conforme apontado por Rodríguez Giménez e Seré (2021)Rodríguez Giménez RR, Seré C. La conformación de una perspectiva pedagógica crítica en la Educación Física, el Deporte y la Recreación en Uruguay a través de la Revista Nexo Sport (1983-1990). Agora. 2021;23:73-97. http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.73-97.
http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.7...
, são frequentes as referências a Lamartine Pereira da Costa. O professor também concedeu uma entrevista para a revista Nexo Sport, em 1985, quando esteve em Montevidéu para uma conferência no seminário de EPT. O entrevistado 01 conta como essa influência do EPT chegou ao campo no Uruguai:

[…] lo trajo [Lamartine Pereira da Costa] para un seminario, en septiembre del año ochenta y cinco, y nos hicimos muy amigos, pero por ahí nomás, posteriormente lo trajimos de vuelta, él ya había variado aquel proyecto de deportes para todos de la dictadura y con aquel ambiente desde la secretaria del comercio creo que era que lo desarrollaba. Lamartine ya había venido en la segunda etapa cuando lo llamamos a otro congreso que lo invitamos, un curso, vino ya hablando de los días del desafío, después él me contactó para dar un curso que dio otra institución que lo trajo, yo di la parte relativa al Uruguay, nosotros desde nuestra revista Nexo Sport impulsamos fuertemente el deporte para todos como una alternativa de democratización de la actividad física, nos equivocamos, hoy estoy justamente estudiando ese tema […] porque lo que hizo el deporte para todos es desinstitucionalización, sacó a la gente de las instituciones antes para hacer actividad física había que ir a un club, había que ir a una plaza, un lugar, utilizan los lugares públicos masivamente crea un aumento de la gente que participa de la actividad física, pero esa gente se concentra en las clases altas y casi altas (Entrevistado 01).

Os artigos da Nexo Sport que tratam dessa temática dirigem suas críticas, em primeiro lugar, ao esporte, mas também à própria Educação Física, que buscava construir um trato pedagógico para o esporte.

El Deporte para Todos parece haber llegado para oponerse a la especialización, al recordismo, a la mecanización del movimiento, a la vez que, para revitalizar la participación social, el punto de vista humanista, el análisis social e histórico del fenómeno (Entrevistado 01).

Uma edição da revista publicou um documento elaborado no âmbito do I Congresso Brasileiro/Panamericano de EPT, realizado em Curitiba no ano de 1982. Esse documento denunciava

El ‘autoritarismo y conservadurismo’ de los contenidos y estructuras de la Educación Física del Brasil y se sugería pensarla como ‘segmento de la Educación, a fin de contribuir para el desarrollo integral de individuos autónomos, democráticos, críticos y participativos’, a la vez que ‘comprometida con la transformación social y con la construcción de una nueva sociedad’ (CARTA DE BELO HORIZONTE, apudRodríguez Giménez e Seré, 2021, pRodríguez Giménez RR, Seré C. La conformación de una perspectiva pedagógica crítica en la Educación Física, el Deporte y la Recreación en Uruguay a través de la Revista Nexo Sport (1983-1990). Agora. 2021;23:73-97. http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.73-97.
http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.7...
. 9).

As ideias aqui apresentadas neste movimento têm fortes críticas ao esporte de rendimento, à especialização, à busca do recorde e à mecanização do movimento “[...] a la vez que para revitalizar la participación social, el punto de vista humanista, el análisis social e histórico del fenómeno” (Rodríguez Giménez e Seré, 2021, pRodríguez Giménez RR, Seré C. La conformación de una perspectiva pedagógica crítica en la Educación Física, el Deporte y la Recreación en Uruguay a través de la Revista Nexo Sport (1983-1990). Agora. 2021;23:73-97. http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.73-97.
http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.7...
. 15).

[...] Es decir una apertura hacia lo que ya hacía la actividad física y la democratización quedó en acceso a, pero hay que modificar otras cosas y los índices de las razones por las cuales no hacen actividad física, son un buen indicativo (Entrevistado 01).

Por outro lado, a entrevistada 06 reconhece a importância que teve o EPT no Uruguai, mas, para ela,

[…] no fue un aporte para el cambio que nosotros necesitábamos, era de otro paradigma digamos, que no estuvo mal, creo que aporto mucho también, pero no estaba dentro de los parámetros que nosotros estábamos de cambiar, hasta el enfoque de la evaluación, por ejemplo, un montón de cosas que ahí era donde teníamos complicaciones digamos (Entrevistada 06).

Sem perder de vista, ainda, a relação com o Brasil, no final da década de 1990, chega ao Uruguai uma cópia do livro “Educação Física e Aprendizagem Social”, de Valter Bracht (Rodríguez Giménez, 2013Rodríguez Giménez R. Enseñanza de la epistemología en la formación de grado y posgrado en educación física: reflexiones a partir de la experiencia uruguaya. In: Gomes IM, Almeida FQ, Velozo E, organizadores. Cenários: Epistemologia, ensino e crítica. Desafios contemporâneos para a Educação Física. Nova Petrópolis: Nova Harmonia; 2013. p. 167-92.).12 12 No Brasil, o livro é de 1992. A tradução dessa obra foi feita em Córdoba, na Argentina, por Fernando Jaime González. A entrevistada 05 fala:

cómo fue decisivo Educación Física y Aprendizaje Social de Valter, y ese texto que fue decisivo es traído por la materia pedagogía de la educación física […] (Entrevistada 05).

Outra das entrevistadas também menciona a importância do trabalho de Valter Bracht na atualidade:

Entonces en ese sentido Valter [Bracht] es un referente, por el recorrido de esa preocupación, entonces el término de esa legitimación creemos que la legitimación esta en la enseñanza de esas prácticas y en la investigación de esas prácticas [...] trabajo directamente con el último libro de Valter; trabajo con el libro de Fernando González y ensayan la enseñanza generando una unidad didáctica con saberes corporales, con saberes conceptuales, técnicos y críticos (Entrevistada 04).

A presença de literatura brasileira se diversifica, nos anos subsequentes, graças ao estabelecimento de intercâmbios acadêmicos entre docentes do ISEF e professores brasileiros, oportunidade em que nomes como Carmen Lúcia Soares, Alexandre Fernandez Vaz, Marcus Aurélio Taborda de Oliveira, Alex Fraga, entre outros,13 13 Destes nomes, talvez tenha sido Alexandre Fernandez Vaz e colaboradores, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o que mais estabeleceu relação institucional com o ISEF. Maiores informações a respeito podem ser encontradas em Vaz (2018) e Pereyra e Correa (2018). começam a ter seus textos e temas de estudo debatidos no ISEF e nos grupos de pesquisa14 14 Destaque, a esse respeito, para o Grupo Políticas Educativas y Políticas de Investigación en Educación Física (GPEPI), o primeiro constituído formalmente, em 2004. Segundo Pereyra e Correa (2018), ele surge “[…] a partir de la articulación de dos líneas de investigación que se encontraban institucionalmente establecidas: ‘Cuerpo y Pedagogía’ y ‘Tiempo libre y Ocio’ […]”. Vários remanescentes desse grupo, extinto em 2016, darão origem a muitos outros grupos de investigação existentes atualmente no ISEF. que vão se constituir como resultado desse processo de renovação da Educação Física no Uruguai.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme afirma Rodríguez Giménez (2013Rodríguez Giménez R. Enseñanza de la epistemología en la formación de grado y posgrado en educación física: reflexiones a partir de la experiencia uruguaya. In: Gomes IM, Almeida FQ, Velozo E, organizadores. Cenários: Epistemologia, ensino e crítica. Desafios contemporâneos para a Educação Física. Nova Petrópolis: Nova Harmonia; 2013. p. 167-92., 2018Rodríguez Giménez R. Sobre el saber y el conocimiento del cuerpo en la educación física: elementos para un balance a partir de la experiencia uruguaya. Alesde. Curitiba. 2018;9(2):52-64. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61260.
http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61...
), vários elementos convergiram para promover uma ruptura com tradição da Educação Física no Uruguai, de modo que é difícil apontar qual foi o mais importante ou o mais decisivo. Este artigo realizou, com base em seis entrevistas, o exercício de descrever duas experiências singulares que contribuíram para a crítica e renovação da Educação Física naquele país, especialmente após os anos 1980.

A primeira delas com foco na dinâmica curricular do ISEF, principal instituição formadora de professores de Educação Física no Uruguai. A despeito dos limites que possam ser identificados nos documentos curriculares analisados (Rodríguez Giménez, 2013Rodríguez Giménez R. Enseñanza de la epistemología en la formación de grado y posgrado en educación física: reflexiones a partir de la experiencia uruguaya. In: Gomes IM, Almeida FQ, Velozo E, organizadores. Cenários: Epistemologia, ensino e crítica. Desafios contemporâneos para a Educação Física. Nova Petrópolis: Nova Harmonia; 2013. p. 167-92., 2018Rodríguez Giménez R. Sobre el saber y el conocimiento del cuerpo en la educación física: elementos para un balance a partir de la experiencia uruguaya. Alesde. Curitiba. 2018;9(2):52-64. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61260.
http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61...
), ambos contribuíram para o demorado e conflituoso processo que levou a formação em Educação Física ser reconhecida, em 2003,15 15 Até esse momento, a formação em Educação Física era catalogada como formação terciária (Torrón, 2015), a qual vem depois do liceo (Ensino Médio brasileiro) mas que não é universitária e não é normalista. Existem formações terciárias não normalistas e não universitárias (exemplo: formação em turismo). como uma profissão universitária.16 16 A discussão sobre a possibilidade da passagem do ISEF para a Universidad de la República (Udelar), conforme o entrevistado 01, já acontecia na década de 1960. A passagem definitiva do ISEF para Udelar foi em 2006. Os planos de 1992 e 2004, além disso, ajudaram a, senão superar, ao menos questionar um paradigma de corte biologista/higienista que esteve instalado no ISEF durante décadas e que resultou em um perfil técnico do egresso baseado em conhecimentos do “como” e do “que” (Chiappini e Ferrés, 2014Chiappini D, Ferrés C. Instituto Superior de Educación Física: años de transiciones, agonías y conquistas (1986-2008). Montevideo: Ediciones Universitarias; 2014. ) que não encontra correspondência na atual configuração curricular do ISEF.

A segunda experiência descrita teve como foco o papel que certa literatura brasileira desempenhou nos processos transformadores em terras uruguaias.17 17 Ainda que possa estar aqui superestimada, a ênfase no Brasil se justifica não apenas porque este artigo resulta de uma dissertação de mestrado desenvolvida em programa de pós-graduação brasileiro, mas, fundamentalmente, porque se opera com a tese, aludida por Bracht (2016), de que o “movimento renovador” da Educação Física no Brasil também reverberou em países vizinhos, particularmente na Argentina e no Uruguai. A presença dessa bibliografia, associada aos próprios avanços empreendidos por autores uruguaios, foi importante para proliferar “[…] algo que había estado presente en la tradición de la educación física uruguaya: la reivindicación de su carácter pedagógico” (Rodríguez Giménez, 2018, pRodríguez Giménez R. Sobre el saber y el conocimiento del cuerpo en la educación física: elementos para un balance a partir de la experiencia uruguaya. Alesde. Curitiba. 2018;9(2):52-64. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61260.
http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61...
. 57). Seguramente, nesse momento, tratou-se de fazer tal reivindicação a partir de uma perspectiva crítica do conhecimento, algo talvez inédito na história da disciplina no Uruguai.18 18 É importante registrar, todavia, que a crítica ao esporte por meio do Esporte para Todos não tinha uma relação explícita com teorias críticas do conhecimento. Além disso, Lamartine Pereira da Costa nunca foi, no Brasil, alguém identificado com as pedagogias críticas da área.

O olhar voltado para a literatura brasileira não exclui a existência de bibliografia de outros países, já que os entrevistados ressaltam o consumo de bibliografia europeia da Educação e da Educação Física, como José Maria Cagigal, Jean Le Boulch, Manoel Sérgio, Gimeno Sacristán, mas também de nomes clássicos das Humanidades, como Pierre Bourdieu, Michel Foucault, Louis Althusser, Jacques Lacan, Norbert Elias. Também é digna de nota, nesse contexto, a fecunda interlocução aberta com o campo da Educação Física argentina.

O “movimento do pensamento” dessa apropriação bibliográfica, e os intercâmbios institucionais que isso possibilitou, diversificou política e conceitualmente o campo “crítico” do Uruguai, levando-o para direções inéditas naquele país (renovação também identificada em outras realidades sul-americanas da Educação Física, como na Argentina, na Colômbia, no Chile etc.).19 19 Consultar, a respeito, Bracht e Crisorio (2003), Almeida (2021), Almeida e Moreno (2020), Eusse et al. (2021). O resultado desse processo se nota, hoje, na variedade de entendimentos a respeito da Educação Física, bem como na diversidade temática presente nos grupos de investigação do ISEF. Isso produziu, também, muitas alterações no sentido da formação de professores de Educação Física no ISEF, cujo eixo teria transitado de um saber-fazer (currículo tradicional-esportivo) para uma lógica que concebe a docência em conexão com a investigação, o que fez da reflexividade um elemento central da construção identitária dos futuros professores de Educação Física.

Apesar disso, não é possível afirmar que o campo da Educação Física no Uruguai se transformou completamente. Como foi assinalado antes, o plano de estudos de 1992 foi formulado em função de três áreas: ciências da educação, ciências biológicas e ciências do movimento. A perspectiva crítica foi impulsionada fundamentalmente na primeira área; neste trabalho não avaliamos o impacto nas outras áreas e quais foram seus efeitos. É razoável supor que houve algum tipo de repercussão, mas também sabemos que a inércia e o peso das tradições são fortes, assim como as resistências as mudanças. Um aspecto, contudo, é incontestável: a ideia de crítica esteve presente e, de uma maneira ou outra, gerou expectativas e resistências. Investigações posteriores poderão aprofundar nas conclusões deste estudo, oportunidade para também demostrar os limites desse movimento de crítica e renovação no Uruguai.

  • 1
    Além do Instituto, no Uruguai ainda existe o curso de formação em Educação Física oferecido pela Asociación Cristiana de Jóvenes e pela Universidad de la Empresa, as duas de âmbito privado.
  • 2
    Informações sobre cada um dos colaboradores pode ser encontrada na dissertação (Sampaio, 2023Sampaio AF. Crítica e renovação da Educação Física no Uruguai [dissertação]. Espírito Santo: Universidade Federal do Espírito-Santo; 2023.).
  • 3
    Este departamento foi criado em 1996.
  • 4
    Como demonstram os trabalhos de Dogliotti (2009Dogliotti P. Lo político y las políticas educativas: el cambio curricular en la reforma educativa uruguaya (1995- 2000). Políticas Educativas. 2009;2(2):18-33., 2021Dogliotti P. Los cambios curriculares desde los documentos oficiales en la formación del profesor de educación física en el Uruguay en la década del sesenta. Educ Rev. 2021;37:1-28. http://dx.doi.org/10.1590/0104-4060.76838.
    http://dx.doi.org/10.1590/0104-4060.7683...
    , 2022Dogliotti P. Educación y enseñanza en el plan 1966 de la formación del profesor de educación física en Uruguay. Contextos Educativos, 2022;29:107-33. http://dx.doi.org/10.18172/con.5117
    http://dx.doi.org/10.18172/con.5117...
    ) e Torrón (2015)Torrón A. Gimnasia y Deporte en el Instituto Superior de Educación Física (1939-1973): su configuración y su enseñanza [dissertação]. Universidad de la República: Uruguay; 2015..
  • 5
    Ela se refere ao diretor do ISEF naquele momento (Nestor Ibarra).
  • 6
    É da iniciativa estudantil que se funda o Encuentro Nacional de Estudiantes de Educación Física, hoje em sua décima quinta edição.
  • 7
    Muitos dos estudantes daquela época são, hoje, professores do ISEF, como Raumar Rodríguez Giménez, Ana Torrón, Karen Kühlsen etc.
  • 8
    A investigação de Torrón (2008), aTorrón A. El cuerpo en los planes de estudio del Isef entre 1992 y 2004. Políticas Educativas. 2008;2(1):166-76. respeito do sentido de corpo nos planos de 1992 e 2004, evidencia a perda de centralidade do corpo entendido como um organismo, especialmente no plano de 2004.
  • 9
    A referência a Freire é, todavia, anterior aos anos 1970. Em sua análise do Plano de Estudos de 1966, Dogliotti (2018)Dogliotti P. Educación/enseñanza del cuerpo en la formación del profesor de educación física en el Uruguay (1948-1970) [tese]. La Plata: Universidad Nacional de la Plata; 2018. encontra referências ao livro “Pedagogia do Oprimido” no programa da disciplina “Filosofia da Educação”. Destaca, também, algumas referências ao marxismo e à psicanálise nesse mesmo programa, evidenciando que, nesse período, apesar de não disseminadas nos anos seguintes, conviveram perspectivas críticas com outras tecnicistas, empiristas e funcionalistas. Uma análise minuciosa da publicação e recepção dos livros de Paulo Freire no Uruguai pode ser obtida em Brugaletta (2020)Brugaletta F. La edición de Paulo Freire en la historia reciente de América Latina. Religión, política y mercado en la circulación de una pedagogía para la liberación (1969-1977). [tese]. La Plata, Universidad Nacional de La Plata, 2020..
  • 10
    Nesses anos, o normal era uma matrícula de 50 estudantes por turma no curso de professores de Educação Física do ISEF (25 mulheres e 25 homens), em função de um ranking confeccionado a partir de uma prova de ingresso fundamentalmente técnico-prática e de rendimento físico-motor.
  • 11
    “La Revista Nexo Sport, publicación mensual que fue durante muchos años la única destinada a la educación física, el deporte y la recreación en Uruguay. Desde su origen, la publicación fue impulsada y supervisada por profesores de educación física egresados del Instituto Superior de Educación Física (ISEF). La revista se distribuía en gran parte del país, con lo cual, además de servir como insumo formativo, se convirtió en un canal de comunicación entre los profesores de diversas generaciones y regiones” (Rodríguez Giménez e Seré, 2021, pRodríguez Giménez RR, Seré C. La conformación de una perspectiva pedagógica crítica en la Educación Física, el Deporte y la Recreación en Uruguay a través de la Revista Nexo Sport (1983-1990). Agora. 2021;23:73-97. http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.73-97.
    http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.7...
    . 2). O entrevistado 01 trabalhou na editoração dessa revista.
  • 12
    No Brasil, o livro é de 1992.
  • 13
    Destes nomes, talvez tenha sido Alexandre Fernandez Vaz e colaboradores, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o que mais estabeleceu relação institucional com o ISEF. Maiores informações a respeito podem ser encontradas em Vaz (2018)Vaz AF. Um certo itinerário: experiências de pesquisa com países sul-americanos. Revista da Alesde. 2018;9(2):33-51. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61257.
    http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61...
    e Pereyra e Correa (2018)Pereyra B, Correa RP. El cuerpo bajo la lupa: aportes de las ciencias humanas y sociales a la Educación Física en Uruguay. Revista da Alesde. 2018;8(1):72-90. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i1.59910.
    http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i1.59...
    .
  • 14
    Destaque, a esse respeito, para o Grupo Políticas Educativas y Políticas de Investigación en Educación Física (GPEPI), o primeiro constituído formalmente, em 2004. Segundo Pereyra e Correa (2018)Pereyra B, Correa RP. El cuerpo bajo la lupa: aportes de las ciencias humanas y sociales a la Educación Física en Uruguay. Revista da Alesde. 2018;8(1):72-90. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i1.59910.
    http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i1.59...
    , ele surge “[…] a partir de la articulación de dos líneas de investigación que se encontraban institucionalmente establecidas: ‘Cuerpo y Pedagogía’ y ‘Tiempo libre y Ocio’ […]”. Vários remanescentes desse grupo, extinto em 2016, darão origem a muitos outros grupos de investigação existentes atualmente no ISEF.
  • 15
    Até esse momento, a formação em Educação Física era catalogada como formação terciária (Torrón, 2015Torrón A. Gimnasia y Deporte en el Instituto Superior de Educación Física (1939-1973): su configuración y su enseñanza [dissertação]. Universidad de la República: Uruguay; 2015.), a qual vem depois do liceo (Ensino Médio brasileiro) mas que não é universitária e não é normalista. Existem formações terciárias não normalistas e não universitárias (exemplo: formação em turismo).
  • 16
    A discussão sobre a possibilidade da passagem do ISEF para a Universidad de la República (Udelar), conforme o entrevistado 01, já acontecia na década de 1960. A passagem definitiva do ISEF para Udelar foi em 2006.
  • 17
    Ainda que possa estar aqui superestimada, a ênfase no Brasil se justifica não apenas porque este artigo resulta de uma dissertação de mestrado desenvolvida em programa de pós-graduação brasileiro, mas, fundamentalmente, porque se opera com a tese, aludida por Bracht (2016)Bracht V. Educação Física escolar na América Latina. In: Silva PCC, Gerez AG, Nascimento ACS, Silva BOE, Loureiro FLL, Almeida FQ et al., organizadores. Territorialidade e diversidade regional no Brasil e na América Latina: suas conexões com a Educação Física e as Ciências do Esporte. Florianópolis: Tribo da Ilha; 2016. p. 71-97., de que o “movimento renovador” da Educação Física no Brasil também reverberou em países vizinhos, particularmente na Argentina e no Uruguai.
  • 18
    É importante registrar, todavia, que a crítica ao esporte por meio do Esporte para Todos não tinha uma relação explícita com teorias críticas do conhecimento. Além disso, Lamartine Pereira da Costa nunca foi, no Brasil, alguém identificado com as pedagogias críticas da área.
  • 19
    Consultar, a respeito, Bracht e Crisorio (2003)Bracht V, Crisorio R. A Educação Física no Brasil e na Argentina: identidade, desafio e perspectivas. São Paulo: Autores Associados; 2003., Almeida (2021)Almeida FQ. Estudos sociocríticos e/ou pedagogias críticas em Educação Física: na, da ou desde a América Latina? Ágora Educ Fís Deport. 2021;23:119-29., Almeida e Moreno (2020)Almeida FQ, Moreno AD. Educación física crítica y epistemología: una lectura comparada entre Brasil y Chile. Poiésis, 2020;14:71-84. , Eusse et al. (2021)Eusse KLG, Bracht V, Almeida FQ. Crítica e renovação da educação física colombiana: uma comparação com brasil. Movimento. 2021;27:1-16. http://dx.doi.org/10.22456/1982-8918.105572.
    http://dx.doi.org/10.22456/1982-8918.105...
    .
  • FINANCIAMENTO

    Este artigo é uma ação vinculada aos projetos de pesquisa “A constituição de um pensamento renovador da Educação Física na América do Sul: uma análise comparada entre Brasil, Uruguai, Argentina, Chile e Colômbia” e “Formação de professores de Educação Física no Espírito-Santo e na América do Sul”. As investigações são financiadas pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (FAPES), a quem agradecemos pelo apoio (Edital Profix 15/2022. Processo 2022-Z3971; Edital Universal 03/2021. Processo 2021-B3GXG; Bolsa Pesquisador Capixaba 06/2021. Processo 2022-D93DK; Edital Procap mestrado 12/2021).

REFERÊNCIAS

  • Almeida FQ, Moreno AD. Educación física crítica y epistemología: una lectura comparada entre Brasil y Chile. Poiésis, 2020;14:71-84.
  • Almeida FQ. Estudos sociocríticos e/ou pedagogias críticas em Educação Física: na, da ou desde a América Latina? Ágora Educ Fís Deport. 2021;23:119-29.
  • Balibar E. Nombres y lugares de la verdad. Buenos Aires: Nueva Visión; 1995.
  • Bracht V, Crisorio R. A Educação Física no Brasil e na Argentina: identidade, desafio e perspectivas. São Paulo: Autores Associados; 2003.
  • Bracht V. Educação Física escolar na América Latina. In: Silva PCC, Gerez AG, Nascimento ACS, Silva BOE, Loureiro FLL, Almeida FQ et al., organizadores. Territorialidade e diversidade regional no Brasil e na América Latina: suas conexões com a Educação Física e as Ciências do Esporte. Florianópolis: Tribo da Ilha; 2016. p. 71-97.
  • Brugaletta F. La edición de Paulo Freire en la historia reciente de América Latina. Religión, política y mercado en la circulación de una pedagogía para la liberación (1969-1977). [tese]. La Plata, Universidad Nacional de La Plata, 2020.
  • Chiappini D, Ferrés C. Instituto Superior de Educación Física: años de transiciones, agonías y conquistas (1986-2008). Montevideo: Ediciones Universitarias; 2014.
  • Dogliotti P. Educación y enseñanza en el plan 1966 de la formación del profesor de educación física en Uruguay. Contextos Educativos, 2022;29:107-33. http://dx.doi.org/10.18172/con.5117
    » http://dx.doi.org/10.18172/con.5117
  • Dogliotti P. Educación/enseñanza del cuerpo en la formación del profesor de educación física en el Uruguay (1948-1970) [tese]. La Plata: Universidad Nacional de la Plata; 2018.
  • Dogliotti P. Lo político y las políticas educativas: el cambio curricular en la reforma educativa uruguaya (1995- 2000). Políticas Educativas. 2009;2(2):18-33.
  • Dogliotti P. Los cambios curriculares desde los documentos oficiales en la formación del profesor de educación física en el Uruguay en la década del sesenta. Educ Rev. 2021;37:1-28. http://dx.doi.org/10.1590/0104-4060.76838
    » http://dx.doi.org/10.1590/0104-4060.76838
  • Eusse KLG, Bracht V, Almeida FQ. Crítica e renovação da educação física colombiana: uma comparação com brasil. Movimento. 2021;27:1-16. http://dx.doi.org/10.22456/1982-8918.105572
    » http://dx.doi.org/10.22456/1982-8918.105572
  • Pereyra B, Correa RP. El cuerpo bajo la lupa: aportes de las ciencias humanas y sociales a la Educación Física en Uruguay. Revista da Alesde. 2018;8(1):72-90. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i1.59910
    » http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i1.59910
  • Rodríguez Giménez R. Enseñanza de la epistemología en la formación de grado y posgrado en educación física: reflexiones a partir de la experiencia uruguaya. In: Gomes IM, Almeida FQ, Velozo E, organizadores. Cenários: Epistemologia, ensino e crítica. Desafios contemporâneos para a Educação Física. Nova Petrópolis: Nova Harmonia; 2013. p. 167-92.
  • Rodríguez Giménez R. Sobre el saber y el conocimiento del cuerpo en la educación física: elementos para un balance a partir de la experiencia uruguaya. Alesde. Curitiba. 2018;9(2):52-64. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61260
    » http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61260
  • Rodríguez Giménez RR, Seré C. La conformación de una perspectiva pedagógica crítica en la Educación Física, el Deporte y la Recreación en Uruguay a través de la Revista Nexo Sport (1983-1990). Agora. 2021;23:73-97. http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.73-97
    » http://dx.doi.org/10.24197/aefd.0.2021.73-97
  • Sampaio AF. Crítica e renovação da Educação Física no Uruguai [dissertação]. Espírito Santo: Universidade Federal do Espírito-Santo; 2023.
  • Torrón A. El cuerpo en los planes de estudio del Isef entre 1992 y 2004. Políticas Educativas. 2008;2(1):166-76.
  • Torrón A. Gimnasia y Deporte en el Instituto Superior de Educación Física (1939-1973): su configuración y su enseñanza [dissertação]. Universidad de la República: Uruguay; 2015.
  • Vaz AF. Um certo itinerário: experiências de pesquisa com países sul-americanos. Revista da Alesde. 2018;9(2):33-51. http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61257
    » http://dx.doi.org/10.5380/jlasss.v9i2.61257

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Maio 2023
  • Aceito
    17 Set 2023
Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte Universidade de Brasilia - Campus Universitário Darcy Ribeiro, Faculdade de Educação Física, Asa Norte - CEP 70910-970 - Brasilia, DF - Brasil, Telefone: +55 (61) 3107-2542 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: rbceonline@gmail.com